A Advocacia-Geral da União (AGU) se pronunciou nesta terça-feira (8) com contrariedade ao leilão do curso de Medicina da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra). Maria Cristina Oliveira Benetti, advogada da União, aponta que os atos regulatórios que permitem o funcionamento de uma instituição de Ensino Superior (IES) são "personalíssimos" e que é vedada a transferência de cursos entre estabelecimentos. Por isso, requereu que sejam excluídos da disputa os direitos relativos a essa graduação.
A manifestação foi feita nos autos do processo que trata do plano de recuperação judicial da Ulbra. Entre as medidas previstas, está a venda do curso de Medicina da instituição, que necessita de autorização prévia do Ministério da Educação (MEC) para funcionar. O vencedor do leilão seria anunciado no dia 31 de julho, mas, a Justiça decidiu suspender a apresentação do resultado, por entender que, antes, era preciso esclarecer alguns pontos, por meio de manifestações de diferentes entes, entre eles, a pasta de Educação do governo federal.
No ofício, a advogada da União indica que a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior teve conhecimento do edital que previa o leilão do curso de Medicina da Ulbra, mas que a alienação da graduação não é possível, visto que "os atos regulatórios que permitem a atuação de uma IES para a oferta de cursos de educação superior no sistema federal de ensino são personalíssimos". Maria Cristina cita o artigo 38 do Decreto nº 9.235/2017, que determina que a transferência de cursos entre IES é vedada.
No entendimento da AGU, foi verificado um "óbice legal" para a alienação dos direitos relativos ao curso de Medicina da Aelbra, mantenedora da Ulbra. Ou seja: a autorização dada pelo MEC para que a instituição ofereça uma graduação em Medicina não pode ser transferida para terceiros pela "mera aquisição". A legislação permite a transferência de mantenedoras, mas não de cursos, segundo a manifestação.
Ao final, a advogada da União requer que sejam excluídos do leilão os direitos relativos ao curso de Medicina da Aelbra e que seja suspenso o leilão desses direitos "no aguardo do amplo contraditório".
Partes divergem
A petição que culminou na suspensão da divulgação do resultado do leilão e na manifestação da AGU foi feita pelo escritório do advogado Fábio Medina Osório, que representa José Fernando Pinto da Costa, o filho dele, Sthefano Bruno Pinto da Costa, e os dois estabelecimentos que o empresário detém em São Paulo, Universidade Brasil e Uniesp. Em nota, o escritório sustentou que o leilão da faculdade "é efetivamente nulo" e defendeu que o certame foi "uma iniciativa espúria", e "em total prejuízo aos credores".
Procurada, a Aelbra informou que "o leilão seguirá sua tramitação normal dentro do ambiente adequado, o Judiciário", e reafirmou a confiança no seu plano de recuperação, aprovado em 2022 "por mais de 90% dos credores". No entendimento da mantenedora, a "tentativa tardia" de suspender o cumprimento do plano "é absolutamente infundada e vem de interesses contrariados, oportunistas e ilegítimos".
O escritório Brizola e Japur, escolhido pela Justiça como administrador judicial do processo, relatou que a Aelbra e alguns credores requereram que o Juízo reconsidere a decisão de suspender a homologação da arrematação do leilão, e caberá ao arrematante decidir se tentará reverter a posição da União sobre a inviabilidade de transferir os atos regulatórios do curso de Medicina ou seguir por um caminho alternativo do plano de recuperação judicial, que já previa, também, a possibilidade de vender a Ulbra inteira, sem separação. Nesse caso, o valor mínimo da compra passaria dos atuais R$ 700 milhões para R$ 900 milhões.
O leilão
Com o leilão da faculdade de Medicina, a expectativa é arrecadar pelo menos R$ 700 milhões, lance mínimo definido no edital. A disputa ocorre na modalidade de stalking horse, quando já há um interessado de referência. Trata-se do fundo de investimentos Calêndula.
O prazo de habilitação de interessados na aquisição do curso foi encerrado em 30 de junho. Esse processo engloba, por exemplo, atos regulatórios, como a autorização de funcionamento da faculdade, em Canoas, que precisa ser fornecida previamente pelo Ministério da Educação, no caso da Medicina. Um dos requisitos para a habilitação era o depósito de uma caução de R$ 10 milhões. Apenas o fundo Calêndula se habilitou, segundo o escritório Brizola e Japur.