Alguns nem repararam que o goleiro Alisson Becker raspou a barba e depois o bigode. A explicação é simples: as câmeras raramente focam no goleiro brasileiro, que não recebeu um único chute direto a gol em 194 minutos de jogo na Copa do Mundo do Catar.
O goleiro do Liverpool, considerado pela Fifa o melhor da sua posição em 2019, saiu intacto dos duelos do Brasil diante de jogadores perigosos como os sérvios Aleksandar Mitrovic, Dusan Vlahovic e Dusan Tadic e os suíços Granit Xhaka e Breel Embolo.
— Alisson está muito focado no que quer — disse Thiago Silva, capitão de um time cujos jogadores ofensivos costumam atrair os holofotes.
A Seleção Brasileira venceu as "Águias" por 2 a 0 na estreia na quinta-feira passada e a "Nati" por 1 a 0 na segunda-feira (28), já sem contar com os lesionados Neymar e Danilo.
Ao vencer a Suíça, garantiu a classificação para as oitavas de final, faltando uma rodada para o encerramento do Grupo G, que é completado com Camarões, próximo adversário, na sexta-feira, no estádio Lusail.
Somando as duas seleções europeias, elas deram oito chutes a gol (quatro para cada), mas nenhum na direção do gol de Alisson, que aos 30 anos participa de sua segunda Copa do Mundo depois da Rússia-2018.
Dessa forma, o Brasil, um dos favoritos ao título, se tornou o segundo time a não receber chutes a gol nos dois primeiros jogos de uma Copa do Mundo, segundo medição da Opta feita desde a Copa de 1966. A primeira foi a campeã França em 1998.
Defesa consistente
No lado da Seleção Brasileira não se dá muita importância às estatísticas. O que é valorizado é a consistência da defesa, apoiada por zagueiros como Thiago Silva, Marquinhos e Casemiro, mas também com o sacrifício de atacantes como Raphinha, Richarlison e Vinicius Jr.
— Nossa equipe defende muito bem, isso não é só defender com os zagueiros, os laterais, o meio de campo. Os caras lá da frente estão ajudando. Isso é muito bom, porque quando você não concede chances você mostra sua força também — disse o ex-goleiro Cláudio Taffarel, campeão mundial nos Estados Unidos em 1994.
— Aprendemos há alguns anos que o Brasil não é só show, fazer gol, também aprendemos a marcar — acrescentou o atual treinador de goleiros da Seleção em entrevista coletiva na terça-feira em Doha.
Os pentacampeões foram a seleção com a defesa menos vazada nas eliminatórias sul-americanas (5 gols sofridos em 17 jogos) e o Brasil está entre os três, ao lado de Polônia e Marrocos, que não sofreram gols nesta Copa do Mundo.
Mas, contrariando as expectativas, a falta de destaque de Alisson, que se firmou na posição superando dois goleiros de alto nível, Ederson (do Manchester City) e Weverton (do Palmeiras), tem disparado o alarme em alguns setores da imprensa brasileira.
Fora do treinamento
Taffarel foi questionado em entrevista à imprensa sobre o incômodo do camisa 1, um dos líderes do vestiário do Liverpool e do Brasil, por não ter sido testado e pode ser surpreendido em uma fase decisiva.
— Vejo o Alisson muito ligado assim e atento ao jogo. Essa é também uma forma de participar, às vezes se comunicando, acompanhando 100% uma jogada — afirmou. — Sei que o goleiro às vezes fica chateado, quer participar, mas ele está preparado. Para quem está de fora é melhor que ele não participe — brincou. — Em 1994 eu participei muito pouco daquela Copa, a gente também tinha essa força na marcação — relembrou Taffarel.
Alisson, de 1m91cm de altura, fez uma rígida preparação para chegar ao Catar no peso ideal, e poderá ceder a vaga para Ederson ou Weverton contra os africanos na estratégia de Tite de tentar dar minutos a todos (até agora já jogaram 19 de 26).
O escolhido para defender a meta terá pela frente um trabalho árduo, e não só porque Camarões buscará a todo custo a vitória para ter chances de classificação: os desfalques de Neymar e Danilo se somam à ausência do lateral-esquerdo Alex Sandro que com dores no quadril. Com uma defesa tão desfigurada, talvez chegue o momento em que Alisson ou algum de seus companheiros finalmente usem as luvas.
— Com as mudanças no sistema defensivo é muito importante manter essa base sólida — alertou Marquinhos.
* AFP