Com edital publicado no mês passado, o leilão do curso de Medicina da Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) em Canoas deve ter, em breve, a definição de um vencedor. A disputa faz parte do plano de recuperação judicial da instituição de ensino para evitar que o estabelecimento vá à falência.
Homologado em dezembro de 2022, o plano de recuperação judicial prevê um ano – ou seja, até dezembro de 2023 – para que a Associação Educacional Luterana Do Brasil (Aelbra, mantenedora da Ulbra) pague R$ 361 milhões a credores trabalhistas por meio da alienação de imóveis. A dívida, contudo, é muito maior: em 2019, quando entrou com o pedido de recuperação judicial, a universidade somava R$ 8,2 bilhões, entre endividamento tributário e financeiro.
Valor arrecadado
Com o leilão da faculdade de Medicina, serão arrecadados pelo menos R$ 700 milhões, lance mínimo definido no edital. A disputa ocorre na modalidade de stalking horse, quando já há um interessado de referência. Trata-se do fundo de investimentos Calêndula.
O prazo de habilitação de interessados na aquisição do curso se encerrou no dia 30 de junho. Esse processo engloba, por exemplo, atos regulatórios, como a autorização de funcionamento da faculdade, em Canoas, que precisa ser fornecida previamente pelo Ministério da Educação (MEC), no caso da Medicina. Um dos requisitos para a habilitação era o depósito de uma caução de R$ 10 milhões. Apenas o fundo Calêndula se habilitou, segundo o escritório Brizola e Japur, escolhido pela Justiça como administrador judicial do processo.
Próximos passos
Está prevista para a próxima segunda-feira (31) uma reunião virtual na qual serão apresentadas as propostas. Procurado, o escritório Brizola e Japur não informou se, após essa ocasião, já será possível considerar o habilitado como vitorioso. A decisão final é do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), onde foi feita a requisição de recuperação judicial da Ulbra. Procurado, nesta terça (25) e nesta quarta-feira (26), o TJRS não respondeu à reportagem.
Pedido de suspensão
Em paralelo ao processo de leilão, um pedido de suspensão ou anulação do certame foi protocolado na Justiça por um empresário dono de duas instituições paulistas de Ensino Superior. A petição tramita, mas, até o momento, não teve uma sentença proferida.
No requerimento, assinado por José Fernando Pinto da Costa, o filho dele, Sthefano Bruno Pinto da Costa, e os dois estabelecimentos que detém, Universidade Brasil e Uniesp, as alegações principais são de que houve ocultação de informações sobre “a verdadeira composição societária da empresa em recuperação”, “a origem dos recursos investidos nela e os detentores das garantias oferecidas” e “a importância do curso de medicina para a manutenção das atividades econômicas da Recuperanda”. Nesta terça-feira (25), um documento complementar foi apresentado apontando, também, que o Ministério da Educação não se manifestou ainda sobre a possibilidade jurídica de leiloar um curso que depende da autorização da pasta para existir. A Aelbra refuta todas as alegações.
Modalidade stalking horse
A modalidade de leilão stalking horse é comumente utilizada nos Estados Unidos, mas é relativamente nova no Brasil, conforme o leiloeiro Giancarlo Peterlongo.
— O trâmite é o mesmo do tradicional, mas, no stalking horse, o proponente vai diretamente no processo para dizer que tem interesse naquele bem, e o primeiro a manifestar interesse tem prioridade. Um terceiro pode comprar se fizer uma proposta melhor, mas, normalmente, precisa pagar uma multa — explica Peterlongo.
Um exemplo de stalking horse foi o leilão do terreno e de prédios ociosos do IPA Metodista, ocorrido, também, em um contexto de recuperação judicial da Educação Metodista. Nesse caso, a Cyrela demonstrou interesse previamente. No contexto do processo envolvendo a Ulbra, é o fundo de investimentos Calêndula.
O que muda para a comunidade universitária
O edital de venda do curso de Medicina da Ulbra não especifica o que acontecerá com os alunos, professores e estrutura da graduação. A Aelbra, porém, garante que nada muda para os estudantes e que esta questão estava prevista no plano de recuperação judicial, aprovado por ampla maioria dos credores no final do ano passado. O leilão é considerado "fundamental" na busca pelo restabelecimento da saúde financeira da Ulbra, argumenta a entidade.
A Aelbra também afirma que o MEC foi notificado quando a faculdade foi separada, juridicamente, para ser leiloada de forma unitária, sob o nome de Umesa. Procurado nesta terça (25) e nesta quarta-feira (26), o MEC não respondeu sobre o assunto.