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Uma mistura de fatores derrubou Joseph Blatter da presidência da Fifa. Da pressão política da Uefa à financeira dos patrocinadores, o mandatário viu-se isolado. Nada pesou mais, porém, do que os desdobramentos da investigação conduzida pelo FBI.
Na noite de segunda-feira, o jornal The New York Times revelou que Jérome Valcke, o número 2 de Blatter, era o dirigente citado no relatório do inquérito americano como responsável por pagar propina a dirigentes da Concacaf pela escolha da África do Sul como sede da Copa de 2010. O escândalo estava perto demais do chefe.
- Este elemento foi crucial. É uma menção direta à Fifa, e não a uma de suas filiadas (como Conmebol ou Concacaf). A soma é vultuosa, não deveria sair da Fifa sem uma explicação do motivo do pagamento - diz Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito esportivo.
- Foi a denúncia que chegou ao poder central. Antes, ainda que sitiados, eles estavam isolados do escândalo - completa Anderson Gurgel, professor da Universidade Mackenzie e autor do livro Futebol S/A - A economia em campo.
Os efeitos da renúncia para o futebol mundial:
A renúncia de Blatter pode ter sido uma forma de sair dos holofotes antes que seu nome viesse à tona nas investigações. Nesta terça-feira, logo após a renúncia, fontes do governo norte-americano confirmaram ao New York Times e à ABC News que o presidente da Fifa é um dos alvos dos investigadores.
Se a intenção do futuro ex-presidente foi se esconder, ele não foi o primeiro dirigente da entidade a adotar a estratégia. Em 2013, seu antecessor João Havelange entregou o cargo de presidente de honra 12 dias antes da publicação de um relatório do Comitê de Ética, que concluiu que ele recebeu propinas da empresa ISL. Sua saída impediu que um processo interno fosse aberto contra ele.
A grande diferença é que, à época, recebimento de propinas em contratos entre entidades privadas não era crime na lei suíça (assim como não é no Brasil). Na norte-americana, como Marin sabe e Blatter nem quer saber, a situação é bem diferente.
Uefa ajudou a subir a temperatura
Ainda que a investigação tenha sido o ponto central da queda, não há como ignorar a importância da postura de oposição adotada pela Uefa. Crítica da administração da Fifa de longa data, a entidade europeia surfou na onda das denúncias e ameaçou tomar ações que enfraqueceriam o poder de Blatter.
Na véspera da eleição, após as prisões dos sete executivos - incluindo Marin -, Platini pediu ao presidente que deixasse o cargo. Falou-se até em boicote da Europa às eleições. As filiadas à Uefa votaram em peso no candidato da oposição, o príncipe jordaniano Ali bin Al Hussein. E circulavam rumores da desfiliação dos países europeus da Fifa ou, em uma medida mais branda, um boicote ao Mundial de Clubes.
- Já seria um novo mandato muito enfraquecido, que perdeu apoios estratégicos. A situação se agravou com essa postura enfática da Uefa - lembrou Gurgel.
Os patrocinadores chiam
Ao menos para consumo externo, os patrocinadores da Fifa se posicionaram como defensores de mudanças profundas na entidade. Nas entrelinhas dos comunicados de mega-empresas como Coca-Cola e Visa, lia-se a possibilidade de que os parceiros comerciais investissem seus milhões em outros lugares que não o ambiente sujo de escândalos do futebol.
Mesmo que as repercussões financeiras da perda de um patrocínio fossem importantes, há poucos indícios de que um rompimento estivesse próximo.
- A verdade é que todos querem estar no mundo do futebol. Na eventualidade de uma empresa deixar de patrocinar a Fifa, haveria outras interessadas - analisa Carlezzo.
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