Com modelos de gestão parecidos, Figueirense e Bragantino indicaram, na noite desta terça-feira (24), que não há uma fórmula perfeita no futebol. Ambos os clubes têm seus departamentos de futebol geridos por empresas. O clube catarinense, lanterna da Série B, foi derrotado por 3 a 0, mesmo em Florianópolis, pelo paulista, que é líder disparado.
No caso do Figueirense, o insucesso salta aos olhos não só pela derrota em casa. Depois de assinar um contrato, em agosto de 2017, que entregava a gestão do futebol ao grupo Elephant Participações Societárias S/A pelos próximos 20 anos, em troca de uma dívida que girava em torno de R$ 70 milhões, o Alvinegro chegou ao fundo do poço nesta temporada. Depois de a investidora atrasar o pagamento de salários, alguns jogadores entraram na Justiça pedindo a rescisão de contrato e até se negaram a entrar em campo contra o Cuiabá, perdendo por W.O.
Com a situação incontornável, o Conselho Deliberativo resolveu rescindir o vínculo com os investidores. Porém, nesta terça, surgiu uma outra bomba. De acordo com a jornalista Gabriela Moreira, do Globoesporte.com, a CBF foi notificada pelo presidente da Elephant, Cláudio Honigman, de que o clube estava desistindo do campeonato — o que resultaria em uma suspensão por dois anos e o retorno às disputas a partir da Série D. Os dirigentes logo negaram a intenção de abandonar a disputa. Porém, o conflito entre clube e empresa estava mais do que deflagrado.
— O Figueirense entregou seu futebol por 20 anos, renováveis por mais 15, sem garantia alguma. Mas parte das pessoas que assumiram o clube tratou apenas como um negócio mesmo, esquecendo se tratar de futebol, que envolve muito mais do que só negócios. Com administradores que não davam a mínima para o futebol, para a cidade, para a torcida e para o clube. Era só mesmo o negócio pelo negócio, mas com uma via só, que era ganhar dinheiro fácil, sem fazer os investimentos previstos por contrato — analisa Rodrigo Faraco, comentarista da NSC TV e CBN Diário Florianópolis.
O adversário da última rodada, o Bragantino, por outro lado, aponta que é possível ter sucesso com o modelo de clubes-empresa. Depois de fechar parceria com a Red Bull na metade deste ano, o time paulista despontou como a sensação da Série B e caminha a passos largos para voltar à elite do futebol nacional após 21 anos.
O padrão aplicado não é diferente do que a multinacional de bebidas já fez em outros países. Primeiro na Áustria, com o Salzburg, em 2005, depois na Alemanha, com o Leipzig, em 2009 — ambos estão disputando a Liga dos Campeões da Europa nesta temporada. A Red Bull Brasil foi fundada em 2007, em Campinas. Após algum tempo estudando e se adaptando ao mercado, optou pelo investimento no clube de Bragança Paulista. Até aqui, o resultado é positivo.
— A parceria surgiu em um momento propício para as duas equipes. O Red Bull tinha grande estrutura, mas não tinha torcida e, por pressão da matriz da Europa, precisava se vincular a um time com vaga na Série B. O Bragantino é um clube tradicional do interior de São Paulo, já foi campeão estadual, mas estava em uma situação financeira delicada. No máximo, ficaria patinando sem sair do lugar, brigando para não cair. Foi a união da tradição com a modernidade, e a torcida assimilou muito bem esta parceria — avalia Tárcio Cacossi, comentarista da Rádio 102 FM de Bragança Paulista — A expectativa é conquistar o título da B, alcançar a vaga direta para as oitavas da Copa do Brasil e, no ano que vem, brigar por vaga na Copa Sul-Americana. Também está sendo desenvolvido um projeto para o estádio se tornar uma arena para 20 mil pessoas e um CT na cidade vizinha de Atibaia. Penso que, para clubes menores, o caminho é esse: buscar investidores. Mas a parceria tem que ser consolidada, senão acontece como no Figueirense — completa Cacossi.
Modelo gaúcho
No Rio Grande do Sul, o exemplo mais próximo do que vivem Figueirense e Bragantino ocorre no Juventude, que recentemente sacramentou seu acesso à Série B. Depois de experimentar a vitoriosa gestão compartilhada com a Parmalat nos anos 1990, o time de Caxias do Sul contratou a LA Sports no final do ano passado.
— Começamos em 2004, no Paraná Clube, que foi para a Libertadores e tinha Thiago Neves, Borges, Maxwell. Migramos para o Avaí e subimos no primeiro ano, chegando em sexto lugar. Depois, fomos para o Coritiba quando o clube caiu para a segunda divisão e fomos para duas finais da Copa do Brasil com o time treinado pelo Marcelo Oliveira e que tinha Robinho, Rafinha, Léo Gago. Então, não é sonho. A gente já tem esse know-how. Sabemos que é difícil, mas nosso objetivo é chegar à Série A — diz Luiz Alberto Oliveira Filho, presidente da LA Sports.
Porém, o time de Caxias do Sul não cedeu totalmente sua gestão esportiva como nos casos catarinense e paulista. A última palavra segue sendo dos dirigentes. Mas, já no final do ano passado, a LA Sports ajudou na montagem do elenco e, em meio a esta temporada, seguiu apontando alguns caminhos a seguir.
— Começamos o ano sem dinheiro nenhum em caixa e com apenas dois atletas da base no plantel. Começamos do zero, montando o elenco gradualmente. Na Copa do Brasil, começamos a consultar diretamente a LA Sports a cada contratação. A última palavra segue sendo a nossa. Eu digo até respeitosamente a ele: a gente ouve, mas a palavra final é de quem paga a conta e responde para a cidade. Mas somos voluntários, sócio-torcedores, conselheiros e dirigentes ao mesmo tempo. A LA Sports é uma empresa com expertise no assunto e, por isso, nos ajudou muito — revela o diretor-geral do Juventude, Osvaldo Pioner.
Uma das sugestões dadas pelo investidor, por exemplo, foi a desoneração da folha salarial em cerca de R$ 600 mil para os últimos três meses do ano. Mesmo tendo a possibilidade de ser campeão da Série C, o Alviverde emprestou o atacante Bruno Alves ao CSA e o meia Renato Cajá à Ponte Preta. Até o treinador Marquinhos Santos, depois de renovar seu vínculo para 2020, foi liberado para comandar a Chapecoense. Uma situação inusitada, mas que só foi possível depois de ser o único clube gaúcho a alcançar o objetivo do acesso (São José e Ypiranga acabaram eliminados). Pelo sucesso obtido, a tendência é que a parceria se repita para a próxima temporada.
— Neste ano, eles não tiveram um centavo de benefício financeiro. Bem pelo contrário, fizeram aporte, pagaram parte do salário dos jogadores, apostando em uma vitrine de negócios, que vamos acertar, porque seria muito justo e honesto. Estamos em dívida com eles até no aspecto moral. Em 2020, eles terão o retorno — conclui Pioner.