Presidente do PMDB, conselheiro político do governador José Ivo Sartori e um dos oradores mais respeitados da história do partido, o deputado estadual Ibsen Pinheiro classificou como "corajosa" a decisão de atrasar o pagamento da parcela de abril da dívida com a União.
Ibsen foi além e disse que chegou o momento de o Palácio Piratini enviar à Assembleia os projetos de lei que preveem aumento da receita e corte de despesas. São cerca de 30 propostas amargas listadas pelo governo Sartori, como aumento de ICMS, adoção da previdência complementar para futuros servidores e prorrogação do calendário de reajustes para os funcionários da segurança, que custarão R$ 4 bilhões até 2018.
Para o peemedebista, o "Estado paternalista" que diz "sim" a todas as reivindicações chegou ao limite e precisa ser revisto.
Como o senhor avalia decisão de Sartori de atrasar o pagamento da dívida com União?
É uma decisão corajosa. Mas qualquer das outras também exigiria coragem. Por exemplo: parcelar a folha de pagamento também exige coragem. Sem coragem vai ficar tudo como está. E ficar como está é absolutamente insustentável. O Rio Grande do Sul não tem condições de cumprir seus compromissos sem uma alteração profunda ou na despesa ou na receita, ou em amnbas. A despesa de pessoal, como reduzir sem enfrentar a legislação protetiva dos direitos do trabalho? A dívida com a União, como enfrentar em face do contrato leonino que autoriza a União a se apropriar dos recursos? E sem aumentar imposto, como enfrentar? Tem de encarar alguns desses caminhos. A escolha é do governador. Hoje ele escolheu enfrentar o endividamento com a União. Isso não vai bastar, o Estado continuará quebrado. É preciso fazer tudo isso: discutir a dívida, discutir a sobrecarga da folha e discutir, com coragem, a tributação. Aumento de imposto tem de ser posto na pauta.
Aumento de ICMS?
Qualquer um, tem de discutir isso. A carga tributária da Suécia é 20 pontos maior do que a nossa. Por que é tão bom na Suécia e aqui é tão ruim? Sabe quem não gosta de aumento de imposto? O sonegador. Ele abomina a ideia de aumentar a sua ilicitude. Quem paga sabe que tem uma destinação adequada.
Chegou o momento político de enviar à Assembleia os projetos do Palácio Piratini que preveem ampliação de receita, com aumento de ICMS, e redução de custos com a folha de pagamento, tendo como exemplo o projeto que institui a previdência complementar?
Acho que sim. Eu não saberia qual deles, a decisão é do governador. A única coisa certa é que a inércia não é mais a saída. Não pode aumentar mais o endividamento e não existem mais os depósitos judiciais, que significaram R$ 11 bilhões nas gestões passadas. O que há é um déficit de R$ 5,4 bilhões para 2015. Não há solução, exceto fora da curva. E fora da curva é não pagar a dívida, rediscutir a folha de pagamento ou o quadro tributário.
Mesmo sendo medidas antipáticas, chegou o momento de enviá-las ao Legislativo?
Elas são antipáticas até serem compreendidas. Acho que sim, tem de vir. Só não sei qual medida, isso é atribuição do governador. Uma coisa é certa: não tem como continuar com o padrão que até agora se aplicou. A não regulamentação da dívida dos Estados com a União não ampliou o espaço de endividamento, não há depósitos judiciais e a despesa é maior do que a receita. E essa distância tende a crescer, com a despesa se tornando ainda maior. O que o aparelho de Estado do Brasil fez nos últimos anos foi dividir um bolo que não existe. Delfim (Netto, ministro da Fazenda no governo Costa e Silva) dizia que era preciso fazer crescer o bolo para dividi-lo. E foi demonizado por isso. Agora pretende-se a divisão do bolo sem que ele exista. Houve candidato que pregou claramente que o endividamento é para patrocinar políticas sociais. Isso é como comprar casa própria com cheque especial. É absolutamente insustentável o modelo que está aí. É preciso enfrentar a folha de pagamento, o endividamento e o modelo tributário.
Quais seriam as mudanças em relação à folha de pagamento?
Uma só medida não adianta. Estancar a dívida com a União ainda manteria o déficit. Sustar manifestações generosas, e até legais, de novos avanços salariais, ainda assim não resolveria. E um simples aumento de um ou dois pontos na alíquota do ICMS também não resolve. Tem de ser um enfrentamento conjunto e profundo. E demonstrar aos cidadãos gaúchos que todos temos de pagar essa conta. O aumento da alíquota (de ICMS), se não for pesado, também não adianta. E o pesado passa na Assembleia? Não sei. Mas é melhor ser rejeitado do que não tentar.
Seriam medidas que causariam reações.
Quem não toma remédio amargo? Todos nós tomamos porque compreendemos a necessidade. A primeira parte desta batalha foi vencida. Todos já sabem que dizer que o Estado é falimentar não é choro de quem ganhou a eleição em relação ao passado. As pessoas estão convencidas de que isso é verdade, que o aparelho de Estado foi conduzido de modo irresponsável no Brasil e no Rio Grande do Sul. Ora, propor uma lei que assegure por lei aumento salarial acima da inflação (Tarso Genro aprovou um calendário de reajustes aos servidores da segurança até 2018, com impacto de mais de R$ 4 bilhões no governo Sartori)? Não, isso é um benefício que não se justifica. Aumento salarial acima da inflação é para matéria de greve. Se você faz uma greve grande, ganha aumento acima da inflação. Se faz uma greve ruim, você perde o emprego. É o jogo, o conflito de interesses. Agora você fazer uma lei simpática que dá aumento acima da inflação, como o piso do magistério, e não cumpre? Uma lei que não é cumprida sequer por quem a assinou. É preciso um choque de realidade. A solução só será boa para todos se o sacrifício for igual para todos.
A sua crítica é ao governo Tarso Genro?
Eu não acho que o inventário de culpas seja a melhor solução porque foi uma visão de Estado que se praticou, não foi um erro administrativo do governo anterior. Nós temos tido uma má convivência com o regime democrático porque ele é periódico para nós. É um período democrático e outro ditatorial. Então, quando vivemos a democracia, achamos que tudo é permitido. Por que? Porque na ditadura tudo é proibido. O nosso regime democrático tem de ser mais forte que os governos ditatoriais. O democrático é legítimo. E o regime democrático tem de dizer não. E o nosso só diz sim a toda e qualquer reivindicação. Só por que é justa? Não, a justeza da reivindicação é só um dos elementos. O outro é a viabilidade de atender. Nós, então, desenvolvemos o modelo do Estado padrinho. Do Estado generoso. Do Estado que não diz não a nenhuma reivindicação e só considera a justeza. Isso significa que aqueles com mais capacidade de mobilização têm prêmios maiores. Confundimos as liberdades democráticas com liberdades para tudo. Nosso orçamento é uma peça de ficção. Foi o modelo de gestão que preponderou até agora no Brasil e no Rio Grande do Sul. O Estado paternalista não tem condição de pagar as suas contas.
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