Dois mandados de segurança protocolados na Justiça nesta segunda-feira sintetizam a agrura no sistema de saúde do Estado. Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul e Prefeitura de Canoas ingressaram com liminares para que o governo gaúcho regularize os pagamentos em atraso na área, sob o risco de agravar restrições de atendimentos.
As 497 prefeituras e os hospitais filantrópicos do Estado, conforme o conselho, acumulam passivo de R$ 77,5 milhões, referente a maio, que deixaram de ser repassados pelo Executivo gaúcho devido à crise financeira. O valor representa quase 70% do total previsto para ser pago por mês. Outros R$ 112 milhões de junho ainda não chegaram aos cofres (a média prevista a ser repassada por mês, diz o conselho). Afundado por um déficit que deve chegar a R$ 5,4 bilhões neste ano, o Piratini tem restringido repasses para garantir, mês a mês, o pagamento do funcionalismo.
Há instituições que, pela falta de verba, tem restringido o atendimento à população. Por isso, a liminar pede - a exemplo de ações movidas por servidores que recorreram à Justiça para impedir o parcelamento de salários - que o pagamento, a partir da parcela que deveria ter sido repassada em maio, seja regularizado.
Hospitais que atendem pelo SUS agonizam no Estado
Com superlotação, hospitais da Capital têm restrição nas emergências
- Hoje, já temos restrições de atendimento importantes. Como a dívida vem se acumulando, se amplia em uma proporção muito mais rápida essa restrição. E, cada mês em que não temos o repasse integral, o prejuízo aumenta - aponta o presidente do conselho e secretário da Saúde de Canoas, Marcelo Bósio.
Os reflexos se espalham pelo Estado. Na Santa Casa de Porto Alegre, por exemplo, a previsão é de que 118 leitos sejam fechados nos próximos meses. Destes, 41 já deixaram de funcionar há duas semanas como uma medida emergencial para reduzir prejuízos. Já a Fundação Hospitalar Centenário São Leopoldo, referência para 17 municípios, fechou, no início de junho, o serviço de neurocirurgia devido ao atraso de repasses desde 2014 (que chegaram a R$ 3,7 milhões). E, desde segunda-feira, o Hospital Montenegro suspendeu temporariamente os atendimentos de especialistas, exames e procedimentos eletivo, para citar três exemplos.
Parte das dívidas na saúde que se agravam em 2015 tem origem no governo anterior. No ano passado, o Estado não quitou R$ 196 milhões em verbas com as prefeituras (também, segundo o conselho).
Caso atraso persista, atendimento em Canoas pode sofrer impacto
Apesar de o mandado de segurança coletivo incluir Canoas, a cidade da Região Metropolitana optou por ir à Justiça individualmente para cobrar o que tem a receber. Até o momento, serviços de saúde não foram impactados pelo atraso devido a alternativas financeiras buscadas pela administração municipal. Porém, o prefeito Jairo Jorge afirmou que, caso o cenário persista, podem haver restrições nos próximos 10 dias.
Entre janeiro e junho, a prefeitura de Canoas diz ter deixado de receber do Piratini mais de R$ 10 milhões previstos para o setor (outros R$ 6,9 milhões ainda faltam de 2014). Até 10 de julho, o dividendo pode saltar para quase R$ 20,5 milhões se a expectativa de não repasse da verba desse mês se manter, de acordo com cálculos da administração municipal.
- Se não houver o repasse, pode haver um colapso no sistema de saúde - disse Jairo Jorge. - Fizemos o possível, mas, agora, estamos no limite da nossa capacidade, até porque a prefeitura perdeu, na sua arrecadação própria, mais de R$ 30 milhões nesses últimos seis meses em razão da crise. A crise afeta a cidade, o Estado e o país, mas é preciso ter prioridades.
Nesta segunda-feira, parte da folha de pagamento dos funcionários do Hospital Universitário não foi paga - uma parcela deve ser quitada na terça-feira e, quanto ao restante, não há previsão. A justificativa de Jairo Jorge para a ação judicial, que deve abrir precedente para outras prefeituras, é o posto de Canoas como referência no atendimento hospitalar para 199 municípios. O não pagamento da verba estadual pode impactar um universo de 72,1 mil atendimentos, mas a prefeitura não informou quais seriam os primeiros serviços afetados.
Por meio de nota (confira a íntegra abaixo), a Secretaria Estadual da Saúde (SES) informou que "ainda não tomou conhecimento da ação judicial ingressada pelo município de Canoas" e que, no último mês, devido às dificuldades financeiras e às ações judiciais que determinam o pagamento do salário do funcionalismo, não foi possível o repasse total dos valores da saúde. A pasta alega que foi o único mês que o Piratini não teve condições de pagar em dia os recursos.
Na semana passada, a SES encaminhou R$ 35 milhões aos hospitais (equivalente a 40% dos incentivos estaduais referentes a maio). Ainda em junho, o setor hospitalar já havia recebido um repasse de R$ 18,7 milhões do Tesouro do Estado e outros R$ 55,1 milhões em recursos federais, relativos aos procedimentos realizados. Com isso, neste ano os hospitais já receberam um total de R$ 922 milhões, entre recursos do Tesouro Estadual e oriundos de verbas federais.
Dívidas na saúde:
Pendências do Estado com prefeituras e hospitais filantrópicos
- R$ 77,5 milhões referentes ao mês de maio ainda não foram pagos
- Ainda há pendente os R$ 112 milhões de junho
Pendências do Estado com Canoas
- R$ 10,4 milhões não foram pagos entre janeiro e junho
- Em 10 de julho, se encerra o prazo para que outros R$ 10,4 sejam repassados
Confira a íntegra da nota divulgada pela SES:
"A Secretaria Estadual da Saúde (SES) informa que ainda não tomou conhecimento da ação judicial ingressada pelo município de Canoas. A pasta acompanha com atenção a situação relatada pelos hospitais gaúchos, que alegam ter de limitar ou suspender atendimentos pelo SUS em virtude de problemas financeiros. Desde o início do ano, o Governo do Estado esteve permanentemente aberto ao diálogo com as instituições e prefeituras, buscando as alternativas e soluções possíveis dentro das possibilidades orçamentárias.
No último mês, em virtude das dificuldades financeiras e ações judiciais que determinam o pagamento da folha, não foi possível a quitação integral dos compromissos assumidos com as entidades. Na semana passada, a SES efetuou o pagamento de R$ 35 milhões aos hospitais, o que equivale a 40% dos incentivos estaduais referentes ao mês de maio. Ainda em junho, o setor hospitalar já havia recebido um repasse de R$ 18,7 milhões do Tesouro do Estado e outros R$ 55,1 milhões em recursos federais, relativos aos procedimentos realizados. Com isso, neste ano os hospitais já receberam um total de R$ 922 milhões, entre recursos do Tesouro Estadual e oriundos de verbas federais.
Apesar do panorama econômico enfrentado, este foi o primeiro mês em que o Governo do Estado não teve condições de pagar em dia os recursos destinados a hospitais. O planejamento proposto frente a esse cenário está em adequar esse orçamento com os nossos gastos. Isso busca evitar desajustes como o ocorrido no segundo semestre de 2014, quando os hospitais passaram meses sem receber incentivos devido ao fato do Estado ter feito contratos em valores superiores ao que o seu orçamento permitia. O compromisso para este ano segue sendo manter a aplicação dos 12% de sua receita na área da saúde, assim como a legislação determina".