Os quase três anos de pandemia impactaram a saúde mental de muitos alunos do Ensino Superior. Estudantes de universidades, que já são naturalmente afetados pelas incertezas, dúvidas sobre permanência no curso escolhido, acompanhamento da aulas, provas e pressões pessoais e profissionais passam, por vezes, a experimentar exaustão e ansiedade.
Os impactos da pandemia na saúde mental já foram tema de várias pesquisas, não só no Brasil. Uma delas, realizada pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) com 2,6 mil pessoas, revelou cenários elevados de insuficiência de atividade física (67,2%), depressão (19%), ansiedade (30%), insegurança alimentar (33,3%) e persistência de sintomas pós-infecção (75%), a covid longa. Os resultados foram divulgados em outubro de 2022, dentro da quarta etapa do estudo. Novos levantamentos devem ser feitos em 2023 e 2024.
Não é à toa que as instituições estão mais atentas ao cenário e buscando ampliar os serviços gratuitos de ajuda profissional dentro dos campi para os estudantes.
A reportagem de GZH procurou as cinco maiores universidades da Capital: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Unisinos, UniRitter e Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA) — apenas esta última não respondeu. Os serviços oferecidos pelas três primeiras mudam conforme a entidade, mas, em linhas gerais, os objetivos são os mesmos: identificar, acolher e atender, de forma gratuita, quem precisa de apoio. Na teoria, parece simples. Na prática, é um pouco diferente, começando por um ponto crucial: muitas vezes, há resistência em pedir e aceitar ajuda.
O alerta é da assistente social Angélica da Costa, responsável pelo Núcleo de Atenção ao Estudante (NAE) da Unisinos, que existe desde 2010 e está à disposição de todos os alunos da graduação e pós-graduação dos campi de São Leopoldo e Porto Alegre.
— Nós observamos que é mais fácil oferecer do que pedir ajuda. A maioria dos nossos estudantes chega por encaminhamento de outro colega, que já foi atendido e nos indica. Ou por algum professor que identificou algo — relata Angélica.
Segundo ela, a procura pelo serviço aumenta quando começa o período de provas. O mesmo também ocorre no final do curso, quando há mais cobrança e maior sobrecarga:
—Os sintomas mais comuns são ansiedade, sentimentos de tristeza, impotência e solidão. Há uma pressão, que pode vir de fora, da família, ou dos estudantes mesmos, para dar conta de tudo e ter bons resultados. Também percebemos questões pessoais e familiares. Muitas vezes, o aluno é o primeiro da família a fazer um curso superior. Alguns relatam que os pais não entendem, que encaram como perda de tempo ficar tanto tempo escrevendo o trabalho de conclusão de curso, por exemplo.
Percepção parecida é relatada pela pedagoga Simone Martins da Silva, coordenadora do Centro de Apoio Discente da PUCRS. Na instituição, são três núcleos, que atuam de forma integrada desde 2019: de apoio psicossocial (onde há psicólogos e psiquiatras, por exemplo), de apoio à educação inclusiva e de apoio à aprendizagem. De acordo com ela, a demanda também aumenta no fim do semestre e no fim do curso.
— Nesses períodos, em especial, a gente identifica ansiedade, depressão, desmotivação, adiamento das atividades acadêmicas e até ideias suicidas. O aluno chega de diversas maneiras, mas tem sido bem comum familiares, colegas e professores nos avisarem sobre alguma situação que consideram estranha, diferente ou delicada. São serviços que atuam na dimensão do cuidado com a vida e incidem diretamente na permanência, aprendizagem e participação nas diferentes atividades do campus e, principalmente, nos propósitos dos alunos ao acessarem a universidade — relata Simone.
Uma vez acionados, os núcleos realizam escuta e acolhimento, com um ou dois profissionais, dependendo do caso. Eles analisam a situação e realizam os encaminhamentos necessários.
— O ponto de partida é a necessidade de cada estudante. A equipe vai analisar se ele segue no centro, é encaminhado para outro setor da universidade ou até para algum profissional de fora — diz Simone.
Na UFRGS, há diversas iniciativas relacionadas à saúde mental para todos os alunos de graduação e pós-graduação (leia mais abaixo). Uma delas é o Programa Saber Viver, lançado em dezembro de 2022 e em fase de implementação, que integra diferentes políticas, serviços e ações, como foco na promoção da saúde e bem-estar estudantil.
— O objetivo é promover um ambiente saudável para que o estudante possa desenvolver suas atividades e concluir sua formação. Como são diferentes ações, os atendimentos também são variados. Existem atividades individuais, outras em grupo, online e presencial. Cada ação possui profissionais específicos: algumas são com psicólogos, outras são profissionais capacitados por psiquiatras e psicólogos, outras são estudantes orientados por professores de psicologia — destaca Ludymila Barroso Mallmann, pró-reitora de Assuntos Estudantis.
