Por duas gestões consecutivas o reitor Alexandre Neto e o vice-reitor Rui Oppermann foram guindados ao comando da maior universidade gaúcha, a UFRGS, tendo como uma das bandeiras a interação entre meio acadêmico e empresas. Nesta entrevista, em seu gabinete, o vice-reitor defende, convicto, os convênios com a iniciativa privada, alvo de investigação do Ministério Público Federal (MPF).
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Docentes recebem a mais para ter dedicação exclusiva (DE), que passa pelo número de horas dedicadas à universidade. Mas alguns têm até três convênios por ano. Se dividir o número de horas que trabalham fora, recebem bem mais que dentro da universidade.
Eles recebem 50% do salário a mais (pela DE). Mas esse raciocínio das horas-aula não se aplica aqui. A universidade pública é formada por ensino, pesquisa e extensão, esse é o valor dela. Os valores da DE incluem tudo isso, não se resumem a tempo na sala de aula. É errado pensar assim. Os grandes pesquisadores são procurados pelas empresas por terem expertise. O valor em dinheiro eles ganham para resolver um problema, não é mensurável por horas.
Mas o cálculo de quanto esses professores ganham fora da universidade, por hora, partiu de colegas deles, que são contrários a tanta atividade externa.
Esse é um julgamento pessoal de alguns, mas não condiz com a realidade. Os convênios se estabelecem porque há quem venha buscar pesquisa, e há quem faça pesquisa. E são avaliados por gente que não tem relação com os professores envolvidos. É auditoria interna, procuradoria... O reitor já assina o convênio endossado por olhares colegiados.
Pedimos dados sobre convênios feitos com empresas em 2014. Chama a atenção que a universidade ficou só com 5% dos R$ 26 milhões dos 98 convênios. Ou seja, a maior parte do dinheiro não vai para a UFRGS, vai para professores. Por quê?
Tem dinheiro que não está ali. Os 5% se referem, em geral, a taxas de custeio. É o menos relevante. O grosso do dinheiro do convênio se reverte em equipamentos, insumos (de laboratórios, por exemplo) e um saber intangível. Serve para formação e pesquisa, para propor outros projetos.
Mas os professores ficam com mais recursos que a UFRGS. Não seria aliciamento de cérebros por parte das empresas?
O investimento é em dinheiro, mas também em formação. O que a gente ganha em conhecimento num projeto desses não tem como mensurar. A universidade se beneficia, e muito, com convênios empresariais. É experiência conquistada na pesquisa. Antigamente, a gente ia na Fiergs (Federação das Indústrias do Estado), e a crítica era: cadê a pesquisa aplicada da UFRGS? Pois, nos empenhamos num parque científico-tecnológico, no empreendedorismo. Mudamos a lei para melhorar a interação universidade-empresa. Não nos beneficiamos em lucro, mas na construção de novos laboratórios e produção de conhecimento.
Há o caso de um funcionário federal que não cumpriu presença mínima em sala de aula. Mesmo assim, foi aprovado no mestrado. Qual sua opinião?
Existe regra de presença mínima de 75% na graduação. Na pós, não há regra geral. Tem de cumprir créditos. A grande maioria é presencial, mas o aluno pode ganhar créditos de outra forma. Se o meu aluno de mestrado publicar um trabalho A1, o top class dos trabalhos da Capes, ganha créditos e não precisa ir à aula. Conheço o aluno em questão, o Hêider Pinto. Ele foi diretor de atenção básica do Ministério da Saúde. O encontrei quando buscava convênios. A gente quer parcerias com o ministério. E o Hêider tem uma expertise enorme. Ele pode compensar as atividades de aluno mediante trabalhos, seminários. A pós tem essa elasticidade de assimilar as experiências dos alunos para fazer um programa melhor ainda.
Instituto de Geociências defende docentes
Diretor do Instituto de Geociências da UFRGS, André Mexias encaminhou nota a ZH na qual defende o trabalho dos docentes da sua unidade que firmam convênios externos. Ele ressalta que esses termos de cooperação só vigoram após passar por pelo menos nove instâncias de controle, no instituto e na universidade.
Ele discorda também que a atividade dos professores possa ser medida em cálculo de pagamento por horas. "Esse mecanismo não compreende a complexidade da pesquisa e a formação dos recursos humanos relacionados a ela", diz o texto. Com relação aos valores diminutos destinados pelos convênios à UFRGS, ele diz que se referem a "custos mínimos administrativos".
Mexias diz que a universidade é compensada também com aquisição de equipamentos para o desenvolvimento de pesquisas e recursos para auxílio aos alunos.
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* Zero Hora