Punida pela Federação Internacional de Tênis (ITF), após ter testado positivo para duas substâncias que integram a categoria S1, de agentes anabolizantes, que estão na lista de fármacos proibidos da Agência Mundial Antidoping (Wada), a brasileira Bia Haddad Maia está de volta às quadras.
Mesmo que ainda não seja do jeito que a canhota de 24 anos gostaria, a liberação para ao menos poder treinar enquanto o circuito segue suspenso por causa da pandemia de covid-19, foi um alívio para a jogadora que tem no currículo dois vices-campeonatos juvenis de duplas em Roland Garros (2012/13) e uma semifinal em Wimbledon (2011).
A rotina de Bia tem sido dividida com outros jogadores em Itajaí, em Santa Catarina. A cidade foi escolhida pela Confederação Brasileira de Tênis (CBT) para receber alguns tenistas do país, que utilizam as instalações da Academia ADK e do Clube Itamirim.
O doping é um assunto delicado na vida de qualquer atleta de alto nível. Em maio deste ano, mais precisamente no dia 22, quando finalmente recebeu autorização para voltar a treinar e jogar, Bia Haddad Maia fez um relato sobre como recebeu a notícia da suspensão, em entrevista publicada nesta sexta-feira pelo portal A Voz do Tênis. Na ocasião, ela disse: "Até hoje eu não consegui terminar de ler a carta da ITF. Eu lembro que gritei de desespero. Fui do céu ao inferno. É libertador compartilhar hoje com você a minha história".
A carta a qual a tenista nascida em São Paulo faz referência é o e-mail que recebeu com o comunicado da Federação Internacional de Tênis de sua suspensão, em 12 de julho do ano passado. Dias antes, elas havia obtido a maior vitória de sua carreira, ao eliminar em Wimbledon, a espanhola Garbiñe Muguruza, campeã de 2017.
—Ainda está no e-mail. Mas nunca consegui terminar, desde que eu soube do assunto. Eu estava num momento positivo (top 100), foi um tapa na cara - contou Bia, em entrevista ao programa Gaúcha 2020, da Rádio Gaúcha, neste sábado (4).
Como tem sido esse momento de pandemia pra você ?
— Um momento atípico para todos. Eu senti bastante, uma mudança bem drástica. Todo mundo achava que seria menos tempo. Eu já tinha uma mudança na rotina, por conta do momento que vinha passando (suspensão por doping), fora do circuito. Para mim foi menos doloroso porque já havia mudado minha rotina.
Por causa da suspensão você teve que parar de jogar, treinar. Como você encarou esses 10 meses (estava suspensa desde julho de 2019) ?
— Foi algo que me deixou bastante com o coração partido, estar longe do circuito, de não ter jogos, um objetivo concreto. É o que todos estão sentindo agora com a pandemia, sem data para o retorno e saber o que vai acontecer. Eu consegui lidar bem, tentando buscar coisas que gosto, as pessoas que gosto. Todo atleta gosta de estar ativo e é o que mexe conosco por dentro.
Em maio, você declarou que não tinha conseguido ler a carta (e-mail) da ITF com o comunicado da suspensão. Já tentou de novo ou você apagou ?
— Ainda está no e-mail. Mas nunca consegui terminar desde que eu soube do assunto. Eu falei com os advogados e não tinha muito o que fazer. Eu estava num momento positivo (top 100), foi um tapa na cara, um susto. Infelizmente aconteceu e eu aprendi muito, inclusive a ser mais forte e até a lidar com a pandemia de outra forma. Tudo isso foi doloroso, mas que fez me refletir, assim como algumas lesões que me fizeram parar e dar uns passos para trás e retornar nessa jornada (carreira)
O período de treinos em Itajaí tem servido para matar a saudade das quadras ? Como tem sido esses dias aí, junto com outros jogadores ?
— Eu matei essa vontade (de voltar a treinar). Nós temos um turno, de uma hora por dia. Eles abrem as quadras, de saibro, rápida, coberta. Nós temos treinadores, preparadores, fisioterapeutas à disposição, tudo organizado pela CBT. Tudo é feito tem rodízio, sem contato, sem uso de vestiários. O tênis não tem muito contato mesmo e voltar para um ambiente competitivo, onde todos tem o mesmo objetivo, nesse momento incerto (pandemia) é bom para encontrar motivação.
Uma das grandes polêmicas nesse período de pandemia foi a realização do Adria Tour, circuito promovido pelo Novak Djokovic, que terminou com vários casos de covid-19. Se fosse convidada para um evento desses você aceitaria ?
— Não ! Eles foram acima do que precisava. Tudo bem querer voltar a jogar, querer fazer alguma coisa sem envolver muitos países, com pessoas próximas. Mas não usar máscaras, não respeitar o isolamento social. A gente ainda está na pandemia, não é porque tinha diminuído lá (Sérvia e Croácia). Ainda não se sabe o que vai acontecer, se vai ter uma segunda onda. Ainda não tem vacina. Então é tudo muito perigoso. Acho que o próprio Djokovic não está contente com o que aconteceu. Então fica uma lição muito séria. Eu não fui favorável e não participaria de um torneio nessas condições.
O tênis tem uma rotina muito atípica para os atletas porque vocês viajam o ano todo, por vários países. Com a questão da pandemia de covid-19, você se sente segura para voltar em agosto, como se projeta ?
— Não é fácil. Quando a WTA, a ATP e a ITF decidirem o retorno tem que estar muito claro que será seguro. Eu acho que agosto é cedo, pensando que ainda tem muitos casos ainda. Eu não acho 100% seguro. Eles estão tomando decisões e tem pessoas responsáveis por isso e estão buscando o melhor. Acredito que tenham todo o cuidado. Até agora confirmado o US Open, apenas com os 120 melhores do ranking. O meu cuidado já era grande e agora mais ainda. Saber onde está, o que faz. Cuidar com quem tem contato, higiene, saúde.
"É espírito de equipe, jogar pelo país, ter uma experiência única"
BIA HADDAD MAIA
Tenista brasileira sobre disputar Jogos Olímpicos
O coronavírus parou o mundo. Os Jogos Olímpicos foram cancelados e você perderia por conta da suspensão. Mas com o adiamento ainda nutre expectativas de estar em Tóquio em 2021 ?
— É uma esperança. Dá pra pensar, algo como um objetivo, apesar de ser muito difícil, porque vou começar jogando pelos torneios menores (perdeu ranking pelo doping). Farei de tudo que estiver ao meu alcance. É um sonho pra mim e todos os atletas. Isso me motiva. Apesar de um motivo triste, ao menos pra mim foi algo positivo.
Uma dúvida. Porque atletas profissionais, como tenistas, fazem tanta questão de disputar uma Olimpíada, já que desde o Rio 2016, ela não vale mais pontos no ranking mundial ?
— A Olimpíada pro tênis não é a (competição) mais almejada. Se você for escolher entre ela e um Grand Slam, nela você não pontua e não recebe premiação. E você investe a vida toda pra isso. Mas a questão não é essa (financeira). É pensar na Vila Olímpica, onde todos os melhores do mundo estão ali. É espírito de equipe, jogar pelo país, ter uma experiência única. Isso é muito mais que apenas ranking e dinheiro. E hoje as pessoas estão muito por isso. Mas a gente joga porque gosta e pra mim significa bastante disputar os Jogos sim.