Na UniRitter, o Núcleo de Apoio Psicopedagógico e Inclusão (NAPI) coloca em prática a política de atenção ao aluno por meio de projetos amparados nos princípios de equidade e inclusão, reconhecimento e valorização das diferenças. Segundo a universidade, é um compromisso com a permanência e o desenvolvimento pessoal e profissional dos estudantes no Ensino Superior.
O NAPI possui um local físico em todos os campi da instituição (Zona Sul, FAPA e Canoas). Os atendimentos são realizados tanto presencialmente quanto online, com profissionais de Psicologia e Pedagogia que ficam à disposição dos estudantes para um trabalho de acolhimento e escuta. Conforme a necessidade de cada aluno, são realizados encaminhamentos para a Clínica Integrada de Saúde da própria instituição. Também são realizados eventos abertos como oficinas, palestras e rodas de conversas relacionadas à aprendizagem, inclusão, saúde mental, diversidade e direitos humanos.
Procura aumentou na pandemia
Angélica afirma que a pandemia foi um período muito específico, com mais procura. Em um primeiro momento, o desafio era ajudar os alunos a lidar com o isolamento. Depois, eles tiveram que enfrentar situações de morte e luto.
— Tudo isso agravou aquela ansiedade já natural dos universitários, porque eles vivem dois momentos de transição: a entrada na faculdade, depois de toda a jornada do vestibular, e, depois, a entrada no mercado de trabalho, com aquela expectativa de conseguir emprego. Em torno de 70% do nosso público são mulheres, porque elas culturalmente buscam mais ajuda — completa Angélica.
Os serviços da PUCRS e da UFRGS também foram mais procurados conforme aumentava a duração da pandemia.
— No primeiro ano (2020), houve primeiro uma queda na busca de acolhimento realizado pela universidade. Talvez, em virtude da pouca familiaridade com os atendimentos online. Mas, desde 2021, a procura vem aumentando muito. Todos fomos afetados — explica a pró-reitora da Ufrgs, Ludymila Barroso Mallmann.
Como funcionam e onde encontrar
Os serviços oferecidos pelas quatro universidades ouvidas são gratuitos para os alunos da graduação e pós-graduação. Os atendimentos podem ser presenciais ou online, individuais ou coletivos. Por isso, seguem os canais de comunicação para os alunos buscarem mais informações e até já fazer o agendamento, se quiser.
Unisinos - Núcleo de Atenção ao Estudante (NAE)
O Núcleo de Atenção ao Estudante (NAE) é um espaço físico dentro da universidade, com salas de atendimento presencial ou online. De preferência, com agendamento pelo e-mail assistencia@unisinos.br . Também é possível conhecer o serviço pelo Instagram @naeunisinos. É formado por uma equipe multiprofissional, com de Psicologia, Pedagogia, Serviço Social e Educação Inclusiva e Especial. Quando o aluno chega, os profissionais fazem um trabalho de acolhimento, escuta e atendimento psicológico. Em média, são cinco encontros para fazer a análise e dar um encaminhamento a uma rede externa de profissionais. No entanto, dependendo da situação, o aluno pode ser atendido por mais tempo na universidade.
PUCRS - O Centro de Apoio Discente
O Centro está disponível para todos os alunos a todos os alunos, nos turnos manhã, tarde e noite, de 2ª a 6ª feira. O atendimento pode ser presencial, no prédio Living 360º, no terceiro andar, sala 302. Também é possível entrar em contato pelo telefone (51 3353-6036) ou por e-mail apoiodiscente@pucrs.br. O objetivo é fazer a escuta, o acolhimento e o atendimento dos alunos.
UFRGS- diferentes iniciativas
A universidade conta com diferentes ações voltadas para a saúde mental. Algumas delas são: o Projeto Pega Leve, que trabalha com a prevenção e promoção da saúde mental dentro do ambiente universitário; o Programa Medusa, com espaços de escuta, acolhimento e intervenções com estudantes sobre questões de saúde mental e vivências na universidade; e o Programa Saber Viver, lançado em dezembro de 2022 e em fase de implementação, que integra diferentes políticas, serviços e ações desenvolvidas pela universidade, como foco na promoção da saúde e bem-estar estudantil. Os atendimentos também variam. Existem atividades individuais, outras em grupo, online e presenciais. Para saber mais, é possível entrar em contato com a Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, pelo telefone (51) 3308-3240 ou pelos e-mails prae@prae.ufrgs.br e saberviver@prae.ufrgs.br
UNIRITTER
O Núcleo de Apoio Psicopedagógico e Inclusão (NAPI) possui um local físico em todos os campi da instituição (Zona Sul, FAPA e Canoas). Os atendimentos são realizados tanto presencialmente quanto online, com profissionais de Psicologia e Pedagogia que ficam à disposição dos estudantes para um trabalho de acolhimento e escuta. Conforme a necessidade de cada aluno, são realizados encaminhamentos para a Clínica Integrada de Saúde da própria instituição. O agendamento pode ser feito por meio do site bit.ly/agendamentoNAPI.