O futebol deve ou não continuar em meio ao agravamento da pandemia no Brasil e, especialmente, no Rio Grande do Sul, com a bandeira preta em todo o Estado pela segunda semana seguida? A questão foi levantada nacionalmente pelo técnico Lisca, do América-MG, que na quarta-feira (3) afirmou que "estava apavorado" com a situação da doença no país. Por isso, GZH procurou os 12 treinadores de clubes da Primeira Divisão do Gauchão para que opinassem sobre o tema.
Oito responderam à reportagem (Renato Portaluppi já havia falado em entrevista coletiva), sendo que apenas um foi enfático ao dizer que o futebol deveria ser paralisado neste momento. A maioria entende que é preciso confiar nas autoridades em saúde e nos protocolos das competições. O técnico do Brasil-Pel, Claudio Tencati, no entanto, mostrou-se preocupado com a continuidade do calendário esportivo:
— O futebol catarinense parou por conta da covid-19. O futebol baiano também. Outros Estados, a mesma coisa. Estamos correndo risco alto. Por isso, não concordo com o andamento da competição neste momento.
Já Renato, treinador gremista, defende que o futebol é o local mais seguro hoje devido à frequência dos testes e aos rígidos protocolos de segurança contra a doença.
— O futebol é o local mais seguro, não que seja 100%. Mas a gente está fazendo, entre aspas, um favor ao povo. Estamos trabalhando, mas, no momento que a gente joga, a gente ajuda o torcedor a ficar em casa — disse após a vitória sobre o Brasil-Pel, na quarta-feira (3).
Do lado colorado, o vice-presidente de futebol, João Patrício Herrmann, entende que uma possível decisão de paralisar os campeonatos deve partir das autoridades e cabe aos clubes manter os protocolos de segurança.
— O Internacional tem protocolos rígidos para segurança de seus atletas e funcionários. Seguindo todas medidas necessárias para a prática do futebol profissional — ressaltou o dirigente.
Veja como os técnicos (e o dirigente do Inter, já que o Miguel Ángel Ramírez recém chegou ao clube) responderam à pergunta de GZH:
Gilson Maciel, técnico do Aimoré
"Sou um funcionário, recebo ordens. Cumprimos ordens da CBF, da Federação Gaúcha de Futebol (FGF), que autorizaram a continuidade do campeonato. Eu apenas cumpro. Sei que é importante tomarmos cuidado. E nós temos esses cuidados, com protocolos de testes a cada rodada. Isso é importante neste momento tão delicado, mas eu recebo ordens. Então, a gente fica fazendo aquilo que nos foi passado pelas autoridades máximas. Repito: a CBF, a FGF, o próprio governo que criaram os protocolos e somos cumpridores dos deveres que o clube nos passou para darmos continuidade. E dentro desses protocolos, os testes que a gente tem feito, nos cuidando ao máximo, usando máscara e (álcool) gel o tempo todo".
Claudio Tencati, técnico do Brasil-Pel
"O futebol catarinense parou por conta da covid-19. O futebol baiano também. Outros Estados, a mesma coisa. Estamos correndo risco alto. Estamos na bandeira preta aqui no Rio Grande do Sul, com dificuldade para ficar nos hotéis, com várias restrições. Por isso não concordo com o andamento da competição neste momento. Concordo com o Lisca. Estamos sendo gananciosos e até individualistas por não olharmos para a conjuntura geral. É que nem o comércio, concordo que precisa funcionar. Mas estamos em um momento de quase 100% de ocupação de leitos nos hospitais. Estamos correndo riscos. O protocolo falha. Então sou contra jogar agora, sim, porque o contágio está alto. Se daqui 10 dias tiver melhorado, poderíamos rever a situação".
Rafael Lacerda, técnico do Caxias
"É uma situação muito difícil para nós, treinadores, opinarmos. Acredito que quem tem que determinar alguma coisa são as autoridades, os médicos. Vi a entrevista do Renato, e eu concordo. Acredito que o futebol seja um dos setores que mais se cuida, um exemplo disso é que a gente é testado a cada três dias. Futebol é um meio de manter as pessoas em casa, trazer nesse momento difícil uma alegria.
Também vi a declaração do Lisca, que é um cara que eu trabalhei e respeito muito, e concordo com o Lisca é uma situação difícil. O Lisca falou que tem a dificuldade das viagens, que está morrendo gente, mas está morrendo gente em todos os setores. Se for para parar, tem de parar tudo. A gente tem de pensar, parar, mas conversar com nossos colegas. Nós estamos em clubes estruturados, estamos empregados. Mas temos colegas que hoje estão desempregados, em divisões menores. Se parar a Série A, imagina a Segundona. Tenho amigos que ano passado tiveram de abandonar o futebol, então é uma questão difícil. Ninguém está certo, ninguém está errado, mas quem tem que dar opinião são as autoridades e os médicos".
