O mais importante personagem da história da América Latina no século 20 completa hoje 89 anos na semiobscuridade. Fidel Castro Ruz, o homem que transformou a diminuta Cuba em sinônimo de revolução e socialismo, cedeu o poder ao irmão caçula e camarada de armas, Raúl Castro, há exatos nove anos. Doente, trocou o velho uniforme militar por abrigos esportivos. Faz raras aparições públicas - a última, no mês passado.
Até mesmo sua produção escrita tem sido esparsa. No site do jornal Granma, o último artigo de Castro tem a data de 8 de maio. Mais significativo é o texto anterior, intitulado "Mandela morreu. Por que ocultar a verdade sobre o apartheid?". Foi publicado em dezembro de 2013, pouco depois do histórico aperto de mãos entre os presidentes Barack Obama e Raúl no funeral de Nelson Mandela.
Dizer que os irmãos Castro e Obama têm algo em comum nada tem a ver com endossar as absurdas teses dos sucedâneos da Ku Klux Klan de que, por baixo dos ternos cinza-chumbo, o presidente americano veste uma camisa comunista. Até 1992, não apenas esses três personagens, mas a totalidade dos que se filiam às ideias de igualdade e solidariedade abraçavam a causa do fim do regime segregacionista sul-africano.
No artigo, o velho ditador lembra a importante contribuição de Cuba à luta contra o apartheid, incluindo o envio de 28 mil homens a Angola nos anos 1970 para lutar contra a guerrilha pró-sul-africana de Jonas Savimbi. O texto pode ser lido como um recado a Obama, um dos oradores no funeral de Mandela.
É como se Castro dissesse ao americano com o qual nunca se encontrou: você sabe o que nós fizemos no século passado. Mas também é possível que esteja reivindicando a erradicação do velho regime sul-africano como a mais perene das contribuições cubanas à humanidade - mais até do que a própria revolução que liderou em 1959.
Diferentemente dos aniversários de outros líderes do antigo bloco comunista, a data de nascimento de Castro não é comemorada oficialmente em Cuba. Em seu apogeu, o líder era homenageado como parte das festividades do Dia da Juventude, transcorrido ontem. Desta vez, o 13 de agosto será ofuscado por um acontecimento maior: a reabertura da embaixada americana, na sexta-feira, com a presença do secretário de Estado, John Kerry. É a primeira vez, desde 1961, que um representante de tão alta posição no governo americano põe os pés em solo cubano.
Cuba reabre embaixada nos EUA após 54 anos de distanciamento
É difícil saber o que Castro dirá para si mesmo quando a representação do que chama de "império" estiver sendo reaberta em Havana. Talvez sua reação seja mais fria do que ao ver leggings com as cores da bandeira ianque emoldurando os quadris das cubanas. Ou quem sabe seus pensamentos retornem a algum episódio da guerra em Angola.
Olhar Global
Luiz Antônio Araujo: Castro faz anos
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Luiz Antônio Araujo
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