Basta dar uma volta pelos barracões do Complexo Cultural Porto Seco, na Zona Norte de Porto Alegre, para identificar as três palavras que ecoam com força entre carnavalescos e diretores, a menos de um mês do Carnaval: pindaíba, atual situação de parte das agremiações, criatividade, para colocar figurinos e alegorias na avenida, e superação, para enfrentar a crise financeira da maioria.
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Das dez escolas que desfilarão no Grupo Especial, nos dias 5 e 6 de fevereiro, nove afirmam que o Carnaval de 2016 está sendo o mais difícil em pelo menos três décadas. Apenas a Embaixadores do Ritmo garante tudo sob controle.
Para que o espetáculo seja realizado, há quem optou pelo fiado com a promessa de pagamento assim que a prefeitura quitar a última parcela do cachê anual. Outros, tiraram dinheiro do próprio bolso para compra de material.
- É o pior ano dos últimos 30 - reflete o presidente da Império da Zona Norte, Antônio Ademir de Moraes, o Urso.
- A inflação atingiu o material usado pelas escolas - descreve o presidente da Unidos de Vila Isabel, Cleber Tavares.
- Em 2015, paguei R$ 800 pelo quilo da pena. Agora, o quilo mais barato foi R$ 1,5 mil - reforça o presidente da Bambas da Orgia, Cleomar Rosa.
- Este já é o Carnaval da pindaíba - resume Silvio Oliveira, carnavalesco da Imperadores do Samba, campeã de 2015.
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Em cima da hora
Ao contrário de administrações municipais da Região Metropolitana e do Interior, que cancelaram o Carnaval para conter gastos, a Secretaria Municipal de Cultura (SMC) de Porto Alegre manteve o evento, mas com restrições. Segundo o coordenador de Manifestações Populares da SMC, Joaquim Lucena, não houve aumento nos gastos gerais, de R$ 6 milhões, e no valor do repasse às agremiações, R$ 2,1 milhões. A contenção chegou na redução de funcionários que atuarão na produção do espetáculo e na troca dos contêineres por banheiros químicos na avenida.
Ele reconhece que o atraso da verba de auxílio às escolas que desfilarão no Porto Seco poderá prejudicar as agremiações que dependem deste dinheiro para comprar material. A primeira colocada do Carnaval anterior recebe cerca de R$ 150 mil e a última, R$ 90 mil.
- Pagaremos em três vezes. A última parte, 60% do valor total, sairá até o dia 15. Fui do Carnaval e sei que o melhor teria sido dar o cachê em agosto do ano passado, quando o material estava pela metade do preço. Mas não deu - comenta.
Para piorar a situação, a Central de Licitações da Secretaria da Fazenda inabilitou na sexta-feira a empresa responsável pela montagem da estrutura temporária no Porto Seco. Três empresas que participaram da licitação têm até a próxima segunda para apresentarem os documentos. Por isso, a montagem das arquibancadas ainda não têm data.
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Repasses em cima da hora
Ao contrário de diversas administrações municipais da Região Metropolitana e do Interior, que optaram pela suspensão do Carnaval como forma de conter gastos, a Secretaria Municipal de Cultura (SMC) de Porto Alegre manteve o evento, mas com cautela e restrições. Segundo o coordenador de Manifestações Populares da SMC, Joaquim Lucena, não houve aumento nos gastos gerais, que giram em torno de R$ 6 milhões, e no valor do repasse às agremiações, metade do gasto total.
A contenção chegou na redução da quantidade de funcionários que atuarão na produção do espetáculo, na diminuição do número de horas extras e na troca dos contêineres por banheiros químicos na avenida.
- Não podíamos suspender um evento que movimenta cerca de 4 mil empregos formais e informais - justifica o coordenador.
Ele reconhece que o atraso no repasse da verba de auxílio às escolas que desfilarão no Porto Seco poderá prejudicar as agremiações que dependem exclusivamente deste dinheiro para a compra de material. A primeira colocada do Carnaval anterior recebe cerca de R$ 150 mil e a última, R$ 90 mil.
- Faremos o pagamento em três vezes, e em cima do tempo. A última parte do repasse, cerca de 60% do valor total, sairá até o próximo dia 15. Eu fui do Carnaval e sei que o melhor teria sido dar o cachê das escolas em agosto do ano passado, quando o material ainda estava pela metade do preço. Mas não deu. Fizemos um esforço para manter o evento, enquanto outras cidades preferiram cancelá-lo - comenta.
Até o calendário atrapalha
Tirando a maré baixa na economia do Brasil, outros fatores também estariam influenciando na diminuição da receita das escolas e na ampliação da crise. Em Porto Alegre, conforme os próprios carnavalescos, o Carnaval só começa a partir da virada do ano. Como em 2016 a data do desfile será no início de fevereiro, ao contrário de anos anteriores, houve diminuição do número de ensaios nas quadras e as vendas de material de divulgação, como camisetas, também teriam minguado.
