Do pé da escada, a então monitora Débora Perin avistou três colegas pendurados pelas pernas com cordas, sob o domínio de internos rebelados que ameaçavam jogá-los de cabeça contra o chão caso a Brigada Militar invadisse a ala.
Recordações macabras como a da funcionária são o que sobrará do prédio da antiga Fundação Estadual do Bem Estar do Menor (Febem), na Capital, se depender do plano do governo do Estado para a área no Morro Santa Teresa.
Transformar a área em centro de formação profissional é um projeto ambicioso da secretaria estadual da Justiça e dos Direitos Humanos, comandada por Fabiano Pereira.
Faz parte da remodelação da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase), que será descentralizada. A previsão é de ter quatro novas unidades: duas na Capital, uma em Osório e uma em Santa Cruz do Sul.
Este ano, um acordo com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) poderá despejar US$ 28 milhões (mais de R$ 52 milhões) na Fase. Para o diretor administrativo da fundação, Marcelo Machado dos Santos, o objetivo é proporcionar estudo e o aprendizado de uma profissão aos adolescentes em um projeto que integre famílias e comunidades. Seriam erguidos novos prédios, e o que restou da atual edificação seria demolido.
Outra opção para a área é transformá-la em um parque. Mas os projetos não são excludentes: o centro de formação e o parque poderiam coexistir.
Devido aos saques, sobrou pouco entre as paredes da edificação abandonada em 2002 para contar a história de um modelo equivocado de recuperação de jovens infratores.
Saqueado, prédio é usado por drogados
Hoje, pode-se ver que a estrutura em nada diferia de uma prisão para criminosos comuns, com grades em janelas minúsculas, camas de tijolos e banheiros espartanos.
Os escombros espalhados por 1,2 mil metros quadrados são guardados por vigilantes contratados pela Fase. Com alguma frequência, flagram jovens lá dentro. Normalmente, trata-se de usuários de crack em busca de um esconderijo.
Débora começou a trabalhar como monitora no local apelidado de "casa dos horrores" em 1998, ano da maior tragédia do local: um incêndio durante rebelião, que matou três internos. Hoje, ela é coordenadora jurídica da Fase.
Na sexta-feira passada, ao voltar ao complexo, ela reconheceu o silêncio proporcionado pelas grossas paredes que separavam as alas e abafavam os sons das rebeliões.
- O motim parece uma onda. Ele vem vindo e quebrando tudo. A gente não ouvia nada e estava tão acostumada ao tumulto que não se contava sobre uma rebelião em uma outra ala. Ficávamos sabendo no outro dia - relata, como se recordasse um pesadelo.
Projeto social
Governo do Estado pretende transformar ruínas da Febem em local para formação de jovens
Objetivo é proporcionar estudo e o aprendizado de uma profissão aos adolescentes, integrando famílias e comunidades
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