Medalha de prata em simples e ouro em duplas nos Jogos Olímpicos da Juventude de 2014, campeão juvenil de duplas em Wimbledon e vice-campeão Roland Garros, bicampeão do Banana Bowl, bicampeão do Campeonato Internacional juvenil de Porto Alegre e ex-número um do mundo do ranking mundial de tênis até 18 anos. Este é o currículo do gaúcho Orlando Luz.
Apesar dos grandes títulos como juvenil e de ser apontado como um prodígio, a caminhada no profissionalismo tem sido mais dura para o jogador nascido em Carazinho e que, aos 22 anos, é o número 116 do ranking mundial de duplas e 301 de simples na classificação da ATP.
Além das dificuldades naturais da transição, Orlandinho enfrentou a pressão para ser o novo Guga Kuerten e um adversário ainda mais sério. Em 2017, ele descobriu ter ceratocone, uma doença degenerativa da córnea do olho humano, que perde seu formato arredondado e esférico e passa a assumir um padrão de cone. Dessa forma, a pessoa passa a ter uma visão de baixa qualidade, com perda de foco e distorção das imagens.
Como corria o risco de necessitar de um transplante de córnea, Orlando Luz se submeteu a uma cirurgia denominada "cross linking", que apenas impede que a doença siga progredindo e não cura ou recupera o que já foi perdido. Depois de um período de recuperação, ele voltou a treinar e jogar. Porém, a lente do olho esquerdo passou a incomodá-lo, já que se movia e arranhava a córnea. Dessa forma, com apenas 20% de uma visão comum no olho esquerdo, sem o uso das lentes corretivas, ele passou a jogar usando lente apenas no lado direito.
Mesmo com todas as dificuldades, como distorção das imagens, falta de foco e incômodo com luminosidade artificial, ele não desistiu e tem objetivos traçados para quando o tênis voltar a ter competições, após a pandemia de covid-19.
— Eu estou tentando ver a parada como algo bom para mim. Estou focando na parte física e mental, para quando voltar estar perto de algo quase perfeito, se der. É difícil, ainda mais jogar sem ritmo. Eu espero voltar logo, mas com segurança. Não penso muito em ranking nesse momento. Eu estava indo bem no começo do ano. Até a parada, estava jogando bem e com resultados muito bons. No Rio Open, eu e o também gaúcho Rafael Matos ganhamos dos colombianos Cabal e Farah, líderes do ranking mundial. Estávamos confiantes. Mas agora, isso se apaga e não dá para achar que vai ser igual. Temos de começar do zero e tentar retomar aquele padrão. Eu quero furar o top 100 de duplas e me aproximar dos 200 nas simples para poder jogar qualificatórios dos Grand Slam. Depois, traço novas metas. O tênis é muito incerto, ainda mais nesse momento em que estamos — disse Orlandinho, em entrevista ao programa Gaúcha 2020, da Rádio Gaúcha.
Apesar das restrições para jogos, Luz e alguns jogadores brasileiros já voltaram a treinar em Santa Catarina. A Confederação Brasileira de Tênis (CBT) firmou uma parceria com o Itamirim Clube de Campo e a ADK Tennis , em Itajaí, que oferecem estrutura de treinamento.
Como você encarou essa etapa de quarentena, antes de ir treinar em Itajaí?
Difícil, um momento complicado para todos, não só para os tenistas. Eu fiquei sete semanas em casa, treinando fisicamente dentro da garagem. Agora, voltei a treinar aqui em Itajaí. O Itamirim e a ADK tem parceria com a CBT. Os treinos são mais curtos, ainda com pouco contato e seguindo todas restrições de distanciamento. Mas aqui estamos podendo treinar.
Você tentou jogar tênis dentro da garagem ? Fazer o "paredão"?
