O comentarista e ex-técnico Muricy Ramalho relembrou a chegada, montagem do time e triunfos comandando o Inter. O dono e criador do bordão "aqui é trabalho" foi o entrevistado da noite desta quarta-feira (27) no Papo Gre-Nal, em live no Instagram de Esportes GaúchaZH. O multicampeão conversou com Diori Vasconcelos em mais uma ação do Saudade do Esporte.
Aos 64 anos, Muricy vive uma nova relação com o futebol. Se antes suas entrevistas coletivas e convivência com a imprensa geravam frases inusitadas, depois de aposentado ele é responsável por analisar o jogo de dentro da transmissão. Muricy leva consigo os anos de experiência na casa-mata para embasar seus comentários. O ex-técnico relembra a formação do time Colorado em seu plano iniciado em 2003 e que colheria os frutos em 2005.
— A coisa pior para um esportista é quando tiram o campeonato, um resultado, que você ganhou dentro do campo. Quando tiram fora do campo, é um desastre. A gente não aceita. Você perde o jogo em campo, beleza. Agora, você perder fora, isso aí não dá para aceitar. Nós perdemos, sinceramente, fora do campo — avaliou o então técnico colorado quando a repetição de 11 partidas do Brasileirão tirou o título do Inter.
Confira destaques da entrevista:
Sobre o jogo contra o Corinthians, no Brasileirão de 2005, onde o Inter perdeu a chance de reassumir a liderança:
Aquilo foi uma coisa muito estranha porque a gente se preparou para ganhar o Campeonato. O Inter não fez isso de graça, começou lá em 2003. Não tinha mais como participar, era para ganhar porque fizemos um time para ser como o Inter, gigante. Nos prejudicaram demais. Primeiro com jogos que tivemos que voltar, por causa do juiz que teve problema.
Lembro de um jogo com o Fluminense no Beira-Rio que a gente foi dormir na concentração, um dia antes, em primeiro. E acordamos em terceiro. É um absurdo! Mas mesmo assim o time reagiu e a chance nossa era uma decisão ganhar do Corinthians lá. Essa era a decisão e nós tínhamos condição de fazer isso. Nossos jogadores estavam preparados, era um time mais experiente, bem formado. Os mais novos já eram experientes, igual o Sobis. A gente tinha muita chance de ganhar do Corinthians no Pacaembu, que tinha Tévez, tinha a torcida, mas a chance nossa era grande, nosso time era muito forte. Aí aconteceu aquilo…
Até brinquei outro dia numa live. Perguntaram, por que o Márcio (Rezende de Freitas, árbitro da partida), que trabalha na mesma emissora, como é que até hoje não encontrei ele. Porque o dia que eu encontrar… Ele trabalha mais em belo horizonte, ele cobre jogo lá... Eu quero um dia perguntar para ele: “Era para eu ter cinco títulos brasileiros, eu desconfio que você me tirou um… O que é que aconteceu naquele jogo?” Mas eu nunca encontrei, é uma curiosidade que eu tenho: por que que ele tomou aquela decisão?
Sobre chegada ao Inter em 2003, crise financeira e o plano que levou o Colorado ao Mundial de 2006:
No final de 2002 o Inter brigou para não cair no último jogo ele se salvou. E aí a diretoria pensou bem na frente, pra mudar tudo. Dispensou muito jogadores, quando cheguei tinham poucos. Precisava fazer um plano para recuperação do Inter. Então diretoria, comissão da época e eu passamos quase todo final de dezembro conversando. Fui antes para Porto Alegre, conhecer melhor o Inter e discutir o plano. Não tínhamos dinheiro, tínhamos que mesclar os jovens da base com experientes que íamos trazer e que não fossem caros. Essa era realidade. Buscamos jogadores fora do Rio Grande do Sul, experientes, e fomos na base com tudo porque era a única chance. Aí Nilmar, Sobis, Edinho, Daniel Carvalho, que foi o primeiro que vendemos. O Nilmar ia para a Copa São Paulo e tiramos ele. Levamos para Caxias para fazer a pré-temporada.
Idolatria a Pelé
Eu estava na base do São Paulo e o Santos jogava no Morumbi. A gente sempre ia para ver o Pelé. A gente tinha como furar pelo clube e entrar escondido, coisa de moleque. Assistimos o Pelé. Como sempre, arrebentou o jogo. Depois pensamos “poxa, vamos ver o Pelé? Vamos, mas como?” Acontece que ele não saía pelo portão principal do Morumbi. Ficamos sabendo que ele ia sair pelo clube, ia sair escondido. Descobrimos e pensamos “é hoje!”. Ficamos esperando no lugar que ele ia passar, a gente sabia. Esperamos um tempão. E quando ele veio, que alegria. E ele abraçou a gente. Pelé era um cara muito educado, gente boa do caramba. Era o melhor do mundo mas não tinha essa frescura. Abraçou todo mundo. Antigamente não tinha máquina, nada para tirar foto. Nós fomos para casa e foi o dia mais feliz da nossa vida.
Todas as vezes que eu via ele, era uma sensação diferente. Mesmo quando eu já estava acostumado a conversar com ele em casas de amigos, ainda era uma coisa estranha. Porque estamos vendo ali um rei. Um cara que não é jogador, é uma coisa de outro mundo, outro planeta.