Um novo projeto de Escola sem Partido foi apresentado já na abertura do ano legislativo, na segunda-feira (4). O texto atual traz novidades: quer assegurar aos estudantes o direito de gravar as aulas contra possíveis doutrinações e ainda regular as atividades de grêmios estudantis.
O texto do Projeto de Lei 246 foi protocolado na noite de segunda pela deputada Bia Kicis (PSL-DF). A ideia da parlamentar, no entanto, é que a discussão efetiva só ocorra após o trâmite das pautas econômicas do governo.
O novo projeto mantém as linhas gerais do que havia sido discutido no ano passado em uma comissão especial da Câmara e acabou arquivado. Alguns ajustes, entretanto, retiram e também acrescentam pontos polêmicos.
Kicis é cunhada do fundador do Movimento Escola sem Partido, Miguel Nagib. Defensores do projeto entendem que ele busca a neutralidade na sala de aula contra uma suposta doutrinação de esquerda que dominariam as escolas brasileiras.
Para os críticos, a ideia de uma lei é autoritária, limita a pluralidade de ideias nas escolas e ainda constrange professores. Não há evidências que indiquem que doutrinação seja um problema amplo. Decisões judiciais de várias instâncias e uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) já consideraram inconstitucionais projetos similares a este.
A nova redação do Escola sem Partido traz um artigo que assegura aos estudantes "o direito de gravar as aulas, a fim de permitir a melhor absorção do conteúdo ministrado e de viabilizar o pleno exercício do direito dos pais ou responsáveis de ter ciência do processo pedagógico e avaliar a qualidade dos serviços prestados pela escola". Na prática, seria uma forma de os alunos gravarem casos de doutrinações.
No ano passado, uma deputada eleita pelo PSL pediu que alunos gravassem professores e os denunciassem. A Justiça determinou a retirada da mensagem, publicada nas redes sociais logo a pós a eleição de Bolsonaro. Essa decisão foi suspensa neste ano.
Várias redes de ensino proíbem o uso de celular na sala de aula.
— (O projeto de lei) está ensinando o aluno a se proteger de um molestador — diz a deputada.
Um novo artigo fala sobre os grêmios, que são organizados por alunos e não por professores. O artigo 8º diz: "É vedada aos grêmios estudantis a promoção de atividade político-partidária".
Segundo Bia Kicis, o artigo foi incluído para corrigir uma falha dos textos anteriores.
— O grêmio fica dentro da escola, e é uma forma de os alunos exercitarem a cidadania —diz ela. — Se não a doutrinação que era na sala de aula só muda para o grêmio.
O novo projeto mantém a previsão de um cartaz na sala de aula com os deveres do professor. Também declara que o poder público "não se imiscuirá no processo de amadurecimento sexual dos alunos nem permitirá qualquer forma de dogmatismo ou proselitismo na abordagem das questões de gênero".
Mas, no texto anterior, a abordagem de gênero era totalmente vetada, tanto na educação básica quanto no Ensino Superior. Esse trecho foi agora retirado, mantendo o veto ao que se chama de dogmatismo e proselitismo na abordagem. Também não usa o termo "ideologia de gênero", nunca usado por educadores.
Lei apenas para o sistema público
As escolas particulares também ficam de fora dessa vez. Estariam sujeitos à lei apenas o sistema público, que inclui escolas e universidades municipais, estaduais e federais.
— O projeto tentou melhorar todas as falhas do anterior — diz Kicis.
Havia previsão de análise no STF em novembro do ano passado, mas o presidente do Tribunal, ministro Dias Toffoli, mudou a ordem dos julgamentos e adiou indefinidamente o processo. Entendimento do Ministério Público Federal diz que o projeto é inconstitucional por impedir o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, negar a liberdade de cátedra e contrariar a laicidade do Estado (por permitir no espaço público da escola visões morais e religiosas particulares).
O projeto de lei do Escola sem Partido foi discutido no ano passado em uma comissão especial. A ideia é que isso ocorra novamente neste ano.
Apesar de ter maioria no colegiado, os defensores do projeto não conseguiram mobilização suficiente para a aprovação. Isso ocorreu tanto por manobras da oposição quanto pela perda de apoio ao projeto. Nomes como o presidente do DEM, ACM Neto, e Olavo de Carvalho já declararam ser contra uma lei como essa.