A terceira década do Beira-Rio foi a mais dura para os colorados. Pouco depois de completar 20 anos, o estádio presenciou uma das mais amargas derrotas do clube. O Inter havia vencido o Olimpia no Paraguai e tinha tudo para confirmar, em casa, a vaga para a final da Libertadores. Mas uma derrota no tempo normal, com direito a pênalti perdido por Nilson, e outra nas penalidades tiraram da equipe de Abel Braga (vejam só) a chance da primeira conquista.
Até houve um sopro: em 1992, um time comandado por Antônio Lopes, com nomes da estirpe de Fernández, Pinga, Célio Silva, Marquinhos, Maurício e Gérson, devolveu o clube à galeria de campeões nacionais. Passando por Palmeiras, Corinthians e Grêmio, ganhou do Fluminense a Copa do Brasil no pênalti que Pinga cavou e Célio Silva quase arrancou a marca da cal ao chutar bola, grama e os sapos que pareciam enterrados na goleira do lado do Gigantinho.
Após aquela conquista, no entanto, os anos se passaram como se fossem nada. Porque não foi fácil ser colorado nos anos 1990. Convencer uma criança a torcer para um clube que amargava seca de conquistas enquanto o rival colecionava taças era uma missão complicada. É o caso dos amigos Diego e Douglas, que nasceram no primeiro ano da década.
— Ir para o colégio, naquela época, era horrível. Os gremistas massacravam os colorados com brincadeiras e flautas. Tínhamos de aguentar no osso — recorda Diego Lopes, fotógrafo de 29 anos.
Para evitar que a boa fase rival os conduzisse para o outro lado do Menino Deus (na época, a sede do Grêmio era o Olímpico), os parentes resolveram levá-los ao Beira-Rio. O pai de Diego, Walter Aledolvino da Silva Filho, ainda flertou com o perigo, ao carregar o guri para ver um jogo do rival na casa tricolor.
Em 27 de agosto de 1995, porém, acabou a angústia. O avô e um tio de Douglas, mais o pai de Diego, foram com as crianças até o Beira-Rio para assistirem a um jogo que acabou tendo a cara do Inter da década: um 2 a 2 com o Criciúma. Na partida, os catarinenses abriram o placar, os colorados reagiram e viraram, mas cederam o empate no último minuto. A vibração pela reversão no escore deu lugar à decepção pela vitória ter escapado no finzinho. Mesmo assim, eles decidiram permanecer vestindo vermelho e, no fim de tudo, era só o que importava.
— Além de ser o primeiro contato com o Inter, parei no Pronto Socorro. Estava brincando com o Diego no estacionamento do Beira-Rio depois do jogo e caí com a mão em cima de um caco de vidro. Abriu um machucado grande e tive que levar pontos. É uma cicatriz que tenho até hoje e me faz lembrar do dia em que escolhi o time para torcer — contou Douglas Lopes, contador de 29 anos.
As marcas daquele domingo estão com Diego até hoje. Foi a primeira vez que carregou a tiracolo uma câmera fotográfica. O equipamento analógico despertou nele uma paixão que virou profissão anos depois. Entre as imagens reveladas, alguns borrões e muita falta de foco: a mais marcante do dia, mesmo, é a que o pai dele registrou e os dois amigos aparecem — e, no canto, o avô de Douglas figura com o inseparável radinho de pilha colado ao ouvido.
Para não dizer que foi tudo ruim, em 1997 o Inter deu alegrias aos guris. Houve um título gaúcho, conquistado em cima do Grêmio, então campeão brasileiro, com um gol de Fabiano, que desafogou um grito entalado havia tanto tempo. Esse mesmo Fabiano ainda garantiria bons anos de flauta com a atuação magistral no Gre-Nal do 5 a 2, disputado, porém, no Olímpico. Ele e Christian formaram uma dupla ofensiva infernal. Apesar disso, um caneco de maior peso não foi parar na sala de troféus.
Para Diego, o tão sonhado título foi acompanhado da reprovação no colégio por abandonar uma prova após o foguetório do gol de Alexandre Pato contra o Al-Ahly, pelo Mundial. Mas isso foi em 2006. E isso é assunto para a década seguinte.