Em um espaço público onde os leitores deveriam se sentir convidados a entrar para desfrutar de boas leituras, o que muitos porto-alegrenses encontram é um retrato do pouco investimento público no setor cultural. A reportagem visitou as cinco bibliotecas públicas administradas pelo Estado na Capital e verificou as condições estruturais de cada uma. As três unidades que ficam fora do eixo central são as que apresentam o maior número de problemas.
A situação da Biblioteca Pública Romano Reif, no IAPI, é a mais conhecida porque, nos últimos anos, o espaço foi alvo de mobilização dos moradores. Por muito tempo, frequentadores do local — que não tinha parte do telhado —, conviveram com goteiras, infiltrações e rachaduras. A boa notícia é que a troca do telhado, em agosto, resolveu uma parte dos transtornos. A cada chuva, as goteiras caíam sobre os livros. Outra preocupação era com uma árvore localizada no mesmo terreno, que estava com as raízes avançando por debaixo do prédio.
— Em relação ao telhado, uma empresa entrou como parceira e doou o material para reforma. O Estado entrou com a mão de obra. A seringueira foi cortada, pois estava levantando o piso. Algumas pessoas não gostaram, mas precisava ser feito — disse a funcionária da biblioteca, Elisângela Almeida.
Porém, afora estas mudanças, o cenário segue inalterado. Quem chega à biblioteca, do lado de fora, até pensa que é um prédio abandonado: há pichações nas paredes e mato alto, um "cartaz" de boas-vindas pouco animador. Na parte interna, há mofo no teto das salas, herança do tempo em que o telhado estava estragado. Os carpetes têm buracos e são remendados com fita adesiva, e rachaduras são vistas por todos os lados.
Os azulejos das paredes dos banheiros e da cozinha estão caindo. O banheiro masculino funciona junto a um pequeno depósito de livros. Outro detalhe que chama a atenção são as portas destruídas pelo cupim.
Caixas fechadas e prateleiras vazias
No bairro Floresta, o antigo salão de festas da Associação Cristóvão Colombo cede uma parte do espaço para a Biblioteca Lígia Meurer. A biblioteca, de 1959, já passou por outros endereços, mas, desde 2012, tem os livros acomodados em uma peça pequena, pouco ventilada, dividindo o espaço com a antiga churrasqueira, goteiras e rachaduras.
Ao chegar no local, logo se percebe as inúmeras caixas fechadas com livros esperando para serem acomodados, ao mesmo tempo em que algumas prateleiras pairam vazias, após a retirada de algumas obras que estavam sendo danificadas pela chuva. A biblioteca tem apenas um funcionário, não tem computador, impressora ou internet. Quem se dispõe a visitar o local não encontra uma mesa e uma cadeira sequer para sentar. Aliás, se o sol não estiver raiando lá fora, vale a pena levar uma lanterninha para ajudar na leitura, pois parte das luzes do espaço está queimada.
Conforme o funcionário Valdir Vieira, cerca de 100 pessoas visitam a biblioteca mensalmente. O movimento é pequeno e nenhuma atividade extra é oferecida. Há quase 10 mil obras para empréstimo e pesquisa. As fichas dos leitores ainda estão em sistema de papel.
— Tivemos um computador por período, que chegou a ter seis mil pessoas registradas, mas entraram aqui e roubaram — relata.
No verão, o calorão é outro agravante da biblioteca, que está abrigada por um telhado de zinco e não tem ar-condicionado.
Atendimento em três dias da semana
A Biblioteca Pública Leopoldo Boeck, no Jardim Sabará, foi tema de reportagem no dia 26 de outubro. Na oportunidade, a matéria destacava a aposentadoria da única servidora e a preocupação da comunidade com a possibilidade de fechamento do espaço. Por enquanto, a coordenadora-geral das bibliotecas gaúchas, Morgana Marcon, assumiu o atendimento três dias da semana: segunda, quarta e sexta, das 9h ao meio-dia. Nos demais dias, o prédio fica fechado.
Além da defasagem de recursos humanos, ainda há alguns problemas estruturais. Recentemente, com apoio da iniciativa privada, a biblioteca recebeu pintura na parte do espaço kids e uma cerca nova. Porém, ainda não tem computadores para pesquisa e cadastro informatizado dos leitores. Segundo frequentadores, as telhas da biblioteca precisam ser trocadas por outras com isolamento acústico e térmico. As atuais são de barro, que são pesadas e geram manutenção. Outra demanda apontada pelos moradores é a necessidade de instalação de câmeras de videomonitoramento.
Problemas pouco tempo após reforma
No Centro, um prédio imponente abriga uma parte importante da história do Rio Grande do Sul. Fechado por oito anos para reformas, o prédio da Biblioteca Pública do Estado foi reaberto em dezembro de 2015. Quase quatro anos depois, a estrutura já dá sinais da falta de manutenção. Algumas paredes têm rachaduras, a pintura está descascando em alguns setores do primeiro andar. A biblioteca tem rede de wi-fi liberada, mas não tem computadores para pesquisa.
Um oásis no Centro
O último endereço visitado foi o da Biblioteca Pública Lucília Minssen, uma biblioteca especializada em literatura infantojuvenil que fica dentro da Casa de Cultura Mario Quintana. E o que encontramos por lá foi completamente diferente das demais estruturas públicas: é ampla, iluminada, organizada e muito acolhedora.
Além de espaço para leitura, há uma ludoteca, um ambiente externo com brinquedos, e a possibilidade de participação em cursos e oficinas, contação de histórias, entre outras atividades. Uma vitrine do brinquedo possibilita uma viagem ao tempo por meio de uma exposição de brinquedos antigos. Livros, gibis, jogos variados servem com convite aos pequenos e novos leitores.
De acordo com os funcionários, a biblioteca recebe mais de 100 visitantes por semana e tem um grande movimento aos sábados. Atualmente, o acervo é de pouco mais de 21 mil volumes.
Secretaria busca parcerias
Segundo a Secretaria Estadual de Cultura (Sedac), no momento não existem investimentos públicos previstos para as bibliotecas. Porém, o órgão busca parcerias com a sociedade para resolver as pendências. A Biblioteca Pública do Estado foi contemplada com recursos do Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) para implantação do Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndios (PPCI), modernização das instalações elétricas, climatização e instalação de um novo elevador. Também há um projeto de restauro do mobiliário sendo encaminhado.
"A manutenção preventiva da biblioteca se dá com o apoio em grande parte de sua Associação de Amigos, juntamente com o Estado, e é permanente. Todos os problemas estruturais foram sanados no último restauro. As rachaduras estão contidas e não oferecem risco algum. Não há umidade em nenhum local. A pintura está descascando devido a ação do tempo e alternâncias climáticas. O Salão Egípcio, bem como o teto do salão Mourisco já estão com a pintura estabilizadas, aguardando restauro".