Para aproveitar espaços com capacidade disponível para receber mais estudantes e ainda atender à alta demanda da educação infantil, algumas cidades da Região Metropolitana estão fechando parcerias com o governo do Estado para a municipalização de escolas estaduais. A partir do ano que vem, três escolas de Guaíba e duas de Esteio estarão sob responsabilidade das Secretarias Municipais de Educação, e não mais da Secretaria Estadual de Educação (Seduc). A troca de mantença, termo formal para a transferência, está sendo comunicada para a comunidade por meio de audiências públicas.
Em Guaíba, o processo corria desde 2017. Conforme a secretária Virgínia Guimarães, a ideia do município é aproveitar a estrutura dos locais para aumentar a oferta de vagas na educação infantil. Hoje, cerca de 500 crianças estão em casa por falta de creche. A cada início de ano letivo, esse número gira em torno de 800.
— Desde que assumimos o governo, víamos a demanda crescer, enquanto escolas bem próximas das nossas tinham espaços ociosos. Pedimos então, em regime de colaboração, permissão para uso de algumas salas e também fizemos a solicitação de municipalização das escolas Evaristo da Veiga e Carmen Alice Laviaguerre (Ciep). Mas o regramento apresentado pelo Estado, naquela oportunidade, era diferente. Mas o novo governo, vendo a existência de escolas pequenas, com poucos alunos e turmas multisseriadas, nos procurou para construir essa caminhada — explica.
Ampliação de vagas
A Seduc ofereceu então, três instituições de ensino ao município: as escolas Evaristo da Veiga, no bairro Jardim Iolanda, Doutor Gastão Leão, no bairro Columbia City, e Albino Hackmann, no Florida. A secretaria acatou a proposta. De acordo com Virgínia, a Escola Albino Hackmann tem hoje 26 alunos, mas a estrutura comportaria até 150. A instituição será transformada em creche, com atendimento exclusivo dos zero aos três anos. A Escola Gastão Leão tem aproximadamente 85 estudantes, mas capacidade para 150. Nela, haverá atendimento a partir dos quatro anos até o 5º ano do Ensino Fundamental.
A secretaria fará a proposta à comunidade para inclusão de turmas de zero a três anos, mas isto ainda depende de aprovação. A Evaristo da Veiga, onde, atualmente, estudam pouco mais de cem alunos, poderá receber 450. O município já usava algumas salas do prédio para educação infantil, agora, a ideia é aumentar a oferta de vagas, com turmas a partir dos quatro anos até o 9º do ensino fundamental.
— Ainda temos a seção de uso na Escola Itororó, que a partir de 2020, no turno da tarde, também passará a ser de responsabilidade do município, e de algumas salas do Ciep (Carmen Alice Laviaguerre), onde já atendemos 450 alunos — completa a gestora.
Críticas e desinformação
A mudança de gestão, no entanto, não é unânime e ainda gera desentendimentos. Cátia da Silva, 42 anos, mãe de duas alunas da Escola Evaristo da Veiga, é contra a municipalização.
— A minha filha mais nova vai permanecer aqui, mas a mais velha, que está no 8º ano, em seguida vai ter que procurar outra escola para estudar. Sendo que a mais próxima fica no Centro — disse.
Caroline Nascimento, 35 anos, achava que a filha, de 14 anos, teria que sair da escola no ano que vem, pois a informação que tinha era de que a instituição funcionaria só até o 5º ano.
— Mas se terá até o 9º ano, ela permanecerá aqui — comentou, após ser informada pela reportagem.
Presidente do Conselho Escolar da Escola Evaristo da Veiga, o agente educacional Felipe Sanzi afirma que funcionários da escola e grande parte da comunidade rejeitaram a alteração nas assembleias consultivas realizadas.
