A Justiça Federal aceitou o pedido feito pela reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) de que fosse proibida a entrada no antigo prédio da Faculdade de Medicina de pessoas dos cursos de Artes da instituição que participem do movimento de reivindicação do espaço para a transferência do Instituto de Artes (IA). O imóvel, localizado na Rua Sarmento Leite com a Avenida João Pessoa, abrigava o Instituto de Ciências Básicas da Saúde (ICBS) até o início deste ano.
Na decisão, o juiz federal Luiz Clóvis Nunes Braga diz que as alegações da UFRGS, de que o local foi ocupado sem autorização, ainda que de forma parcial, foram comprovadas com os documentos apresentados pela reitoria. “Embora não estejam os demandados exercendo suas atividades em tais instalações, a intenção externada é de que tal realidade se concretize, sendo as manifestações reivindicatórias do grupo e o depósito de alguns móveis e equipamentos no local meios de pressionar a Reitoria a ceder o prédio ao IA”, consta na sentença.
O magistrado reconhece que a motivação do grupo para obter um espaço físico adequado para seu funcionamento parece legítima, diante da “aparente falta de infraestrutura adequada para a realização das atividades do IA no seu próprio prédio”. No entanto, afirma que “os meios empregados pelos requeridos não o são”.
No relato feito à Justiça, a reitoria diz que já foram realizadas invasões do espaço interno do prédio da Saúde por integrantes do IA, por meio de transferência de mobiliário para salas atualmente cedidas à controladoria da UFRGS e outra onde antigamente funcionava o gabinete da diretora do ICBS. A Secretaria de Comunicação Social informa que a UFRGS, no âmbito de sua atuação institucional, não emite manifestações a respeito de processos judiciais em curso
Um dos réus é o diretor do IA, Raimundo Rajobac. Nesta quarta-feira (4), ele e seu advogado, Francis Borda, ingressaram com uma petição solicitando uma audiência de conciliação entre as partes.
— Queremos tentar resolver de forma dialogada esse problema. O professor Raimundo é um gestor público e queremos conversar para chegar a um consenso, porque é um precedente muito perigoso para todos os lados — afirma o advogado.
Quando fala em precedente, Borda refere-se ao fato de a reitoria mover uma ação que visa que integrantes da própria universidade não possam circular por um prédio da instituição. O advogado não se recorda de que outras medidas desse tipo já tenham ocorrido anteriormente.
— O professor Raimundo é um servidor e tem o direito de circular pelos prédios públicos. Não houve nenhuma intenção de ameaçar a posse ou de prejudicar o patrimônio da universidade, até porque o maior prejudicado seria o próprio usuário, e ele é um usuário. Dialogando, esperamos conseguir resolver essa diferença entre um gestor em seu local de trabalho e o direito de manifestação dos outros — pontua o profissional.
Em nota na qual lamenta a judicialização “de um debate interno”, a Adufrgs-Sindical, que representa os docentes da UFRGS, relatou que há mais de uma década há no prédio da Saúde salas administradas e com patrimônio dos cursos de Artes, e que “a ação simplesmente solicita que o diretor não possa exercer a sua função legal de preservar o que lhe está designado legalmente”.
A entidade aponta que esta é a segunda vez que a atual gestão da reitoria move uma ação judicial contra professores da instituição, “que apenas estão cumprindo suas funções administrativas”. No texto, a Adufrgs ainda defendeu o pleito dos servidores do Instituto de Artes por um “espaço físico adequado para trabalhar” e o entendimento de que “a liberdade de expressão e manifestação” conquistada “após anos de ditadura” não pode ser suprimida por ações judiciais.
Reivindicação do prédio
A demanda de mudança do IA para o imóvel existe há mais de 20 anos. Em 1999, uma resolução do Conselho Universitário (Consun), órgão deliberativo máximo da universidade, já previa a cessão do espaço para a unidade acadêmica. Em 2009, um documento assinado pelo então reitor, Carlos Alexandre Netto, também prometia que 5 mil metros quadrados do prédio fossem ocupados pelo instituto quando o novo prédio do ICBS ficasse pronto – o que ocorreu em janeiro deste ano.
Em reunião no início de abril, o reitor, Carlos André Bulhões, reconheceu que a situação física do Instituto de Artes é precária e pediu que a direção da unidade acadêmica apresentasse o projeto que tem para o local e o que houve de tratativas sobre o assunto até agora. Em ata da reunião, a qual a reportagem de GZH teve acesso, Bulhões assumiu o compromisso de “enfrentamento da situação de forma conjunta” e ressaltou que pretende resolver as situações de espaço físico não só do IA, como de todos os órgãos e unidades que têm essa necessidade.
A comunidade dos cursos de Artes denuncia que as instalações onde ocorrem as aulas – nas ruas General Vitorino, Senhor dos Passos e Annes Dias, todas no Centro Histórico – sofrem com alagamentos, infiltrações, problemas na rede elétrica e até mesmo infestação de escorpiões amarelos.
Ainda na nota da Adufrgs, a entidade conclamou os professores da universidade a “cerrar fileiras” na defesa do Consun como instância superior da UFRGS e “ao respeito às suas deliberações”, assim como do “diálogo democrático dentro da comunidade acadêmica como caminho para a solução de nossas questões internas”.