Luiz Carlos Winck, técnico do Esportivo
"Sou favorável à continuidade. Sei que está em jogo muitas vidas, mas o futebol tem se mostrado um local seguro. São feitos exames duas vezes por semana, tomamos todos os cuidados, não tem torcida no estádio. Me sinto seguro para dar continuidade. Entendo e respeito a opinião do Lisca, mas concordo com a opinião do Renato. Também é preciso analisar que o Lisca está empregado em um clube com um respaldo financeiro muito maior, mas temos diversos profissionais que dependem desse trabalho para levar alimento para suas casas".
Márcio Nunes, técnico do Novo Hamburgo
"Aqui no clube a gente busca cumprir os protocolos de maneira muito rígida. Sempre tendo os testes a cada rodada, todos os cuidados que o clube nos proporciona. Mas a gente sabe também o risco alto que esse vírus ocasiona. Entendemos perfeitamente a preocupação da sociedade, a gente sabe que é bastante perigoso, um número muito alto de óbitos que vêm acontecendo nos últimos dias. Mas temos também de avaliar que a gente precisa trabalhar, precisa dar sequência no campeonato, mas logicamente respeitando muito o vírus. Então, o que a Federação Gaúcha de Futebol e as autoridades decidirem a gente vai cumprir".
Ricardo Colbachini, técnico do Pelotas
"Essa é uma decisão que deve ser tomada pelas autoridades responsáveis. Entendo que o futebol é um ambiente onde se tem um controle muito grande, com protocolos rígidos e testagens realizadas a cada três dias".
Carlos Moraes, técnico do São José
"Esse assunto, na minha opinião, é bem complicado. Porque todos hoje têm a sua opinião, e normalmente, as opiniões geram polêmicas. Acho que temos autoridades no país que são responsáveis nesta área e eu normalmente não gosto de interferir na área que eu não tenho conhecimento. Acredito que as autoridades responsáveis são as mais competentes para nesse momento definir o que vai ser feito com o futebol. Já foi feito uma vez, já se parou o futebol. Cada um sabe o qual é o problema que está vivendo. Pessoas conhecidas no nosso meio estão tendo problemas com a doença.
Mas a fala do Lisca é uma fala que pode representar alguns e pode não representar outros. Acredito que os órgãos responsáveis por essa situação toda têm de tomar as suas posições e nós, enquanto cidadãos, temos de respeitar a decisão que for tomada de continuar, porque também é o nosso trabalho, ou de parar, em função de toda essa situação que a gente vive, que é uma situação bem crítica e complicada em função da superlotação dos hospitais".
Paulo Henrique Marques, técnico do São Luiz
"Acho que a situação está muito delicada, mas a nível estadual acho que dá para seguir. Nível nacional é outra coisa, até porque não estamos em competições nacionais e por isso não saberia responder. Estamos com medo, claro, mas como está indo dá para continuar. O problema não é dentro do clube, no jogo, é na rua. A gente sai de casa e vê muita gente sem máscara, que não tem essa conscientização. Eu fiz 29 testes já desde o ano passado. Eu me cuido, mas o problema é na rua. Ônibus cheios, pessoas sem máscaras. Mas, no futebol gaúcho, como está agora, com os protocolos todos, acho que é possível continuar".
Renato Portaluppi, técnico do Grêmio
"É uma situação delicada. Essa variante está em todo lugar. Muito se critica o futebol por estar andando. Por um lado, o futebol trata de deixar as pessoas em casa. Isso é um fato positivo. Além disso, as pessoas que trabalham no futebol são capacitadas. O lugar mais seguro hoje é o futebol. Cada um tem a sua opinião, mas eu queria deixar claro que o futebol é seguro. Se não tivesse segurança, lógico que não iríamos trabalhar.
Muitas pessoas podem falar que somos muitos no mesmo lugar, mas todas essas pessoas estão negativadas. E não são só jogadores, mas todos os funcionários. Ninguém se aproxima do grupo de jogadores porque os seguranças não deixam. Justamente para alguém lá de fora não trazer para cá. Eu adoro o Lisca e cada um tem sua opinião. Mas o futebol é o local mais seguro, não que seja 100%. Não pode parar tudo no país. Daqui a pouco, a pessoa fica em casa, mas pode morrer de fome".
João Patrício Herrmann, vice de futebol do Inter
"O Internacional tem protocolos rígidos para segurança de seus atletas e funcionários. Seguindo todas medidas necessárias para a prática do futebol profissional. Nosso entendimento é de que a decisão da paralisação das competições deve partir das autoridades em saúde. O clube do povo sempre se colocou à disposição para o auxílio da sociedade gaúcha e não vai se isentar, especialmente neste momento" .