As ruas frias do inverno porto-alegrense estavam tomadas de torcedores e vendedores. Aquela quinta-feira, 28 de julho de 1983, parecia feriado. Camisas, bandeiras e gorros do Grêmio por todos os lados. Um bom número de uruguaios também pintava a Capital de amarelo e preto, cores do Peñarol. Era um dia histórico, que receberia à noite um jogo para ficar marcado na lembrança de todos os gremistas.
Não à toa, todos os mais de 70 mil ingressos colocados à venda para o duelo já haviam se esgotado dois dias antes da decisão no Olímpico. Até mesmo por isso, a manchete de Zero Hora da quarta-feira, 27 de julho, destacava: "Renda da partida já bateu recorde".
— Só se falava nisso em todo o Rio Grande do Sul — recorda o jornalista João Bosco Vaz, repórter da TV Gaúcha (hoje RBS TV) em 1983.
Com 73.093 pessoas no estádio, aquele foi o terceiro maior público da história da antiga casa gremista. À frente, apenas a semifinal do Brasileirão de 1981, contra a Ponte Preta, que teve 98.421 pessoas, e a final do campeonato nacional de 1982, diante do Flamengo, quando 74.238 torcedores foram ao Olímpico.
Quanto ao jogo, o favoritismo era todo dos uruguaios. Ainda que os times de Grêmio e Peñarol fossem equilibrados, conforme os jornalistas da época, o fator histórico colocava a vantagem na conta dos visitantes. Afinal, a equipe de Montevidéu já havia conquistado quatro vezes a Libertadores, incluindo a do ano anterior. O time gaúcho, por sua vez, estava apenas em sua segunda participação no torneio.
— O Grêmio ainda não era tão conhecido no cenário continental, até porque estava em sua segunda Libertadores. Na primeira, em 1982, caiu na fase inicial. O Peñarol tinha tradição. O futebol uruguaio era muito forte na época. Por tudo isso, eles eram favoritos em 1983 — afirma Júlio Sortica, repórter de Zero Hora à época.
Mas o time comandado por Hugo Bagnulo, que havia conquistado até mesmo o Mundial no ano anterior, ao vencer os ingleses do Aston Villa por 2 a 0 em Tóquio, não vivia apenas da camisa. Nomes como o do zagueiro Walter Olivera, do lateral-esquerdo Diogo Silva, do meia Mario Saralegui, do ponta Venancio Ramos e do centroavante Fernando Morena chamavam atenção e impunham respeito.
— Era um duelo equilibrado, mas o Peñarol era um time muito perigoso. Além da tradição, os jogadores eram bons. O Morena era matador, tinha uma perna esquerda muito boa. O Venancio Ramos era muito veloz. Tinha no meio o Saralegui e atrás o Diogo e o Olivera. Esse pessoal chegava junto, batia muito, mas tinha qualidade também — lembra João Bosco Vaz, que foi repórter de campo na transmissão daquela partida.
Os jornalistas recordam que a imprensa uruguaia, assim como a do centro do país, avaliava que o Grêmio tinha pouca chance de vencer. Como um time em sua segunda participação na Libertadores, sem tradição de final continental, poderia fazer frente a um clube tetracampeão da América? Eles não sabiam que teriam de encarar Hugo De Léon, Renato Portaluppi e companhia.
— O Peñarol tinha um senhor time de futebol. Era bom em todos os setores, mas o Grêmio era melhor. Tinha mais sangue. Jogando em casa, então, com 70 mil pessoas cantando, incentivando, isso mexia com aquele time — diz Newton Azambuja, que era repórter da Rádio Gaúcha naquele tempo.
No final, o favoritismo do Peñarol sucumbiu à determinação do Grêmio. O time gaúcho conquistou a América pela primeira vez para o Estado ao empatar em 1 a 1 no Uruguai e vencer por 2 a 1, no Olímpico, com gols de Caio e César. Assim começou a ser escrita a história "copeira" do Tricolor de Porto Alegre, que entrou para o rol dos brasileiros campeões da Libertadores ao lado de Santos, Cruzeiro e Flamengo.