A Fifa definiu a data de sua visita à sede da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e avisou que pretende se reunir tanto com o presidente afastado da entidade, Ednaldo Rodrigues, quanto com o interventor apontado pela Justiça brasileira, José Perdiz de Jesus. A Fifa vai desembarcar em solo brasileiro no dia 8 de janeiro numa comitiva composta por três dirigentes, um deles da Conmebol.
A CBF foi informada sobre a visita neste domingo (31), em nova carta enviada pela Fifa. Pela programação anunciada pela entidade máxima do futebol mundial, o trio de dirigentes fará seguidas reuniões na sede da CBF entre a tarde do dia 8, uma segunda-feira, e a tarde do dia 10.
A comitiva também pretende entrar em contato com membros do Governo Federal, que não foram identificados na carta. "A delegação tem a intenção de encontrar, na sede da CBF, entre outras pessoas, o Sr. Ednaldo Rodrigues Gomes, membros relevantes do governo federal, o Sr. José Perdiz de Jesus, a cúpula da gestão da CBF, assim como outras partes relevantes envolvidas no caso em sua passagem pelo Brasil", anunciou a Fifa.
"Por isso, pedimos gentilmente à CBF se podemos realizar estas reuniões com as pessoas e partes acima mencionadas entre a tarde de 8 de janeiro e a tarde de 10 de janeiro de 2024, e pedimos que nos forneça um cronograma para essas reuniões", completou a entidade, em carta assinada por Kenny Jean-Marie, chefe do escritório das federações, e por Monserrat Jiménez Granda, vice-secretária-geral da Conmebol.
No mesmo documento, a Fifa informou que a comitiva será composta pelo advogado espanhol Emilio Garcia Silvero, chefe do escritório jurídico e de compliance da Fifa; pelo georgiano Nodar Akhalkatsi, diretor de projetos estratégicos e governança; e pelo advogado Rodrigo Aguirre, especialista em litígio da Conmebol.
Curiosamente, Akhalkatsi também integrou comitiva que protagonizou a intervenção da Fifa na Federação de Futebol da Índia, em 2022. Na ocasião, a entidade suspendeu a federação por ter sofrido "interferência externa", o que resultou, entre outras consequências, da retirada do Mundial Sub-17 feminino do país — estava marcado para outubro do mesmo ano.
A CBF vive crise institucional e política desde o dia 7 de dezembro, quando o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) destituiu Ednaldo Rodrigues da presidência da confederação. Na mesma decisão, o tribunal nomeou José Perdiz de Jesus como interventor - ele precisou deixar o cargo de presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) para assumir a função no comando da CBF.
A movimentação gerou rápida resposta da Fifa, que não reconheceu a decisão judicial que destituiu Ednaldo e ainda ameaçou a CBF de suspensão, o que poderia tirar a seleção brasileira e os clubes nacionais das competições internacionais, como Copa Libertadores, Copa Sul-Americana e Pré-Olímpico. Desde então, Ednaldo já sofreu duas derrotas no âmbito judicial, sem obter recursos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Nas últimas semanas, a Fifa anunciou que fará uma visita ao Brasil para compreender melhor a situação e avisou que não vai reconhecer nenhuma decisão da entidade até este encontro, agora agendado para o período entre 8 e 10 de janeiro. Pela decisão do TJ-RJ, Perdiz teria 30 dias úteis para organizar novas eleições na CBF. Mas, novamente, a Fifa já se opôs e afirmou que só vai aceitar novo pleito após a visita.
ENTENDA O CASO
O julgamento que acabou tirando Ednaldo do poder do futebol tratou da legalidade de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre a CBF e o Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) em março de 2022. Na época, o TAC permitiu que a Assembleia Geral da entidade elegesse Ednaldo presidente. Mas os desembargadores Gabriel Zéfiro, Mauro Martins e Mafalda Lucchese consideraram inicialmente que o MP não poderia ter ajuizado Ação Civil Pública (ACP) contra as eleições realizadas pela entidade em 2017, quando Rogério Caboclo foi eleito.
A revisão ocorreu a pedido de dois ex-presidentes da CBF, Ricardo Teixeira e Marco Polo del Nero. Assim, o TAC também foi considerado nulo. Outros dirigentes de federações também acionaram a Justiça.
A CBF e o MP-RJ firmaram o TAC porque o órgão da Justiça considerava ilegais as regras que regiam a eleição na confederação, ou seja, a que levou Ednaldo Rodrigues ao cargo de presidente. Isso porque uma mudança no estatuto da entidade, em 2017, estabeleceu pesos diferentes para os votos praticados por federações e clubes — a brecha permitia clubes e federações de votarem em conjunto para eleger o presidente.
Foi sob essa regra que Rogério Caboclo se elegeu presidente da CBF em 2017, indicado pelo então dirigente afastado Marco Polo del Nero. Caboclo foi destituído, em meio a denúncias de assédio.
Ednaldo, então vice-presidente da CBF, assumiu o comando de forma interina após o afastamento de Caboclo. Opositores tentaram barrar a eleição de março de 2022 alegando que o TAC fora assinado por ele, como presidente interino, e serviu para referendar uma eleição que o tornaria presidente de fato.