- Serão menos semanas para atrair o público. É uma corrida contra o tempo - constata a presidente da Acadêmicos do Gravataí, Rita Bittencourt.
A redução de ensaios nas quadras reflete diretamente na arrecadação da bilheteria e do bar. Na tentativa de atrair público, a Unidos de Vila Isabel, por exemplo, começou a ensaiar mais cedo. Nem assim, reverteu o problema.
- Costumávamos colocar 700 pessoas na quadra. Mas este número caiu 50%. É uma questão cultural mesmo, o povo não foi - constata o presidente da agremiação.
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Na Bambas da Orgia, os cálculos do presidente Cleomar Rosa são ainda piores. A chuva que caiu em nove das 11 quintas-feiras programadas para ensaio, entre setembro e novembro, fez esvaziar a quadra da escola.
- Além de perdermos um mês de arrecadação, se o desfile fosse feito no final de fevereiro, tivemos o fator clima influenciando diretamente na queda de público na quadra.
O carnavalesco da Unidos do Capão, Chico Espuma, agremiação que volta ao Grupo Especial depois de sete anos, resume a situação:
- Será o Carnaval da superação.
Carnavalesco da Imperadores do Samba mostra fantasia com material alternativo. Foto: Luiz Vaz
Criatividade para tirar leite de pedra
Com o dinheiro escasso, as escolas estão reforçando na criatividade para não fazerem feio na passarela do samba. Sílvio, da Imperadores, promete explorar materiais alternativos e mais baratos, como TNT e EVA - deixados de lado em Carnavais passados.
- Estamos tirando leite de pedra em tempos de reciclagem. O interessante é a possibilidade de criarmos e surpreendermos o público - comenta.
Na União da Vila do IAPI, o carnavalesco Sérgio Guerra tem se esforçado para trabalhar com menos verba. Para reduzir os custos na cobertura dos carros, trocou a madeira pelo papelão. Além de diminuir o peso para quem empurrará as quatro alegorias na avenida, Sérgio reduziu no bolso de quem pagará por elas.
- Conseguimos economizar cerca da 60% neste gasto. Já estamos no plano C para fazermos este Carnaval. Nossa meta é terminar um carro a cada quatro dias. Vai ser no sufoco - calcula Sérgio.
Vai dar certo!
Entre as escolas de Porto Alegre, a Embaixadores do Ritmo, vice-campeã em 2015, é a única que não reconhece 2016 como um ano de penúria. No barracão, os quatro carros estão praticamente concluídos e o presidente Gustavo Giró garante estar confiante de que nem a crise atrapalhará os planos da escola de estar entre as favoritas deste ano.
Ao contrário das outras escolas, Giró opta há mais de cinco anos por um plano diferenciado para obter alegorias e fantasias: ele firmou parcerias com escolas de outros Estados, comprando e reaproveitando praticamente todo o material delas. Depois do desfile, revende o produto para outras agremiações.
- Sempre tenho alguma verba para o ano seguinte. Desta vez, por exemplo, se voltarmos no Desfile das Campeãs, entraremos com metade da escola. O restante das fantasias já está vendido. Carnaval é paixão, mas também precisa ser negócio. Quem não se adaptar aos novos tempos, enfrentará crise sempre - ensina.
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"Somos guerreiros"
Também acreditando num bom desfile, mas nem tão confiantes quanto Giró, estão o diretor de carnaval da Imperatriz Dona Leopoldina, Maurício Santos, e o presidente da Estado Maior da Restinga, Robson Machado, o Preto. Para Maurício, o ano de superação da Dona Leopoldina foi 2010, depois que um temporal destruiu a quadra da escola em outubro do ano anterior.
- A partir daquele ano, aprendemos a ter calculadas as nossas dificuldades. Será um ano mais difícil do que outros, pois perdemos quase um mês de arrecadação e ainda tivemos quase 15 dias de feriado entre Natal e Ano-Novo. Mas estamos com a crise sob controle - garante Maurício.
Já o experiente Preto afirma que apesar de ser "um pouco mais sofrido" do que anos anteriores, o Carnaval de 2016 vai acontecer:
- Somos guerreiros, temos perseverança e as escolas estarão na Avenida.
Programação oficial do Carnaval 2016
Janeiro
Dia 15: abertura oficial do Carnaval com a entrega das chaves da Cidade ao Rei Momo
Local: Paço Municipal
Horário: 20h
Dias 15, 22 e 29: Descidas da Borges, 21h
Fevereiro
Dias 2 e 3: ensaio técnico (muamba)
Dias 5, 6 e 7: desfiles oficiais
Dia 8: apuração
Dia 9: desfile das campeãs
Março
Dia 12: Troféu Estandarte de Ouro
* Diário Gaúcho
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Giró está confiante na Embaixadores. Foto: Luiz Vaz