Conhecido pelo bordão "Que lance!", o narrador Celestino Valenzuela, uma das principais vozes do jornalismo esportivo do Rio Grande do Sul, morreu na noite desta quinta-feira (15), aos 92 anos. Ele estava internado no Hospital São Francisco, da Santa Casa de Porto Alegre.
De acordo com a família, Celestino sofreu um infarto no dia 9 de junho deste ano, mesmo dia em que fez aniversário. No hospital, teve outras complicações e não resistiu.
— Ganhou de presente (de aniversário) uma ambulância e uma internação. Ele dava risada. Mas vinha tentando se recuperar. Ele ficou numa fragilidade, pegou pneumonia, e aí não voltou — conta a filha Valena.
Natural de Alegrete, Celestino chegou a atuar como jogador de futebol em São Gabriel. Era o ano de 1955, e uma lesão no joelho o deixou de molho, imobilizado. Foi aí que um conhecido da Rádio São Gabriel o convidou para ser locutor. Ele nunca mais voltaria a atuar nos gramados.
Chegou à Capital para ficar marcado como um dos maiores comunicadores gaúchos de todos os tempos. Em 1959, foi para a televisão, com a inauguração da TV Piratini. Também trabalhou nas rádios Itaí, Difusora e Farroupilha. Foi narrador esportivo da RBS TV — e da antiga TV Gaúcha — nos anos 1970 e 1980. Trabalhou também na Rádio Gaúcha, onde transmitia futebol, vôlei e basquete, além de apresentar o programa Domingo Esporte Show.
Celestino contou momentos históricos do futebol gaúcho, como as conquistas do Inter no Campeonato Brasileiro na segunda metade dos anos 1970 e os títulos do Grêmio na Libertadores e no Mundial de Clubes em 1983.
Aposentou-se em 1989, tanto da RBS TV quanto da UFRGS (era locutor da Rádio Universidade). Revelou, anos depois, que decidiu parar naquele momento, com 61 anos, porque temia não ter a mesma precisão de outro tempos na narração e "não queria fazer feio". Além disso, queria passar mais tempo com a esposa Iris e os filhos Cézar e Valena, e também tirar alguns dias para pescar, sua outra paixão.
Em 2002, esteve na festa de 35 anos do Jornal do Almoço e brincou em entrevista à ZH:
— Pois é, simplesmente disse que estava saindo e me despedi ao vivo no "Jornal de Almoço". E quando saí do ar sorteei o paletó e a gravata, pois não pretendia usá-los mais.
Segundo a jornalista Rafaela Meditsch, autora da biografia Que Lance! (2014), escrita em parceira com Eduarda Streb, Celestino saiu da vida pública para se recolher totalmente. Não gostava de dar entrevistas. Ela recorda que, desde sua despedida da televisão, poucos sabiam do seu paradeiro. Trabalhando com esporte na extinta TV COM, a jornalista costumava colocar arquivos de locuções de Celestino. Muitos fãs perguntavam onde andava o célebre narrador. Foram muitas telefonemas dispersados pela esposa, Iris, até que Rafaela conseguisse marcar um encontro com ele.
— Um belo dia, ele estava sozinho em casa e precisou atender o telefone. Ele me disse: "guria, vem aqui em casa amanhã que eu não te aguento mais" — lembra a jornalista.
Em um dia de inverno de 2008, Rafaela ficou frente à frente com Celestino na casa dele, no bairro Menino Deus.
— Foi espetacular. Só conhecia ele de arquivos. Achei que era um cara durão, em função de não querer dar entrevista, mas foi o contrário. Era brincalhão, sempre com piada na manga.
Segundo Rafaela, a entrevista após anos de reclusão fez com que Celestino voltasse a ser reconhecidos nas ruas. O livro, no entanto, não revela tudo.
— Ele tinha a seguinte marca: nunca falou se era gremista ou colorado. Jamais falava. Dizia que torcia para o Aimoré. E ele virou um torcedor símbolo do Aimoré. Confesso que ele nunca me falou se torcia para o Inter ou pro Grêmio.
Em 2012, Celestino chegou a narrar alguns momentos do Gre-Nal pelo SporTV como uma referência ao jogo que era tratado como a despedida do Estádio Olímpico. Dois anos depois, em entrevista a Zero Hora no lançamento da sua biografia, contou a origem do bordão:
— Já trabalhava há dois anos na TV Gaúcha e fui fazer um jogo do Grêmio contra o Flamengo de Caxias do Sul (atual Caxias). Em um lance, um gremista, não lembro quem, entrou área adentro. A bola sobrou sem ninguém na frente, aqueles gols imperdíveis, mas ele preferiu dar um toque de leve. O goleiro ficou olhando, e a bola passou devagar, perto da trave, saindo pela linha de fundo. Eu sempre acelerava a narração quando havia perigo de gol. Naquele momento, foi algo assim: "Bola pelo lado direito, fulano chuta rasteiro, goleiro sem reação e... pela linha de fundo! Que lance, hein?". Depois do jogo, o Clóvis Prates, diretor da emissora, me chamou. Com um cachimbo na boca, me mostrou a fita do jogo e perguntou de onde eu tinha tirado o "Que lance, hein?". Respondi que era algo não planejado. Ele gritou: "A partir de hoje, diz isso sempre!". Tinha muita gente conosco ali, foi uma risada geral.
A despedida, agora, deixará a tristeza de quem o admirava, mas tantos "que lances" marcantes jamais serão esquecidos. Seu corpo será velado nesta sexta-feira (16), na Capela do Crematório Metropolitano de Porto Alegre. Fãs que desejam enviar homenagens e flores podem entrar em contato pelo telefone (51) 3252-5000.