Uma maldição colonialista está lançada sobre todos os braços da cultura brasileira. Há um consenso velado de que nossa sociedade, nossa arte e até o nosso futebol estão aquém do que é praticado do outro lado do oceano, e de que, justamente por isso, precisamos copiar processos, esquemas táticos e as fórmulas dos campeonatos europeus. Tomados por este complexo de inferioridade, assim como importamos tendências de música, moda e arte, acabamos imitando o que há de pior no futebol europeu: os campeonatos de pontos corridos.
O principal argumento dos defensores deste formato insosso, previsível e sem graça de campeonato é de que os pontos corridos propiciariam maior justiça à competição. Mentira. Repare no caso do Inter, que disputou uma vaga na Libertadores até o fim do Campeonato Brasileiro. Como não tinha mais nada a fazer na competição, o Fluminense que o Inter enfrentou na penúltima rodada jogou desmantelado, com time reserva e com a cabeça nas férias. Enquanto isso, o São Paulo, que era o adversário do Inter na disputa pela vaga, enfrentou o Fluminense em outubro, quando este clube ainda tinha algo a almejar no campeonato e jogou com força máxima e gana de vitória. O Fluminense enfrentado pelo Inter não é o mesmo que venceu o São Paulo em outubro, portanto. A fórmula que está posta não é efetivamente de "todos contra todos", mas de "alguns contra alguns".
Por isso, os playoffs são determinantes para saber quem, em condições iguais de enfrentamento, é definitivamente o melhor. Mas a questão central que afunda os argumentos pró-pontos corridos ficou evidenciada durante a final da Copa do Brasil deste ano, quando o Palmeiras venceu o Santos com um gol derradeiro de pênalti do seu goleiro, em um jogo difícil, cheio de sangue, suor e lágrimas, como tem de ser o futebol, como tem de ser uma final. Como é, em geral, a vida. Ao passo que 40 mil palmeirenses explodiram de comoção com um título arduamente conquistado com um gol do seu goleiro, os corintianos sorriram, com o cantinho da boca e estádio vazio, ao celebrarem o Brasileiro empatando contra o rebaixado Vasco, em um jogo de comadres. Que competição é essa em que já conhecíamos o campeão desde a metade do campeonato? A antítese entre o desfecho maçante e desenxabido do Corinthians e o título redentor do Palmeiras deixa-nos uma lição para não ser esquecida: pontos corridos nunca mais. Colonialismo nunca mais!