Helenir Aguiar Schürer, 63 anos, ampliou o apoio entre os professores estaduais e conseguiu se eleger pela segunda vez para o comando da direção-geral do Cpers, um dos maiores sindicatos da América Latina. Para os próximos três anos de mandato, ela prevê mais tranquilidade em aprovar as propostas e levar à prática ações que considera fundamentais para a credibilidade da entidade frente aos educadores e à sociedade. Isso porque garantiu o voto de 55% dos eleitores no último pleito, enquanto que, na eleição que a colocou pela primeira vez no cargo, ganhou com 38%.
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Formada em Letras pela Faculdade Dom Bosco, de Santa Rosa, Helenir já atuou na direção do núcleo de Santana do Livramento e em gestões anteriores da direção central. Com mais de 30 anos de sindicato, promete mobilizar a categoria contra as reformas de Temer e Sartori e batalhar pelo cumprimento por parte do governo gaúcho do piso nacional. Em entrevista a ZH, ela comentou os desafios que tem pela frente e como pretende se posicionar diante de temas fundamentais à categoria, como remuneração e greves.
Das coisas que ficaram para trás no seu primeiro mandato, o que será prioridade agora?
A grande prioridade é evitar a aprovação dos pacotes do governo Sartori na Assembleia Legislativa. Essa é a número um: atacar qualquer projeto que venha para nos tirar direitos. A segunda é estabelecer uma negociação com o governo para discutir salário. Vamos para quatro anos em que o governo não apresentou nenhuma proposta salarial, e não preciso nem falar o que isso significa para o nosso salário, uma defasagem hoje de 82,42%. Então, precisamos, sim, retomar a negociação. Conseguimos cumprir todas as nossas propostas da eleição anterior, a não ser o piso. Retomamos a questão pedagógica. Fizemos mostras pedagógicas, em que as escolas dos núcleos apresentaram projetos que estão sendo desenvolvidos nas escolas. No primeiro ano, foram quase 200 inscritos e, no ano passado, quase 300. Queremos mostrar para a sociedade o que a escola pública está produzindo. Foi extremamente gratificante. Ocupamos, logo depois da Feira do Livro de Porto Alegre, o mesmo espaço (do evento literário) na Praça da Alfândega com a mostra. Nossa grande satisfação foi ver que a maioria não acreditava que se tratava de escola pública, pela qualidade dos trabalhos. Isso nos deixou muito felizes e com a certeza de que mostrar isso é o caminho certo. A escola pública, para ser defendida, tem de mostrar sua qualidade, mas, infelizmente, ela só é pauta na mídia quando uma escola é assaltada, ou por algum fato violento. Ela aparece só como tragédia. Tem muita coisa boa que saiu das quatro paredes da escola. Inclusive, os cinco trabalhos mais significativos foram apresentados no Encontro Internacional de Educação, na Costa Rica, no ano passado. Foi muito gratificante ver professores de outros países querendo conhecer e ver o que nossas escolas desenvolveram.
A senhora credita parte da sua reeleição a isso?
Acho que sim, e todo mundo está pedindo a continuidade. Em agosto, provavelmente, já começarão as inscrições para a mostra deste ano.
Teremos greve neste ano? Qual é sua opinião sobre o uso desse mecanismo como forma de reivindicação?
Ainda acreditamos que a greve deve ser o último recurso. Na eleição anterior, ganhamos com 38% dos votos, e tivemos uma oposição que durou esses três anos. Isso nos prejudicou muito para desenvolver greves mais bem construídas. Na primeira que fizemos, tivemos alguns boicotes que diminuíram a possibilidade de fazermos aquilo que acreditamos. Não acredito em greve que meia dúzia decida. A greve real é aquela feita na base da escola, em que as escolas param. Temos de continuar discutindo. Acho que agora teremos mais tranquilidade porque, dos 42 núcleos, vencemos em 25. Talvez a gente tenha uma gestão mais tranquila, com mais diálogo.
Internamente, como a senhora pretende unir a categoria, apesar das correntes políticas diversas dentro do Cpers?
A própria oposição dizia que nós não tínhamos a maioria porque havíamos nos eleito com 38%. Bem, agora, tenho certeza, pela responsabilidade e pela defesa da democracia que eles têm, que uma direção que se elege com 55% dos votos é maioria. E, com 25 núcleos apoiando a direção central, teremos mais força, porque a nossa visão de sindicato estará em 25 núcleos.
Mas de toda forma a oposição segue lá?
Sim, mas em menor número. Havia uma maioria, por exemplo, para forçar uma aprovação de greve. Hoje não terá mais.
Mas a sua ideia é evitar a greve?
Não, não. Mas usá-la como ela deve ser usada, que é como último recurso. Se tu não tens uma greve pronta, não tem a categoria pronta para fazer a greve, isso é suicídio.
