Com grande apoio da bancada evangélica, deputados aprovaram, em comissão especial na última quarta-feira, o parecer favorável à PEC 99/2011, que inclui as associações religiosas de caráter nacional na lista de instituições autorizadas a questionarem regras ou leis junto ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Considerada por especialistas uma afronta ao princípio de Estado laico, que consta na Constituição, a PEC agora deve passar por votação no plenário da Câmara e depois no Senado. Se aprovada, dará a associações como a Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil (CGADB) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) o direito a apresentarem ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) ou outros recursos, como ação declaratória de constitucionalidade (ADC) perante o STF.
Câmara aprova proposta para efetivar dono de cartório sem concurso
Conforme o deputado João Campos (PSDB-GO), autor do texto e o mesmo que propôs a regulamentação da "cura gay", a medida teria como objetivo abrir mais frentes para auxiliar o Supremo a exercer o controle da constitucionalidade, especialmente em questões que envolvam direitos da igreja:
- Se, por exemplo, amanhã decidirem dar fim à isenção de impostos para igrejas, quem teria interesse e autoridade para reclamar? São associações ligadas à religião que devem ter esse papel no Supremo.
Para o constitucionalista e professor da Ufrgs Eduardo Carrion, a medida, além de atingir o princípio da laicidade do Estado Brasileiro, pode ser considerada discriminatória:
- Em princípio seria admissível uma emenda constitucional alargando o rol dos legitimados a propor essas ações perante o STF, mas, além de atingir o princípio constitucional da laicidade, com repercussão no sistema de direitos e garantias individuais, pode ainda ser considerada discriminatória, por reduzir apenas às associações religiosas esse poder.
Leia as últimas notícias sobre a Câmara dos Deputados
Atualmente, a Constituição garante a competência para oferecer questionamentos ao Supremo à presidente da República; à mesa do Senado Federal e da Câmara dos Deputados; às mesas das Assembleias Legislativas ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; aos governadores de Estado ou do Distrito Federal; ao procurador-geral da República; ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); e aos partidos políticos com representação no Congresso Nacional; além de às confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
Conforme o presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB-RS, Armando Perin, foi designada uma comissão para investigar o objetivo e a necessidade de incluir as associações religiosas na lista de instituições autorizadas a questionarem regras ou leis junto ao STF.
- A Ordem vai apurar se algum setor da sociedade não está contemplado nas instituições já legitimadas pelas Constituição. Se isso se confirmar, a PEC será bem-vinda. Caso contrário, não haverá motivo para ampliar a lista. Não podem ser levados em conta objetivos meramente corporativos. Se não existir uma justificativa jurídica, a inclusão fere o conceito de Estado laico.
No entendimento de Perin, na lista já constam entidades que representam todos os setores, como Ministério Público e a própria OAB.
- Além disso, existem no Congresso Nacional partidos políticos ligados ao setor religioso, inclusive que mencionam isso na sigla. No entendimento da OAB, em princípio, a Constituição consegue alcançar toda a sociedade. Mas, de qualquer forma, iremos investigar - conclui Perin.
* Zero Hora