Ao retirar terra de um terreno da Rua Florinda Fink, no bairro Cerâmica, em Erechim, Doglas Pavan estranhou o enorme buraco surgido. Até então, o empresário não imaginava estar sobre um túnel escavado por mamíferos gigantes há milhares de anos.
De acordo com pesquisadores, o Rio Grande do Sul é o Estado do Brasil que mais contabiliza esses labirintos subterrâneos - seria também a principal região do mundo. São mais de mil. Confirmado em outubro, o caso de Erechim é o mais recente, mas já há outros em estudo. Em um trecho das obras de duplicação da BR-116, entre Guaíba e Pelotas, suspeita-se que existam mais de cem paleotocas. Em 20 escavações - das 40 que deverão ser feitas nas margens da rodovia -, foram encontrados 85 túneis, conforme relata o geólogo Heinrich Frank. Sete devem ser pesquisados ainda este ano.
Referência no estudo desses labirintos que serviam de abrigos subterrâneos para animais pré-históricos, como tatus e preguiças gigantes, o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) também foi chamado à cidade do norte do Estado.
Túneis são obra de animais como a preguiça-gigante, que viveu cerca de 20 mil anos atrás (Projeto Paleotocas/Divulgação)
- É uma das maiores já feitas, provavelmente somava cem metros de túneis - observa Frank.
O pesquisador explica que a maioria das paleotocas encontradas está completamente preenchida, pois não resistiu às interferências do tempo e da água.
- Os estudos sobre o assunto são muito recentes, e quanto mais túneis, mais poderemos saber do tema, que ainda tem muitos mistérios - esclarece Frank.
Um desses mistérios diz respeito à razão de se encontrar tantos labirintos pré-históricos no Rio Grande do Sul, já que os tatus e preguiças habitaram todo o continente. Os pesquisadores ainda não conseguiram apontar um motivo.
Pesquisadores encontraram marcas de garras, provavelmente de preguiça-gigante (Projeto Paleotocas/Divulgação)
Para se ter uma ideia, no Brasil, já foram localizadas paleotocas em Estados como São Paulo e Paraná, mas menos de 10 em cada um deles. Em Santa Catarina, há o registro de cerca de cem. Na Argentina, no Chile e na Bolívia também há possíveis registros, mas os estudos, de forma geral, ainda são muito recentes.
Em Erechim, o dono do terreno onde está a mais recente descoberta no Rio Grande do Sul garante que vai manter preservado o túnel, mesmo construindo uma casa de três andares ao lado dela. Pavan pretende instalar uma porta na entrada, para barrar invasores ou aventureiros.
- Eu não fazia ideia do que era (o túnel localizado). Até pensei que fosse um córrego, mas não tinha água. Até que uma vizinha começou a pesquisar e descobriu que poderia ser uma paleotoca - lembra o empresário.
E se você encontrar um túnel?
- Entrar em uma paleotoca, dependendo do caso, pode ser perigoso e até fatal. Segundo os pesquisadores, pode ocorrer asfixia, inalação de substâncias tóxicas, além do risco de soterramento. Portanto, nunca se deve entrar em uma paleotoca sozinho ou sem equipamentos de segurança. Se você encontrar algum túnel que possa ser uma paleotoca, contate os pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul , pelo e-mail paleotocas@gmail.com
É permitido construir sobre uma toca dessas?
- Muitos proprietários de áreas com paleotocas temem que a descoberta implique tombamento, desapropriação ou interdição da área, mas isso não acontece. Conforme a legislação de proteção ao patrimônio paleontológico e arqueológico, as tocas se constituem em sítios paleontológicos que devem, na medida do possível, ser preservados, mas os terrenos podem ser vendidos e sofrer interferências.