Quem nunca viveu uma situação parecida no trabalho? As coisas não estão dando certo, os resultados não são alcançados, a equipe no geral não rende mais como rendia antes e ninguém consegue fazer uma leitura precisa para responder à questão principal: o que está acontecendo?
Diz o livro do Levítico do Antigo Testamento que o Senhor disse a Moisés que Aarão – seu irmão mais velho – deveria sacrificar um bode e oferecê-lo a Deus. Com isso, expiaria os seus pecados e os de todo o povo de Israel. Desde então, cumprindo o mandamento divino, matar um bode para se livrar dos pecados virou um hábito religioso.
Os judeus pararam de fazer essa cerimônia há muito tempo, mas a imagem do bode expiatório perdurou como uma espécie de culpado inocente, aquele responsável pela culpa dos outros. Aquele que "vai para o sacrifício" para que tenhamos todos a sensação de que algo foi feito para corrigir o que não estava dando certo.
Sem entrar em conflito com a fé e religiosidade das pessoas, vamos combinar que matar animais apenas pelo sentimento de culpa que nós humanos temos é uma atitude egoísta e que responde ao antropocentrismo de acharmos que nossa espécie é a dona de toda a vida existente no planeta. E por tanto, temos o direito de acabar com essas outras vidas quando e como quisermos. Mas este não é o debate.
DESAFIO TÉCNICO E TÁTICO
O assunto é que Luan não é o único responsável pelo desempenho pífio do Grêmio na Libertadores. Óbvio que o ex-Rei da América vem tendo atuações muito abaixo do que sabemos que ele pode render desde o ano passado. Além disso, as lesões e a fascite plantar têm agravado sua irregularidade.
Mas Luan não é responsável pela falta de tempo de bola de Geromel no gol da Católica, nem pelas saídas malucas de Kannemann que quebram a linha defensiva gremista constantemente, nem pela falta de intensidade de Maicon, pelos erros técnicos de Montoya, Marinho ou André. Não é de Luan a culpa dos gols perdidos por Everton ou Vizeu ou dos cruzamentos errados de Cortez e Leonardo Gomes.
O Grêmio de Renato Portaluppi passa pelo maior desafio técnico e tático desde que ele assumiu o clube, em 2016, e se não houver uma leitura séria e responsável sobre isso por parte da comissão técnica e da direção, a temporada do Tricolor seguirá tendo desempenhos abaixo do que este elenco pode propiciar. Vai além de apenas um jogador estar mal fisicamente.
A bola da vez atende pelo nome de Luan. Os italianos chamam de capro spiatorio. Os franceses, bouc émissaire; os ingleses, scapegoat; e os alemães, sündenbock. O "povo de Israel" sente que seus "pecados" foram expiados com o sacrifício do "bode", mas, passado um tempo, uma sensação muito estranha e incômoda toma conta de todos. Sem explicação, percebe-se que o bode segue amarrado na sala.