Pela segunda vez em menos de 10 dias, pareceu haver duas realidades distintas envolvendo as escolas da rede estadual no Rio Grande do Sul: a oficial e a real. Enquanto o cronograma divulgado pelo governo do Estado previa o retorno do Ensino Médio e técnico para 20 de outubro e o de alunos dos anos finais do Ensino Fundamental para esta quarta-feira (28), o que se viu, nos dois casos, foi uma minoria de instituições de fato recebendo estudantes.
O que deu errado? Para o governo, que trabalha para enviar equipamentos de proteção individual (EPIs) a alunos e professores da rede estadual a fim de garantir a segurança daqueles que voltarem às salas de aula, as datas representam somente o levantamento de restrições, e não significam uma expectativa de adesão total e imediata, mas gradual e de acordo com as possibilidades de cada colégio.
Para professores e diretores ouvidos pela reportagem, porém, a realidade é outra. Muitos relatam escolas sujas e com aspecto de abandonadas, impossibilitando um retorno adequado de estudantes. Outros garantem que receberam um número ínfimo de EPIs – em geral, apenas uns poucos termômetros digitais e algumas unidades de álcool gel, inviáveis para assegurar a volta de dezenas de jovens. Há ainda quem aponte a dificuldade na contratação de profissionais como serventes, fundamentais para uma retomada apropriada.
A seguir, confira alguns dos principais pontos citados por educadores para explicar a baixa adesão na volta às aulas na rede estadual gaúcha.
Sensação de insegurança
Uma questão que vai além da falta de EPIs – mas que é também realçada por esse problema – é uma sensação geral de insegurança. Professores e diretores da rede estadual defendem que o coronavírus segue como uma ameaça constante e que qualquer retorno em um momento como este é imprudente. É forte, também, a campanha para que só sejam retomadas as aulas quando houver uma vacina distribuída à população gaúcha.
Sujeira nas escolas
Diretores explicam que muitos dos funcionários da limpeza e monitores são de grupos de risco e, por isso, estão afastados. Há casos, ainda, de solicitações para vagas de servente escolar aberta há meses e ainda não preenchidas. Há quem aponte ainda outro problema que atrapalha algumas escolas: a dificuldade de acesso aos recursos da autonomia financeira. Existem escolas com diretores que assumiram faz apenas alguns meses e ainda não podem usar recursos em conta, conforme seus relatos.
Com isso, o que se vê são pátios com grama alta, infraestrutura com aparência de abandonada, paredes e chão sujos, impossibilitando um retorno às aulas presenciais com a segurança sanitária necessária.
Campanha por escolas fechadas
A campanha "Escolas fechadas, vidas preservadas", capitaneada pelo Cpers, o sindicato dos professores estaduais, também conta com forte apoio da categoria. Para muitos, a associação entre o fechamento de escolas e a preservação de vidas fala mais alto do que a definição de protocolos sanitários – ainda mais quando isso não é acompanhado pela adequada entrega de EPIs e orientação aos profissionais.
Diretores e professores reforçam, porém, que as escolas não estão fechadas, ainda que não estejam recebendo estudantes para aulas presenciais: alguns funcionários se revezam em regimes de plantão para atender pais e alunos e receber materiais enviados pelo governo do Estado.
Retomada tardia
Mais entre pais do que entre professores e diretores, há uma sensação recorrente de que pouco adianta voltar às aulas já no final de outubro, a poucos meses do encerramento habitual de um ano letivo. A sensação de "ano perdido" é uma constante também entre alunos, mas a ideia de que vale mais a pena manter o ensino remoto, da maneira como tem sido possível fazê-lo, do que promover aulas presenciais até o fim do calendário previsto tem sido defendida por muitos. Não se contesta tanto o calendário definido pelo governo do Estado – qualquer retorno antes, para muitos pais, seria ainda mais arriscado –, mas os benefícios de uma volta às aulas a apenas dois meses do final de 2020.
Alta evasão
Outro relato frequente, indicando uma triste realidade ocasionada pela pandemia, é a de que muitos estudantes da rede pública estão abandonando as aulas. Dificuldades de adaptação ao ensino remoto, falta de tecnologias adequadas e de conexão à internet, além da necessidade de ajudar a família, são alguns dos casos encontrados por educadores que viram a quantidade de alunos diminuir nos últimos meses. Tendo deixado as aulas de lado diante da dificuldade, há alunos que optaram por não retornar às escolas mesmo com a autorização para atividades presenciais.