Eu até tentei. Mas era muito pequeno o espaço e não deu. Então cuidei da parte física, tentei não ganhar peso, nem perder muita força. Fiz um trabalho preventivo, porque depois de sete semanas sem treinar, apenas em casa, você tem grande risco de sofrer uma lesão. Mas felizmente voltei bem. Meu prédio não tem academia, então foi trabalhar a força do corpo, reinventar os treinamentos. A questão era se cuidar o melhor possível.
"Não é brincadeira o que está acontecendo, mas tem muita gente que não está levando a sério"
ORLANDO LUZ
Tenista gaúcho, sobre pandemia de covid-19
Na última segunda-feira, a ATP manteve o calendário divulgado na semana passada para o retorno do circuito no dia 14 de agosto e disse que reforçará ainda mais medidas preventivas nos torneios. Você se sente seguro para voltar a viajar e jogar?
O calendário está incerto. A ATP divulgou data e tudo, mas acho muito difícil voltar. Todos os jogadores passam por aeroportos, tem contato com muitas pessoas. Eu acho isso desconfortável. Eu me sinto um pouco inseguro. Não é brincadeira o que está acontecendo (pandemia), mas tem muita gente que não está levando a sério. E passar por aeroporto é umas das piores coisas nesse momento. Para sair do Brasil, por exemplo, você passa no mínimo por dois aeroportos. Não sei como eles estão pensando na volta dos torneios, até porque nem todos os jogadores podem viajar em voos privados, todos dependem de aviões, de trens, para os deslocamentos. Para quem não sabe os torneios duram uma semana, e você tem ainda os hotéis. Não vejo como viável estar se hospedando em um local com várias pessoas nesse momento. Acho incerto, difícil. Eu gostaria de estar jogando, mas o primeiro passo é a saúde de todos.
Nas duas últimas semanas, nós tivemos o Adria Tour, circuito promovido pelo Novak Djokovic, que acabou cancelado depois que ele e a esposa, mais Borna Coric, Grigor Dimitrov e seu técnico, Christian Groh, o preparador físico de Djokovic, Marko Paniki, e Viktor Troicki e a esposa foram diagnosticados com a covid-19. Isso já um grande exemplo, não?
Tem o exemplo desse circuito do Djokovic. Eles não tomaram as precauções, como uso de máscara, distanciamento entre as pessoas. Não deveria ter tido público. Eles mantiveram contatos com crianças, se cumprimentaram, trocaram abraços, jogaram futebol e basquete, não precisava nada disso. Foi um erro grave e que fica feio para o tênis. Ele tinha de dar exemplo, é um dos que mandam no conselho de jogadores da ATP. Não deveria ter feito o torneio, mas, como fez, tinha de ter tomado todas as precauções. O governo da Sérvia liberou para jogar, mas era óbvio que iria acontecer (contágio), e vários jogadores e outras pessoas foram contaminadas. E eles, Djokovic, (Alexander) Zverev, (Grigor) Dimitrov e (Dominic) Thiem, viajaram em jatos privados. Mesmo tendo dinheiro e estrutura para não ter contato com ninguém, eles pegaram (coronavírus). Então, não é bem assim. E a maioria dos jogadores não tem dinheiro para tudo isso, a não ser os top 20. São muitos riscos que atrapalham para volta do circuito.
Por toda a paralisação. Com alguns jogadores já treinando, alguns jogando, outros não. Você acredita que poderemos ter muitas surpresas quando o circuito retornar?
Eu acho que pode. O tênis é um esporte de muita inconstância. É muito difícil manter o mesmo nível. Tem de jogar bem todas as semanas do ano. Por exemplo, você é campeão no domingo, em Portugal, e na terça-feira já está na Espanha, com mudança de quadra, de piso, de bola, de clima, são muitas variáveis. Todos estão sem ritmo. Então pode e vai acontecer de jogadores de um ranking mais alto vencendo os favoritos. Vai ser um período de muitas lesões, pela falta de ritmo. Os jogos exigem que você suba a intensidade, o que não é a mesma do treino. As lesões serão um obstáculo.