Depois de semanas sob pressão, o Palácio Piratini finalmente enviou à Assembleia, na tarde desta sexta-feira, o projeto de lei que amplia o uso dos depósitos judiciais - confirme adiantou ZH. A medida é capaz de injetar, de imediato, R$ 1 bilhão no Tesouro e de amenizar as dificuldades dos servidores públicos, cujos salários foram parcelados.
Apesar disso, o texto não deverá ser votado antes do dia 15. O mais provável é que vá ao plenário somente no dia 22, quando o calendário do parcelamento já estiver concluído.
Demora no envio de projeto que amplia uso de depósitos judiciais é alvo de questionamentos
Rosane de Oliveira: o custo dos depósitos judiciais
Também foram protocoladas nesta sexta outras duas propostas (leia mais detalhes no quadro abaixo). Uma delas, apresentada pelo Tribunal de Justiça, prevê a redução dos juros sobre o uso dos depósitos. A outra, de autoria do Executivo, estabelece novo limite para as Requisições de Pequeno Valor (RPVs) e promete causar polêmica - a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS) já se posicionou contra.
No caso do projeto que amplia o uso dos depósitos judiciais, deputados da oposição vinham criticando o Piratini por postergar a alternativa, que poderia ter evitado o fatiamento das remunerações. Na quarta-feira, o governo tentou utilizar a medida como barganha para antecipar a votação de outras propostas consideradas prioritárias - entre elas a que prevê aumento de ICMS. Não conseguiu e cedeu aos apelos. Mas também não desistiu de continuar tentando.
- Vamos insistir no acordo. Entendemos que é preciso olhar para o todo e não apenas para um único projeto. O dinheiro dos depósitos tem um custo, precisa ser devolvido um dia e nem de longe soluciona os problemas do Estado. Vai durar, no máximo, até outubro - disse o chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi.
O texto foi protocolado em regime de urgência. Isso significa que, em 30 dias, será analisado - e aprovado - de qualquer maneira. A oposição quer fazer isso antes, mas rechaça a ideia da "venda casada". Já a base do governo não aceita votar o texto de forma isolada.
Se não houver meio-termo, a tendência é de que a votação fique para o dia 22 porque nesta data o projeto do tarifaço começará a trancar a pauta. A partir daí, não adiantará mais tentar a antecipação e também não haverá motivos para seguir protelando a votação do texto dos depósitos.
A Secretaria da Fazenda garante que, mesmo sem esses recursos, haverá dinheiro em caixa para honrar as parcelas, porque as datas do parcelamento levam em conta o ingresso de ICMS.
Do que tratam os três projetos apresentados pelo Piratini ao Legislativo:
1) Ampliação do uso dos depósitos judiciais
A proposta é ampliar o limite de uso dos depósitos judiciais, por parte do Executivo, para 95% do saldo - hoje, o teto é 85%. São valores de terceiros em litígio na Justiça, que ficam depositados no Banrisul para garantir que as sentenças sejam cumpridas. Se aprovada, a medida pode injetar R$ 1 bilhão, de imediato, no Tesouro estadual.
Como será usado o dinheiro e quanto tempo vai durar?
Se o projeto for aprovado logo, o recurso servirá para quitar as parcelas pendentes da folha do funcionalismo. Caso a votação demore mais (pode ocorrer em até 30 dias), será usado para evitar o parcelamento da próxima folha, a ser paga em 30 de setembro.
2) Isenção de parte dos juros dos depósitos judiciais
Assinado pelo presidente do Tribunal de Justiça, desembargador José Aquino Flôres de Camargo, o projeto prevê que o Judiciário abra mão de parte da cobrança de juros pelo uso dos depósitos judiciais - valor que é pago mensalmente pelo Executivo. Se aprovada, a iniciativa será válida pelo período de quatro anos. Segundo o texto, em 2015, o valor repassado ao fundo será reduzido a R$ 280 milhões (originalmente seriam R$ 480 milhões) e, nos outros três anos, a R$ 220 milhões anuais. O excedente ficará com o Executivo. No caso deste ano, o Piratini economizará R$ 200 milhões. Como já repassou R$ 276 milhões, ainda terá R$ 4 milhões a pagar.
Mas, afinal, quanto o Estado gasta com os juros?
Ao todo, já gastou R$ 3,4 bilhões (só neste ano, até agora, foram R$ 653,97 milhões) e sacou R$ 8,6 bilhões.
3) Limite reduzido no pagamento de RPVs
O projeto de lei trata de mudanças no pagamento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs), dívidas de até 40 salários mínimos que o Estado tem a pagar (acima disso, são precatórios). A intenção é limitar as RPVs a sete salários mínimos para reduzir o peso nas finanças - em 2015, o Executivo prevê o desembolso de R$ 900 milhões. Se aprovada, a alteração não afetará RPVs já constituídas.
Entenda por que o dinheiro extra é apenas paliativo:
1) Em 31 de agosto, o Piratini teve de parcelar a folha de pagamento dos servidores públicos e ainda ficou com R$ 1,6 bilhão em contas pendentes, relativas a julho e a agosto.
As principais contas pendentes
Restante da folha: R$ 745 milhões
Dívida com a União: R$ 265,4 milhões
Custeio da saúde: R$ 63 milhões
Investimentos em estradas: R$ 52,8 milhões
Diárias da segurança: R$ 2,75 milhões
Autonomia das escolas (julho e agosto): R$ 21 milhões
Transporte escolar (julho e agosto): R$ 20,3 milhões
Merenda escolar: R$ 1 milhão
2) Para pagar tudo, o Estado contará com arrecadação de R$ 2 bilhões em setembro (em ICMS e outros tributos). Caso entre logo (dependendo de quando o projeto for aprovado), o dinheiro extra dos depósitos ampliará a receita para R$ 3 bilhões.
3) Com isso, será possível pagar todas as despesas de julho e agosto e ficar com R$ 1,4 bilhão em caixa. O problema é que, até o fim de setembro, o Executivo ainda terá pela frente as despesas do próprio mês (cerca de R$ 2,5 bilhões).
4) Aquele R$ 1,4 bilhão será usado, então, para pagar a próxima folha no dia 30 (R$ 1,2 bilhão) e para quitar outras despesas menores.
5) Com isso, no início de outubro, haverá R$ 1,1 bilhão em pendências de setembro, fora as contas do mês. A partir daí, o Executivo só poderá sacar, da conta dos depósitos, o que exceder o limite de 95%, cerca de R$ 60 milhões por mês.