Imagine a seguinte cena. Um bebê de três meses, com berço, cercadinho e brinquedos. Algo corriqueiro na vida de pais de primeira viagem. A não ser que isso seja em um ambiente de escalada em área de rocha. Assim foi o começo da paixão de Amanda Cruscuoli, 17 anos, atleta da modalidade em Porto Alegre.
A modalidade deu os primeiros passos nos Jogos da Juventude de Buenos Aires, em 2018, e fez sua estreia olímpica em Tóquio 2020, assegurando lugar nas Olimpíadas de Paris 2024.
O desejo da menina vem desde a infância e surgiu por influência dos pais. Deivis e Fabiane, quando Amanda nasceu, já escalavam havia sete anos. Quando se tornaram pais da menina, começaram a frequentar os parques da Capital, mas não se sentiam confortáveis com o ambiente um pouco monótono, se comparado com a área de escalada.
Então, trocaram o destino e voltaram a frequentar locais de prática da modalidade com Amanda a tiracolo. Com três meses, o bebê ia com todos seus apetrechos. Berço, cercadinho, brinquedos e livros para pintar. Aos seis anos veio a primeira manifestação de desejo para praticar a escalada.
— Pai, quero treinar — disse Amanda a Deivis.
O combinado, então, foi que o pai seria o treinador por um ano e, se a menina seguisse interessada no esporte, eles procurariam um novo técnico para continuar a carreira da escaladora. Foi o que aconteceu. A vida dos pais se tornou um "se vira nos 30" para ajudar a filha a manter o foco na escola e na escalada.
A partir daí, Amanda foi crescendo no esporte. Aos 10 anos, tornou-se a mais jovem escaladora brasileira a encadenar (escalar sem queda) uma via de dificuldade 8a no Brasil — a graduação no país vai de 1 a 11.
Aos 12, repetiu o feito, mas em uma via 9a. Por fim, dois anos depois, conseguiu o encadenar uma via 9b, sendo também a mais jovem brasileira a fazer isso. Agora, está em um projeto para encadenar uma via 10a.
Em 2017, tornou-se a mais jovem escaladora a receber o Prêmio Mosquetão de Ouro na categoria da modalidade. Em 2022, repetiu a proeza, entrando na seleta lista de pessoas que receberam esse prêmio mais de uma vez.
Mas para se dedicar inteiramente à modalidade, teve de abdicar de outras coisas quando mais nova. Esportista nata, ela praticava, além da escalada, natação, balé e patinação. Em 2020, ainda se dividia entre o seu atual esporte e o balé, mas, em determinado momento, não conseguia mais conciliar as duas atividades. Então, optou pela escalada.
— Eu cresci no ambiente, então nunca achei que praticar fosse uma obrigação. Sempre foi algo natural e eu fui pegando gosto. Eles (pais) me influenciaram de forma positiva e me fizeram não ter medo de altura — revela Amanda.
Ainda estudante, ela precisa se dividir entre a escola e os treinos. A menina de 17 anos treina todos os dias entre 3 e 4 horas a técnica da modalidade e força. Nas sextas, ainda faz academia para manter a forma física. No sábado, sai pelo RS para fazer rocha (termo para subir pedras em montanhas). Antes, ainda estuda das 7h40min até 12h20min.
O empenho entre aulas e a escalada deu resultado no ano passado, quando Amanda fez parte da seleção brasileira de base da modalidade. Além de ser tricampeã gaúcha adulta, foi sétima no adulto e segunda no sub-20, fez sua primeira viagem internacional sem os pais. Ela disputou o Mundial Juvenil do esporte na Coreia do Sul.
Com o apoio da Associação Brasileira de Escalada Esportiva (ABEE) e da Associação Gaúcha de Montanhismo, a menina gaúcha conseguiu se inscrever e viajar pelo Brasil e para a Coreia. Ela também faz parte do ProEsporte, programa do Estado de incentivo ao esporte.
Amanda recebeu R$ 75 mil em um período de um ano — começou em junho de 2023 e vai até junho de 2024. O dinheiro também é utilizado para viagens, além de pagar os custos do treinador e de agarras (equipamentos usados na escalada). Ela tem um sonho compartilhado com milhares de jovens que querem levar o esporte como profissão:
— Sempre quis ir para uma Olimpíada. Mas sei que é caminho longo e requer muito esforço.
Quais são as regras da Escalada Esportiva?
Existem regras diferentes para cada disciplina de escalada esportiva. No boulder, os atletas escalam paredes de 4,5m de altura sem cordas, em período limitado de tempo e no menor número de tentativas. A classificação é decidida pelo número de obstáculos superados.
Na prova de lead, os atletas escalam com uma corda o mais alto que conseguem em uma parede de mais de 15m de altura, em seis minutos, sem ter visto o percurso antes do tempo. Requer muita habilidade física e mental dos atletas.
Speed é uma corrida contra o relógio, com rodadas de eliminação no um contra um, que combinam precisão e explosividade. A parede tem 15m de altura e inclinação de cinco graus.
Escalada Esportiva e os Jogos Olímpicos
A escalada esportiva estará em Paris 2024 com um formato diferente: serão duas séries de medalhas por gênero. Ao invés de competir em uma única prova que combina boulder, lead e speed, os atletas vão batalhar pela glória em duas provas: speed; boulder e lead combinados — com uma medalha de ouro em disputa em cada evento.