Para compreender os diversos aspectos de uma cultura, o antropólogo precisa criar uma espécie de "sociologia do cotidiano", relacionando com destreza o conhecimento acadêmico com o que ele enxerga na rua.
O coordenador do curso de graduação em Antropologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Rafael Victorino Devos, abriu as portas do museu da instituição para conversar sobre sua profissão com a vestibulanda e aspirante a antropóloga Manoela Salvador Frederico.
Como foi o bate-papo
Manoela Salvador Frederico - Qual é o perfil de um estudante de Antropologia?
Rafael Victorino Devos - Esta já é uma pergunta antropológica, pois é exatamente isso que o antropólogo faz: seleciona pontos em comum entre indivíduos bem diferentes e traça um perfil deles para explicar a forma que compreendem o mundo. Vários de nossos alunos já têm uma formação anterior e relacionam aquilo que trazem de fora com seus objetos de estudo, que podem ser os mais diversos. Também passamos um ar meio Indiana Jones, aventureiro, mas o mais importante é o compromisso que o antropólogo assume com a população ao se relacionar com a cultura que estuda. É difícil bater de frente com uma grande empresa de mineração, por exemplo, que deseja tirar uma população de algum lugar.
Manoela - Você percebe preconceito com a área?
Devos - Embora isso já tenha sido mais forte, muitas pessoas ainda não entendem direito o que é a Antropologia, o que causa uma certa confusão com áreas como a Sociologia e a Museologia. Meus pais, por exemplo, só foram saber exatamente o que eu fazia quando assistiram à minha defesa de doutorado.
Manoela - Como é o histórico da Antropologia no Brasil?
Rafael - A Antropologia passou por uma transformação durante o século 20. Hoje, alguns dos principais nomes da área vêm de ex-colônias europeias, principalmente Brasil, México e Índia. São países que estão obtendo mais visibilidade no mundo e tentando cada vez mais entender a sua própria diversidade cultural.
> Não confunda com...
Ciências Sociais
O cientista social é profissional responsável por estudar as estruturas que caracterizam as organizações sociais humanas, buscando compreender os sistemas que formam a política, a arte, a religião e a identidade de uma população.
Arqueologia e Museologia
Se a Antropologia trabalha para enxergar o sistema cultural de uma população, a Arqueologia faz o mesmo ao decifrar vestígios deixados por sociedades extintas. O museólogo trabalha com o antropólogo e o arqueólogo para selecionar e organizar o material que forma um museu, estudando técnicas de restauração, conservação e acondicionamento.
Áreas de interesse
A formação do antropólogo dialoga com várias áreas das Ciências Sociais, como a História e a Sociologia, mas pode se relacionar até mesmo com Arquitetura, Comunicação e Saúde.
Campos de atuação
A profissão não é regulamentada, o que significa que ainda não existe uma lei específica determinando quais funções um antropólogo pode exercer. Para garantir a atuação correta dos profissionais, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA) disponibiliza um código de ética, criado em 1986 e adaptado de tempos em tempos, falando tanto das funções do antropólogo quanto dos direitos das populações que eles estudam. Segundo o professor Rafael Devos, o trabalho do profissional se concentra atualmente em ONGs, órgãos públicos, museus e empresas. No setor público, os principais exemplos são a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Na iniciativa privada, o foco gira em torno da produção de laudos para grandes projetos de engenharia, por exemplo, que envolvam desapropriação de terras ou que interfiram em culturas locais:
- Muda o curso de um rio, muda também toda a cultura dos moradores da região.
Antigamente, isso era feito à força, mas hoje existe uma série de bandeiras levantadas pelos antropólogos para evitar que isso aconteça - explica Devos.
Mercado de trabalho
O professor Devos considera a Antropologia uma das áreas mais expoentes no Brasil e explica que cada vez mais as empresas são obrigadas a consultar a opinião de profissionais antes de realizar obras que causem transformações em populações locais.
No Rio Grande do Sul
UFPel
> A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) oferece o curso de bacharelado em Antropologia. Com aulas à tarde e à noite, a graduação tem duração de quatro anos e apresenta duas linhas de formação: em Antropologia Social e Cultural e em Arqueologia.
UFRGS
> Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), há o curso de Ciências Sociais, que tem tanto bacharelado quanto licenciatura - a opção é feita na primeira matrícula. O licenciado pode dar aulas de Sociologia nos ensinos Fundamental e Médio. O bacharel é habilitado a trabalhar com pesquisa em Sociologia, Antropologia e Ciência Política. Anualmente, são oferecidas 65 vagas para o curso diurno, que tem oito semestres, e 100 vagas para o noturno, que tem nove semestres.
UFSM
> A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) também oferece bacharelado em Ciências Sociais, que envolve Sociologia, Antropologia e Ciência Política. Com duração de oito semestres e 40 vagas, tem aulas à noite.
UFFS
> A licenciatura da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) é ministrada em Erechim, com aulas à noite, em nove semestres. São 50 vagas. Também abrange as três grandes áreas das Ciências Sociais: Antropologia, Ciência Política e Sociologia.
Unipampa
> Em São Borja, a Universidade Federal do Pampa (Unipampa) oferece bacharelado de quatro anos em Ciências Sociais, com ênfase em Ciência Política. São 50 vagas.