Prestes a completar três anos, a legislação que prometia atropelar a cultura do sigilo conseguiu superar obstáculos, mas ainda tropeça no Rio Grande do Sul. De acordo com levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE), apenas 20% das prefeituras e 5% das Câmaras de Vereadores cumprem as principais exigências da Lei de Acesso à Informação em suas páginas na internet.
Um dos problemas é a persistência do tabu em torno da divulgação dos contracheques dos servidores públicos, embora Porto Alegre tenha sido uma das primeiras capitais do país a dar o exemplo - ao contrário do governo estadual, que segue omisso mesmo com a troca de governo.
Para se ter uma ideia do tamanho da resistência, até o ano passado, somente 36% das administrações municipais e 17% das casas legislativas divulgavam os nomes e salários de seus funcionários. Isso não significa que inexistam motivos para comemorar.
No final de 2014, depois de concluir o mais completo estudo já feito sobre o tema no Estado, o TCE decidiu premiar as boas práticas em transparência. Ao todo, 99 prefeituras e 24 Câmaras atingiram as metas estabelecidas pelos técnicos e agora ostentam um selo de qualidade. A intenção é repetir a avaliação anualmente.
- O objetivo, com isso, é estimular a administração pública a disponibilizar cada vez mais informações em seus portais - diz o presidente do tribunal, Cezar Miola.
Apesar de tímido, o resultado também é visto com otimismo pelo cientista político Gregory Michener, especialista no assunto. Professor de Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (FGV), o canadense elogia a atuação do TCE na busca por mudanças e acredita que o Rio Grande do Sul "está no rumo certo".
- O mais importante para garantir que os avanços continuem é seguir promovendo o uso da legislação. Uma lei que não é utilizada é como uma língua não falada. Acaba esquecida - resume o pesquisador.
Lei de Acesso à Informação esbarra em limites tecnológicos
Câmaras apresentam resultados piores
O estudo do TCE identificou um desequilíbrio entre os poderes Executivo e Legislativo no tratamento dado à Lei de Acesso. Em comparação com as prefeituras, as Câmaras de Vereadores estão atrás em transparência.
Todas as 497 gestões municipais têm sites, mas o mesmo não se aplica às casas legislativas. Conforme o levantamento, 93 Câmaras (18,7% do total) não contam com páginas na web.
- Como as Câmaras têm atribuições diferentes do Poder Executivo, decidimos avaliar aspectos específicos. Verificamos, por exemplo, que apenas 24 delas disponibilizam os votos dos seus vereadores - explica o auditor Renato Pedroso Lauris.
Entre as explicações para o resultado negativo estão a falta de recursos e de estrutura. Além disso, na opinião do cientista político Gregory Michener, as Câmaras são menos pressionadas a oferecer dados porque muita gente sequer sabe para que elas servem.
Apesar disso, tanto as Câmaras quanto as prefeituras que desobedecem a legislação podem ser punidas. Desde o ano passado, ao avaliar a prestação de contas dos gestores, os auditores do TCE observam a atenção dada à Lei de Acesso à Informação. O descumprimento pode contribuir para a desaprovação das contas e resultar em multa ao responsável.
O estudo do TCE
Foco: os técnicos do TCE avaliaram os portais das prefeituras e Câmaras do RS. Todas as 497 administrações municipais possuem sites. No caso das Câmaras, 404 (81,3%) têm páginas na internet.
Período: a avaliação correu em outubro e novembro de 2014, a partir de um questionário padrão, contendo 20 itens.
Divisão: a pesquisa avaliou separadamente municípios com mais e menos de 10 mil habitantes. Motivo: a Lei de Acesso à Informação dispensa os menores de publicarem dados na internet. O TCE decidiu avaliá-los para destacar boas práticas.
Mais de 10 mil habitantes em 2014: 168 municípios
Até 10 mil habitantes: 329 municípios
O que é a Lei de Acesso à Informação
Determina que é dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, de forma objetiva, ágil e transparente, e exige a divulgação de dados de interesse público, independentemente de solicitações.