— De forma insistente, a Secretaria Municipal desrespeitou a decisão democrática do bairro, que recolheu mais de 600 assinaturas contra a municipalização. O Estado, sem nenhum critério, entregou seu "filé mignon" ao município, sendo que existem outras escolas com menos alunos. Por que não colocar Ensino Médio aqui, atendendo toda a zona sul da cidade, quando a escola mais próxima fica a 30 minutos? Esse processo acaba com a história dessa escola — opinou.
Em função da tramitação, a escola está sem equipe diretiva, pois alguns servidores já foram para outras instituições. A Secretaria Municipal de Guaíba informou que lançará, em breve, concurso público para contratação de professores.
Em Esteio, busca por ensino igualitário
Em Esteio, as Escolas Estaduais de Ensino Fundamental Tomé de Souza, no Centro, e Ezequiel Nunes Filho, no bairro São Sebastião, também passarão para a tutela do município em 2020. Conforme o prefeito e secretário de Educação, Leonardo Pascoal, o objetivo da mudança de gestão é a qualificação do ensino.
— Nossa vontade é assegurar acesso às mesmas oportunidades de aprendizagem a todos os alunos do município na etapa fundamental. Nós estamos com um processo de qualificação da rede municipal, ampliando o currículo das escolas, com a inserção de novas disciplinas obrigatórias, como espanhol, libras, música, tecnologias de inovação, entre outras medidas, e nós entendemos que isso tem que ser ofertado a todas as crianças de Esteio — falou.
As duas escolas atendem cerca de 300 alunos até o 9º ano. Com a municipalização, o governo acredita que conseguirá atender o dobro. A Secretaria Municipal de Educação já mantinha turmas de educação infantil nessas instituições e, desta forma, poderá ampliar a oferta de vagas.
— Nós tínhamos dificuldade de calendário, pois esta turmas não podiam seguir o calendário do município. Se o Estado fechasse a escola, entrasse em greve, a gente ficava impedido de ofertar as aulas. Tínhamos dificuldade de gestão por conta disso. Essa mudança também vai permitir uma redução da capacidade ociosa desses espaços, pois as duas escolas tinham salas fechadas — complementou Pascoal.
A prefeitura irá investir, a curto prazo, R$ 500 mil para adaptação das escolas. Tanto em Guaíba quanto em Esteio, os professores concursados poderão permanecer nos locais onde já atuavam, enquanto os contratados serão remanejados.
Em andamento
Em Eldorado do Sul, desde março, a prefeitura recebeu autorização para utilizar o prédio da Escola Estadual José Gomes de Vasconcelos Jardim, no bairro Picada. Desta forma, o Estado já não tem mais turmas no local. De acordo com a supervisora pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, Lisandra Rodrigues, o município atende crianças a partir dos quatro anos até o 5º ano do Ensino Fundamental e já entrou com o processo de municipalização, que está em andamento.
Reorganização da rede estadual
Em nota, a Seduc informa que tem realizado, de forma permanente, estudos sobre a rede estadual e sua estrutura. Nesses estudos, constatou que há escolas estaduais nas áreas urbanas com cerca de 40 alunos. A análise visa beneficiar os estabelecimentos de ensino, sejam eles do município ou do Estado. "É importante ressaltar que a Secretaria não classifica as crianças e jovens como sendo de uma rede ou de outra, mas, sim, com a ideia de pertencimento ao território gaúcho".
O órgão disse que tem o interesse em cumprir o Regime de Colaboração estabelecido pela Constituição Federal e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). O instrumento de gestão pública, ajustado entre União, Estados e municípios, estabelece que a educação infantil é de responsabilidade do município, o Ensino Médio do Estado e o Ensino Fundamental deve ser gerenciado em regime compartilhado.
A Seduc ressalta que a iniciativa não irá trazer prejuízos aos professores e aos alunos. Além disso, reitera que a otimização de recursos irá permitir a reorganização da rede estadual e proporcionar melhores condições para os estudantes num futuro próximo. Atualmente, em todo o Rio Grande do Sul, sete processos de cooperação entre município e Estado estão sendo avaliados.