Imagine o seguinte cenário (bastante otimista, aliás): em maio, o Brasil anuncia o controle da expansão do coronavírus e permite o retorno das atividades esportivas com público. Clubes e CBF entram em acordo, decidem terminar os regionais e seguir com as formas atuais de Copa do Brasil e Brasileirão. A Conmebol garante que Copa Sul-Americana e Libertadores também seguirão inalteradas. E que, a partir disso, Grêmio ou Inter (só seria possível um deles, já que o primeiro turno do Gauchão foi vencido pelo Caxias) avancem em todas as competições que disputarem. Imaginou? Pois prepare-se: se isso ocorrer, sua equipe disputará uma partida a cada 66 horas até o final de dezembro.
O cálculo é simples: seriam sete jogos pelo Gauchão, 11 da Libertadores (mais dois do Mundial), oito da Copa do Brasil e os 38 regulares do Brasileirão. Claro, trata-se da projeção mais positiva possível, e que nem mesmo o Flamengo atual conseguiu atingir. Mas mesmo o cenário mais pessimista, de eliminações precoces nos torneios mata-mata, já prevê um acúmulo de partidas para o segundo semestre. Até por isso, os clubes pediram um período de 20 dias de intertemporada antes de recomeçar a jogar. E, também, na CBF, aventou-se a possibilidade de enxugar o Campeonato Brasileiro.
A ideia não chegou a ganhar corpo, ainda. Mas se houver a necessidade de estender mais a parada do futebol, não se pode descartar. Na Confederação, existiu o debate de, emergencialmente, voltar à fórmula antiga, que vigorou até 2002, de fazer um turno de todos contra todos e um mata-mata na fase final. Mesmo sem ter aparecido oficialmente, o plano foi rechaçado pelos clubes.
A explicação para a negativa é simples. Os contratos com as redes de TV preveem 380 jogos, a maior parte pela Globo, outros pela Turner. Diminuindo o número, reduziria-se automaticamente o repasse de verbas dos canais. E nem clubes nem emissoras desejam isso.
– Esse formato nos propicia uma receita certa – aponta Alexandre Chaves Barcellos, vice-presidente eleito do Inter.
Do lado do Grêmio, o presidente Romildo Bolzan Jr, disse:
– Jogos e fórmulas devem ser mantidos. Faremos ajustes apenas do calendário.
O jornalista Paulo Vinícius Coelho, comentarista do Grupo Globo, sugere que o ideal seria dar por encerrados os estaduais e jogar o Brasileirão com 38 rodadas, de acordo com a necessidade do calendário.
– Isso se conseguirmos começar o futebol até junho, início de julho. Se for só em setembro, nem quero pensar, porque vamos ter muitos clubes fechando as portas e gente passando fome – completa.
Na reunião de quinta-feira (26), os clubes saíram com a convicção de que, começando até junho ou julho, o Brasileirão tem tempo suficiente para ser encerrado ainda em 2020. Os adiamentos da Copa América a das datas Fifa para as Eliminatórias abrem os buracos necessários para que a disputa ocorra, ainda que de maneira atropelada, mas sem mexer nos contratos atuais.
Apesar da relevância da questão financeira, há quem defenda a excepcionalidade do ano como uma justificativa para a mudança. Três jogadores ouvidos pela reportagem apoiam a troca: Marcelo Lomba, goleiro do Inter, Diego Souza, atacante do Grêmio, e Wallace Reis, que atualmente defende o Göztepe, da Turquia. O ex-presidente tricolor Luiz Carlos Silveira Martins, historicamente entusiasta do mata-mata, também vai na mesma corrente.
– É nossa obrigação usar essa situação do coronavírus para retomar o mata-mata. Da emoção, lota estádio e faz um grande um campeonato – diz o antigo dirigente.
A possibilidade levantada de igualar o calendário brasileiro ao europeu – ou seja, iniciando a temporada em agosto ou setembro e finalizando em maio ou junho –, não foi nem sequer levada adiante nas conversas. Mesmo que haja simpatizantes à mudança, a proposta permanece engavetada. A Série B, por sua vez, pretende copiar a fórmula da Série A.