Quando todos os caminhos parecem fechados desde o início, o que resta é lutar. Para Vinicius "LokDog" Oliveira, essa sempre foi a resposta. Aos 28 anos, originário da Lomba do Pinheiro, bairro onde mora até hoje, ele agora brilha no octógono do UFC, o ápice das artes marciais mistas, palco de outros grandes lutadores brasileiros como Anderson Silva e Fabricio Werdum.
Sua trajetória rumo ao sucesso, porém, nunca foi fácil. Começando pela sua infância, que foi muito conturbada.
— Eu era um cara que sempre queria ser o melhor em qualquer coisa que eu fazia na vida. Por querer ser o melhor, as pessoas de alguma forma queriam que eu me sentisse inferior a elas —relembra Vinicius.
Criado em um ambiente hostil, onde as pessoas o temiam, ele se sentia excluído. Foi na luta que ele encontrou sua voz e um motivo para resistir.
O interesse por lutar profissionalmente surgiu em 2012, quando Vinicius ingressou na sua primeira academia. Na época, ele se envolveu em lutas amadoras de muay thai, o que aguçou ainda mais seu interesse por competir, que já existia, quando lutava na rua para conseguir sobreviver.
No primeiro centro de treinamento, porém, LokDog só treinava boxe e muay thai. Pensando em uma possível carreira, ele mudou de academia para seguir o sonho de ser lutador.
Superação
Foi então que Vinicius entrou para o Centro de Treinamento Sombra Team, localizado no bairro Azenha, em Porto Alegre, onde treina até hoje. O caminho, porém, era árduo. Vinicius enfrentava uma jornada diária de 34km a pé até o local.
— Eram quase 10 horas de caminhada, contando ida e volta. Muitas vezes, a minha mulher era quem me dava passagem para ir treinar — recorda o lutador.
Foi essa mesma disciplina que o ajudou a superar os demônios pessoais em sua trajetória, abandonando o vício em drogas e álcool. Com o apoio da esposa, Josiane, com quem está junto desde a adolescência, e a orientação do treinador Rafael "Sombra" Ghilosso, ele enfrentou e superou desafios diários até chegar ao topo.
— A trajetória foi muito difícil. Eu pensei em desistir várias vezes, mas tinha algo dentro de mim, que tem muita fome e sofreu demais, que me falou para continuar — confessa Vinicius.
Pandemia e chance no UFC
Apesar dos obstáculos enfrentados, Vinicius perseverou. Pouco tempo antes da pandemia da covid-19, ele comprou um carro para facilitar a ida aos seus treinamentos.
A chegada da pandemia, porém, atrasou seus planos, tendo sido obrigado a vender o carro:
— Eu não tinha dinheiro para nada, estava numa situação em que era isso ou comer. Tive que vender o carro para conseguir me manter. — relembra.
A desilusão, porém, durou pouco tempo. Em 2020, em plena pandemia, Vinicius foi chamado para lutar no torneio UAE Warriors, no Oriente Médio. Lá, ele cruzou linhas inimigas, como ele mesmo diz, para ser campeão.
— Era pandemia, muitas pessoas perdendo a vida, com fome, sem emprego, e eu saí do Brasil, cruzei as linhas inimigas e fui vencedor. Foi isso que permitiu que eu saísse da situação que estava — ele recorda.
No torneio, ele realizou seis lutas, vencendo cinco delas. Deixou seu nome em exposição para o universo das artes marciais até ser convidado, em setembro de 2023, para participar do Dana White's Contender Series, torneio onde lutadores são chamados para buscar uma chance no UFC.
No torneio, ele nocauteou o mexicano Victor Madrigal e garantiu o ingresso na organização.
— Eu estava desde 2017 tentando entrar no UFC e nunca conseguia. Era sempre uma luta a mais, eu ganhava e não entrava. Ganhei lutas na frente de representantes, do próprio Dana White, e não entrava. Eu tive que derrubar muitas coisas, venci muitas batalhas para poder entrar no UFC. Quando tudo deu certo, foi uma sensação de dever cumprido — relata o lutador gaúcho.
Em março deste ano, Vinicius fez sua estreia na organização, batendo o lutador albanês Bernardo Sopaj por nocaute no terceiro round. O nome da Lomba do Pinheiro também se tornou mundialmente conhecido nos octógonos, pois, após a vitória, em um ritual tradicional do evento, o narrador gritou o seu apelido, "LokDog", acompanhado do nome da comunidade.
— Quando me anunciaram no UFC, eles sempre falam o nome e o país. Eu consegui que eles falassem o nome do meu bairro. Quando falarem do LokDog, vão falar da Lomba do Pinheiro — conta Vinicius, sobre o momento especial. Atualmente, o lutador tem um de cartel 20 vitórias e apenas três derrotas.
Reconhecimento e paternidade
O sucesso de Vinicius também se reflete na sua comunidade, onde hoje ele é reconhecido pelos moradores e, principalmente, pelas crianças. Ele pretende também, um dia, retribuir todo o carinho:
— As pessoas me consideram muito lá na Lomba do Pinheiro. Eu saio na rua e as pessoas me cumprimentam, querem tirar foto, fazer perguntas, trocar ideias. Eu amo o meu bairro. As crianças pedem para eu ensinar golpes para elas. Eu tenho planos, sonhos, de poder ajudar a minha comunidade. Tirar pessoas da rua, da vida ruim, principalmente as crianças que estão crescendo agora.
Um dos objetivos do lutador para o futuro é desenvolver um projeto dentro da Lomba do Pinheiro para atingir o objetivo de dar um futuro melhor para a sua comunidade.
Recentemente, ele também teve outra boa notícia. Em março, foi pai de Maitê, fruto da sua relação com Josiane.
— Eu não sei explicar o sentimento de ser pai, é algo que eu nunca tinha sentido antes. Quando a Josiane estava grávida da Maitê, ainda na barriga, já era um amor à primeira vista, mesmo sem conhecer ela. Mesmo sem ter visto, eu já a amava incondicionalmente — conta Vinicius.
Para o futuro, Vinicius deseja deixar um legado na luta de que o trabalho duro recompensa e realizar mais um grande sonho, o de ser campeão no UFC.
— Tem que persistir, seguir em frente, sem dar bola para a opinião alheia. Eu não tinha nada, nem esperança. Morri diversas vezes, desacreditado. Foi persistindo, seguindo em frente, com trabalho duro, dando o meu sangue e o meu suor em prol do meu sonho e do meu objetivo. Agora é persistência e trabalhar para chegar aonde eu quero chegar, que é ganhar o cinturão do UFC — relata o lutador.
*Produção: Murilo Rodrigues