Em um contexto que demanda internet rápida para oferecer aulas no modelo híbrido, mais de duas em cada 10 escolas públicas do Rio Grande do Sul não contam com banda larga. Segundo levantamento obtido com exclusividade por GZH, feito pelo Comitê Técnico da Educação do Instituto Rui Barbosa (CTE-IRB), com base nos dados do Censo Escolar 2020, quase 1,5 mil (20,82%) das 7,2 mil instituições gaúchas das redes municipal de todo o Rio Grande do Sul e estadual responderam que não tinham acesso à internet rápida. Destas, 282 (3,9%) sequer possuíam algum tipo de conexão. O IRB é uma associação composta por membros dos Tribunais de Conta de todo o país.
A situação em nível nacional, no que se refere ao acesso à internet, é ainda mais grave – no Brasil, 39,69% das escolas das redes municipal e estadual não contam com banda larga. Destas, 25,66% estão totalmente desconectadas, não oferecendo conexão nem mesmo para uso administrativo. A falta de acesso à internet rápida inviabiliza, por exemplo, a transmissão das aulas para estudantes que estejam em casa, no modelo híbrido de ensino.
O levantamento feito pelo CTE-IRB focou em oito quesitos considerados básicos para que as escolas sigam os protocolos sanitários durante a pandemia. Além de acesso à internet e à conexão banda larga, foi averiguado se há banheiro, esgoto, água, água potável, energia elétrica e pátio ou quadra coberta nas instituições de ensino.
O Rio Grande do Sul registrou percentual um pouco acima do nacional com relação à quantidade de escolas sem banheiro. No Estado, 353 instituições declararam não possuir banheiro em suas dependências físicas – a grande maioria (329) pertencente à rede estadual.
Outro ponto de destaque foi a falta de água potável nas escolas públicas gaúchas, especialmente as da rede estadual: quase 74% das instituições de ensino do Estado disseram não fornecer água para consumo humano, faltando, por exemplo, bebedouros. Entre as escolas estaduais de todo o Brasil, o percentual foi de 10,94%.
O CTE-IRB reuniu dados referentes a cada município brasileiro e os enviou aos Tribunais de Contas de cada Estado. Conforme o presidente do comitê, Cezar Miola, o objetivo é subsidiar as cortes de informações, para que, então, sejam tomadas decisões com base na realidade local, de realizar auditorias, inspeções ou recomendações aos administradores e secretários de Educação de Estados e municípios.
— O importante é que, identificados os problemas, as medidas sejam adotadas para oferecerem condições mínimas de segurança no processo de retomada das atividades presenciais, ainda que de maneira parcial ou híbrida. O atendimento às crianças e aos jovens deve ter absoluta prioridade, e essa prioridade deve se traduzir em ações, segundo a Constituição Federal — observa Miola.
Miola, que também é conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS), destaca que o acesso à internet, sobretudo banda larga, é um componente fundamental, e precisa ser oferecido não apenas dentro da escola, mas também às famílias.
— O acesso à internet de qualidade precisa ser considerado, hoje, um direito fundamental, pois ele é capaz de oferecer o acesso a outro direito: o da educação. As aulas estão voltando, mas de forma muito gradual e com um número menor de alunos. A internet precisa funcionar de maneira permanente, seja para garantir o modelo híbrido ou proporcionar atividades de contraturno — avalia o conselheiro.
Governo federal terá de repassar R$ 3,5 bilhões para qualificar acesso à internet de estudantes
Com a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro a um projeto de lei que prevê banda larga e tablets para Estados e municípios equiparem escolas públicas, foi publicada a promulgação na última sexta-feira (11) da Lei 14.142, que determina que o governo federal repasse R$ 3,5 bilhões para a aplicação, pelos Poderes Executivos estaduais, “em ações para a garantia do acesso à internet, com fins educacionais, aos alunos e aos professores da rede pública de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, em virtude da calamidade pública decorrente da covid-19”.
— Anísio Teixeira, que dá nome ao nosso principal instituto de pesquisas educacionais, disse que “as escolas são máquinas que preparam para a democracia”. Então, essas “máquinas” precisam de condições para funcionarem, com recursos humanos e materiais adequados; se não, estaremos fracassando na universalização do acesso e na permanência, no aprendizado e na promoção da cultura democrática — defende Miola.
Os estudantes a serem beneficiados pela lei são os pertencentes a famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e os matriculados nas escolas das comunidades indígenas e quilombolas, bem como os professores da Educação Básica da rede pública de ensino. A transferência dos recursos aos Estados deve ser feita em parcela única, até 30 dias após a publicação da legislação no Diário Oficial da União. O valor deve ser usado até o final de 2021.
O que diz o poder público
Quanto à rede municipal, o levantamento se refere às escolas de responsabilidade de cada município do Rio Grande do Sul, não somente Porto Alegre. Contudo, como a Capital conta com a maior rede municipal de ensino do Estado, a reportagem de GZH buscou seu posicionamento sobre as quatro instituições de ensino que declararam não contar com água potável e as 17 que disseram não ter pátio ou quadra coberta.
A Secretaria Municipal de Educação (Smed) de Porto Alegre informou que não reconhece os números citados no levantamento, pois apenas um caso pontual de falta de água potável foi registrado, já em 2021. A pasta destacou, ainda, que a estratégia apresentada à sociedade, ainda no início de fevereiro, para a retomada das aulas presenciais obedece a um cálculo que possibilita o atendimento da totalidade de alunos de cada escola no intervalo máximo de cinco dias, sem necessidade de uso do pátio. "Independente disso, o processo de construção das nossas escolas, ao longo do tempo, segue um modelo que sempre previu áreas abertas e cobertas ou ginásios, onde os alunos podem conviver e transitar nos diferentes momentos da rotina escolar", ressalta a Smed.
Por meio de nota, a Secretaria Estadual da Educação (Seduc) se posicionou sobre o estudo. C
"A Secretaria Estadual da Educação (Seduc) informa que as estruturas das escolas da Rede Estadual de Ensino apresentam condições para a realização de aulas presenciais. No caso de instituições de ensino que possuam problemas estruturais, a equipe diretiva deve comunicar à respectiva Coordenadoria Regional de Educação (CRE) para o devido encaminhamento dos reparos junto à Seduc.
A Seduc ressalta que trabalha continuadamente ao lado das Coordenadorias Regionais de Educação e das escolas da rede estadual para a melhoria da velocidade da internet por meio de iniciativas como repasse de recurso da autonomia financeira para contratação de provedores locais, repasse de recursos de programas como o Educação Conectada e Conecta RS.
Ainda, a Seduc realiza atualmente estudo sobre a utilização dos recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações."