O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) anulou as punições aplicadas a D'Alessandro e Odair Hellmann, expulsos no segundo Gre-Nal da final do Gauchão 2019. Após recurso dos advogados do Inter, o Tribunal considerou impedidos três auditores que julgaram o caso e que são conselheiros do Grêmio: Márcio Floriano Júnior, Marcelo de Cabral Azambuja e Gabriel Pauli Fadel. Com a decisão, o caso terá de ser julgado novamente em primeira instância, no Tribunal de Justiça Desportiva do Rio Grande do Sul (TJD-RS), sem a participação dos três julgadores.
Expulsos no clássico, Odair Hellmann e D'Alessandro foram julgados e punidos pela Terceira Comissão Disciplinar e, depois, pelo Pleno do TJD. O técnico foi punido com um jogo de suspensão, enquanto o meia foi sancionado com duas partidas. Também expulso naquele clássico, o técnico gremista Renato Portaluppi foi apenas advertido. As penas para os colorados seriam válidas apenas para o Gauchão de 2020. Com a decisão do STJD, no entanto, as punições foram anuladas.
Márcio Floriano atuou como auditor na primeira audiência da Terceira Comissão Disciplinar do TJD-RS. Já Marcelo de Cabral Azambuja e Gabriel Pauli Fadel fazem parte do Pleno do Tribunal gaúcho e também julgaram o caso.
Apesar de o Código Brasileiro de Justiça Desportiva (CBJD) não proibir que conselheiros atuem como auditores na Justiça Desportiva, o STJD entendeu que, como o código de ética gremista veda, no artigo 15, que os conselheiros atuem, "de qualquer forma, em prejuízo aos interesses do Grêmio", haveria, na visão do Tribunal, "incompatibilidade" entre a atuação dos auditores como conselheiros e também como julgadores em casos que envolvem o Tricolor.
"Os auditores, como admitiram, seriam conselheiros do Grêmio Foot-Ball Porto-Alegrense, entidade cujo Código de Ética expressamente veda 'atuar ou representar, de qualquer forma, em prejuízo aos interesses do GRÊMIO' (art. 15). (...) O problema está na norma constante do código de ética da agremiação que os eminentes auditores voluntariamente juraram obedecer. (...) Com efeito, a intrincada questão não é ser conselheiro ou ser torcedor. (...) Trata-se de postura que não coaduna com a liturgia do cargo que, graciosa e livremente, estão a exercer. O problema encontra-se justamente na vedação à atuação, 'de qualquer forma, em prejuízo aos interesses do GRÊMIO'. Com a devida venia, a amplitude do comando permite a presunção de que, ao julgar sua agremiação, o auditor/conselheiro está normativamente e moralmente compelido a não prejudicar o clube, de qualquer forma e em hipótese nenhuma. Do contrário, estaria ele auditor/conselheiro premeditadamente, ainda que contando com eventual inércia disciplinar do clube, descumprindo seu Código de Ética. Assim, diante dessa situação sui generis, é que outra solução não resta do que a acolher a preliminar invocada pelo Recorrente, pois a antinomia entre as normas que regem a conduta do Auditor/Conselheiro levam à sua incompatibilidade para julgamentos que envolvam o Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense. (...). Por essas considerações, dou provimento ao recurso do Sport Club Internacional para, reconhecendo a incompatibilidade do Exmo. Dr. Márcio Floriano Júnior, anular o feito desde o julgamento perante a Comissão Disciplinar do TJD-RS, determinando que outro se realize, evidentemente, sem a participação do aludido julgador, o mesmo se aplicando caso haja recurso ao Tribunal Pleno do TJD/RS, oportunidade em que estarão impedidos os Exmos. Drs. Marcelo de Cabral Azambuja e Gabriel de Pauli Fadel", diz trecho do acórdão da decisão do STJD, assinado pelo auditor Antonio Vanderler de Lima, ao qual a reportagem de GaúchaZH teve acesso.
— Esse acórdão é uma aberração jurídica. Eu não trabalhei contra a instituição Grêmio. O Grêmio não era parte no processo. As partes eram o Inter como recorrente e a Procuradoria como recorrida. Essa tese é esdrúxula e não deve mais se sustentar. O CBJD (Código Brasileiro de Justiça Desportiva), no artigo 18, é claríssimo. Não há impedimento que um associado ou conselheiro de clube atue como auditor no Tribunal — afirma o auditor do Pleno e vice-presidente do TJD, Marcelo de Cabral Azambuja.
Já o auditor Gabriel Pauli Fadel também considerou injusto o entendimento do STJD.
— Divirjo da decisão. O eventual impedimento de conselheiros atuarem como auditores me parece um equívoco com base na atual legislação desportiva. A votação ocorreu com o entendimento vigente até então, de que o conselheiro não estaria impedido de atuar — argumenta Fadel.
Procurado pela reportagem, Márcio Floriano preferiu não se manifestar, alegando que "o caso ainda encontra-se sub júdice".
A decisão do STJD, de declarar os auditores impedidos e anular as punições de Odair Hellmann e D'Alessandro, não é passível de recurso. Ainda não há, porém, uma data prevista para um novo julgamento. De qualquer forma, eventuais punições só valerão para o Gauchão 2020.
O entendimento do Tribunal pode criar um novo precedente jurídico para novos julgamentos, em que os auditores envolvidos ocupem a função de conselheiro em clubes.