Na primeira - e curta - viagem do governador José Ivo Sartori ao Exterior, ficaram evidentes as diferenças de estilo entre ele e seus antecessores no Palácio Piratini. Foram quatro dias entre Erlangen, na Alemanha, e Paris, na França. Em todos os encontros, Sartori passou a imagem de homem simples, gentil e brincalhão.
Econômico nas palavras, não deu trabalho aos tradutores, nem levou apresentação em slides sobre o Rio Grande do Sul, como faziam Germano Rigotto, Yeda Crusius e Tarso Genro em suas viagens para vender a imagem de um Estado atraente para investidores.
Falou de improviso, mais para agradecer a hospitalidade dos alemães que o receberam no Medical Valley e na Friedrich-Alexander-Universität (FAU) e para dizer que o Rio Grande do Sul está aberto para investidores estrangeiros.
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- Hoje é um dia muito importante para nós no Rio Grande do Sul. É dia de Nossa Senhora do Caravaggio - disse na mensagem de agradecimento, ao ser recebido pelo presidente da FAU, cargo equivalente ao de reitor.
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Mais tarde, na visita ao showroom da Siemens, fez comentários despretensiosos sobre os sofisticados equipamentos de diagnóstico por imagem, apresentados por um técnico brasileiro escalado para detalhar a evolução dos tomógrafos e aparelhos de ressonância magnética.
Na assinatura do protocolo de intenções com o Medical Valley, para possível instalação de uma réplica do complexo no Rio Grande do Sul, expressou o desejo de ter uma unidade da Siemens no Estado.
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Ao desembarcar no Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, saído de Nuremberg, na Alemanha, com mais de uma hora de atraso, Sartori encontrou à sua espera o ministro-conselheiro Achilles Zaluar, que estava respondendo pela embaixada do Brasil.
Indiferença aos ritos da diplomacia
Os dois conversaram até a saída para o estacionamento, onde o governador deveria embarcar no carro do diplomata para ir até o hotel. Para surpresa dos assessores e dos jornalistas que acompanhavam a viagem, Sartori decidiu seguir na van alugada para transportar a comitiva.
Foi a primeira vez que a reportagem de ZH viu um governador recusar a gentileza da diplomacia brasileira, que tem entre suas tarefas receber autoridades em visita ao Exterior. Descortesia com o diplomata ou renúncia a uma mordomia? A explicação da equipe do governador é que ele preferiu não se separar da comitiva e que não vê sentido no tratamento diferenciado.
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Tarso, Yeda e Rigotto aproveitavam o encontro com os diplomatas para conversar sobre a situação política e econômica do país visitado, receber dicas de como tornar a viagem mais produtiva e tentar fazer da embaixada ou consulado brasileiro um posto avançado de defesa dos interesses do Rio Grande do Sul. Tarso e Rigotto enfileiravam compromissos na agenda e faziam questão de incluir na comitiva empresários e representantes de universidades.
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Yeda fez apenas duas viagens oficiais em seu governo - uma para os Estados Unidos e outra para a Holanda. Nas duas, encontrou representantes do Itamaraty à sua espera nos aeroportos e cumpriu o ritual da diplomacia. Fluente em inglês, dispensou tradutor em uma visita à ONU e em encontros com investidores na Holanda.
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Rigotto, que logo depois de eleito foi à Bélgica, à Alemanha e aos Estados Unidos, às próprias custas, emendava um compromisso em outro nos roteiros internacionais, preocupado em não passar a ideia de que a viagem era desnecessária.
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As diferenças com os dois últimos governadores ficaram evidentes já no aeroporto. Para começar, José Ivo Sartori viajou de classe econômica. A justificativa para não viajar na executiva, como Tarso Genro e Yeda Crusius, foi a mesma usada em 2004 por Germano Rigotto para fazer o cansativo roteiro até a China em classe econômica: com o Estado em crise, precisava dar o exemplo.
No Galeão, um funcionário da Air France convidou o governador para esperar o voo na sala VIP e disse que ele poderia levar um acompanhante, Sartori agradeceu a oferta, mas disse que preferia esperar na sala de embarque, com a comitiva.
Para passar o tempo, já que o voo teve um atraso de duas horas, comprou um baralho e ficou jogando escova com o assessor militar. Na volta, no voo entre Paris e o Rio, sentou-se numa fileira com dois bebês e passou parte da viagem brincando com as crianças.
Diferentemente de Tarso, que passava boa parte do tempo lendo livros ou conectado à internet pelo smartphone, e de Rigotto, que se mantinha informado sobre tudo o que se passava no Estado, Sartori não demonstrava preocupação em acompanhar o noticiário do Brasil.
- Tem sempre alguém que conta o que está acontecendo - justificou.
O governador também ficava contrariado com qualquer tentativa de repercutir com ele problemas do dia a dia do governo. Quando questionado por ZH sobre o bloqueio de R$ 38 milhões, pela Justiça, para pagar em dia o salário dos auditores fiscais, foi sucinto:
- Paciência. Se bloquearam para quem ganha mais, pode faltar para quem ganha menos.
Em viagem, Yeda não fugia dos assuntos do Estado, mesmo que o tema fosse a péssima relação com o vice. Tarso, tampouco. Ele estava em Israel quando a Polícia Federal lançou a Operação Concutare, em que seu secretário do Meio Ambiente foi preso. O próprio Tarso deu a informação aos jornalistas e avisou que queria falar sobre a investigação.
Convidado pelos anfitriões alemães para conhecer uma das festas mais tradicionais da Baviera, a Bergkirchweih, Sartori e o prefeito José Fortunati experimentaram a cerveja da região e brindaram com políticos locais. Em um primeiro momento, o governador não queria que sua assessoria divulgasse a fotografia, preocupado com a interpretação que a imagem teria no Rio Grande do Sul.
Foi convencido a liberar a foto com dois argumentos: a visita era parte da agenda organizada pelos alemães e a Bergkirchweih está para Erlangen como a Festa da Uva para Caxias do Sul ou a Oktoberfest para Santa Cruz do Sul.
A preocupação em não passar a ideia de que estava se divertindo fez lembrar Rigotto, que em 2004 usou seu preparo de maratonista e correu à frente dos jornalistas para não ser fotografado na Grande Muralha. Foi inútil argumentar que era um domingo e que visitar a muralha era uma tradição dos chefes de Estado e de governo que vão para a China.
Embora tenha viajado pouco por conta da relação tempestuosa com o vice-governador Paulo Feijó, Yeda não demonstrava qualquer preocupação com possíveis críticas ao que fazia nas horas de folga.
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Em Nova York, aproveitou um sábado livre para comprar roupas numa loja popular, a Century XXI, comeu ostras com champanha na Central Station e assistiu ao musical Mary Poppins, na Broadway. Em Amsterdã, fez questão de visitar o Museu Van Gogh.
Tarso, um dos governadores que mais viagens fez ao Exterior, também não se preocupava com o que os adversários pudessem falar. Incluía na agenda reuniões com políticos e intelectuais e fazia questão de, terminada a agenda oficial, conhecer locais típicos do país visitado. Em Cuba, jantou uma noite no bar La Bodeguita e outra no restaurante El Floridita, os preferidos do escritor Ernest Hemingway.
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Em Israel, teve encontro com intelectuais, como o escritor Amos Oz, e visitou o Museu do Holocausto, mas não quis ir ao Muro das Lamentações. Alegou que, como havia recusado um convite de autoridades palestinas para fazer o passeio, seria descortês visitar o muro para atender um pedido dos jornalistas.
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Rosane de Oliveira
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