No ano passado, os alunos se mobilizaram e colocaram na pauta a questão salarial dos professores. Em que medida o movimento estudantil e o Cpers caminharão juntos?
Acreditamos que a escola não é uma ilha. A escola tem de ter a comunidade com ela. No ano passado, quando entramos em greve, foi uma surpresa muito grande ver os alunos se mobilizarem e ocuparem as escolas. E havia qualidade nessas ocupações. A auto-organização das ocupações foi algo que me chamou muito a atenção. A gente conseguiu não somente com os alunos, mas com os pais, trabalhar muito em conjunto, observando aquela experiência. Tudo o que acontece na educação tem de ser um acúmulo. Os nossos alunos estão questionando, buscando outra forma de educação. Se temos a consciência de que precisamos mudar – não mudar com essa proposta do governo federal (a reforma do Ensino Médio), que acho uma perda fantástica para a educação – essa contribuição pode ser uma semente de transformação das escolas, ouvindo os alunos e os pais.
Durante a campanha, seus adversários criticavam a sua postura diante dos ataques do governo à categoria. Consideravam que a senhora deu respostas muito brandas. O que a senhora tem a dizer sobre isso e como será sua postura frente ao governo do Estado no segundo mandato?
Olha, eu sou uma educadora. Tu jamais vais me ver sendo grosseira ou mal-educada com alguém, e vale para o Cpers também, porque cada vez que a gente se movimenta, os alunos estão vendo ali seus professores. Então, todas as minhas ações vão até o limite daquilo que o aluno pode fazer. Bem, foi uma direção tão branda, tão frágil que recebeu 55% de aprovação da categoria.
Como a senhora avalia a atuação do atual secretário de Educação, Ronald Krummenauer? Como tem sido o diálogo com ele sobre as reivindicações da categoria?
Quem está na Secretaria Estadual de Educação (Seduc) hoje é a Agenda 2020 (Krummenauer é ex-diretor-executivo da Agenda 2020). Nossa categoria conhece muito bem o que é a Agenda 2020 desde o governo Britto (Antônio Britto, governador do Estado entre 1995 e 1998). É um secretário cuja fala é de um empresário: fazer parcerias público-privadas para todas as questões da educação. Ele não consegue responder sequer à falta de professores. Nós não temos ali um educador com quem a gente consegue conversar sobre educação. Claro, temos a professora Iara Wortmmann (secretária-adjunta), que entende. Temos ela ali para assuntos da educação.
O sindicato é contrário a parcerias público-privadas na educação?
Quero saber que tipo de parceria público-privada será. A educação não pode ser tratada como empresa. A educação é, em primeiro lugar, um comprometimento, um ato de paixão, não no sentido de vocação missionária, mas é um ato de paixão. Quando se tenta fazer um tipo de parceria público-privada com empresário, que a gente sabe que o grande objetivo é lucrar, não dá certo. Não venham com fórmulas prontas. Já temos aí esta porcaria para o Ensino Médio, não foi um educador que fez.
Qual seu recado ao governo do Estado?
Vamos vir muito mais mobilizados, muito mais organizados, porque agora podemos dizer que teremos maioria para dirigir o sindicato.
Alguma proposta sua foi derrubada por conta dessa oposição e que será retomada agora?
Os temas de mobilização, por exemplo. Estamos na praça desde novembro do ano passado e, em alguns núcleos de oposição, as pessoas sequer sabiam que tem esses projetos na Assembleia. Isso atrapalha muito, faz com que a categoria não venha para a luta, porque ela não sabe o que está acontecendo. A desinformação foi a grande arma da oposição e essa estará em menor grau nos núcleos.
Há uma crítica, e não só ao Cpers, mas a outros sindicatos, de que essas entidades viraram extensões de partidos políticos. A senhora vê isso no Cpers?
Acho que já foi assim. Nas últimas gestões, isso ficou muito claro. A gente tentou acabar com isso, porque estava muito forte, ou tu eras simpático a um determinado partido ou tu nem eras considerado um lutador. Estou há 33 anos no sindicato, sou da velha guarda, e a nossa velha guarda tem grupos de pensamento – não especificamente de partidos – diversificados e que querem levar o sindicato dentro dessa visão. O Cpers é plural. Acho que não tem outro sindicato que tenha tantas pessoas filiadas a tantos partidos diferentes. Se a gente for apostar em levar a política partidária para dentro do sindicato, vamos esfacelá-lo. Temos de ter um único norte: a pauta de reivindicações da categoria. Passamos toda a campanha apresentando propostas para a categoria, enquanto outros traziam a pauta política dos partidos. Sou filiada ao Partido dos Trabalhadores (PT), mas temos em nossa direção gente filiada ao PDT, ao PP... porque, para nós, o partido político não é o essencial. Estaremos caminhando lado a lado com todos aqueles que defenderem a pauta do sindicato.