O percentual de crianças de quatro e cinco anos que frequentam pré-escola em Porto Alegre diminuiu. Em 2016, a taxa era de 84%, enquanto em 2023, de 77% – queda de 6,5 pontos percentuais. Os dados vão na contramão dos números relativos ao Rio Grande do Sul. No mesmo período, foi de 83% para 88% a taxa de frequência escolar bruta de crianças dessa faixa etária no Estado.
As informações são do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Conforme a Síntese de Indicadores Sociais 2024, entre as capitais, Porto Alegre está bem atrás neste indicador. Em 2023, a Capital gaúcha ficou com a terceira pior taxa entre as 27 cidades, superando apenas Porto Velho (73,9%) e Macapá (63,9%).
Entre os Estados, o Rio Grande do Sul (RS) ficou com o sexto percentual mais baixo (88,2%). As piores taxas são do Amapá (65,2%), Acre (78%), Roraima (78,5%), Amazonas (84,8%) e Rondônia (85,3%). O Estado com melhor taxa de frequência escolar de crianças de 4 e 5 anos em 2023 foi o Piauí, com 98,8%. A taxa brasileira nessa faixa etária é de 92,9%.
A partir dos 4 anos a matrícula é obrigatória, conforme a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). Já entre crianças com até 3 anos, o acesso à educação é um direito garantido por lei, mas a matrícula é uma opção dos responsáveis, não é obrigatória. Nessa faixa etária, 43,7% das crianças no RS estavam matriculadas em creches em 2023. Na Capital, foi registrado percentual de 49,5% no ano passado.
Precisamos da Educação Infantil para a formação humana e integral das crianças, para que sejam futuros jovens e adultos conscientes de seus direitos e deveres.
FERNANDA DOS SANTOS PAULO
Professora da UFRGS
Os dados são oriundos da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad), por meio de consulta às famílias, para entender se os filhos estão na escola e, caso não estejam, quais são as motivações por trás disso. Falta de vagas, inexistência de escola na região, insegurança no entorno da escola e lacunas no transporte estão entre as razões para as crianças não estarem matriculadas em 2023, conforme o levantamento.
PNE não foi cumprido
Os dados mostram que ainda há um longo caminho a ser percorrido para o cumprimento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE), que estabelece diretrizes para políticas educacionais por um intervalo de 10 anos. O documento previa atender, no mínimo, 50% das crianças de até 3 anos até o final da vigência do plano.
Para crianças de 4 e 5 anos, a meta era universalizar a Educação Infantil na pré-escola até 2016. No entanto, isso ainda não se concretizou. Lançado em 2014, o prazo do PNE encerraria em 2024, mas o plano teve sua vigência prorrogada até o final de 2025.
Segundo a professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Fernanda dos Santos Paulo, é urgente mitigar o problema das lacunas nessa etapa:
— Nenhuma criança deveria ficar fora da escola. Precisamos da Educação Infantil para a formação humana e integral das crianças, para que sejam futuros jovens e adultos conscientes de seus direitos e deveres, que saibam viver em sociedade de forma respeitosa.
Em Porto Alegre, um dos grandes obstáculos é a falta de vagas na Educação Infantil. Até setembro, conforme a Secretaria Municipal de Educação (Smed), havia 3 mil crianças aguardando por matrículas na etapa creche, de 0 a 3 anos. Segundo a Smed, não há informações atualizadas sobre o déficit para 2025, tendo em vista que as matrículas estão em andamento. A atualização será no final de janeiro.
É necessário construir escolas públicas, priorizar as áreas com maior déficit e fortalecer ações integradas junto ao governo estadual.
FERNANDA DOS SANTOS PAULO
Professora da UFRGS
Para Fernanda, é preciso criar políticas de curto, médio e longo prazo que resolvam o problema, e não somente medidas emergenciais, como a compra de vagas na rede privada e parcerias com instituições de ensino comunitárias, como a prefeitura de Porto Alegre tem feito para suprir a demanda na etapa creche.
— Isso é inaceitável. É necessário construir escolas públicas, priorizar as áreas com maior déficit e fortalecer ações integradas junto ao governo estadual. Não garantir esses direitos é violar o Estatuto da Criança e do Adolescente é importante que as pessoas saibam disso — afirma.
Consultada, a Secretaria da Educação do RS (Seduc) afirmou, em nota, que “em relação à infraestrutura, o Estado tem colocado à disposição dos municípios, como em Porto Alegre, espaços para abertura de creches e Educação Infantil”. Entre as ações empenhadas para fortalecer essa etapa, a pasta destacou o programa Alfabetiza Tchê. A iniciativa busca promover a alfabetização dos estudantes das redes estadual e municipal do Estado até o final do 2º ano do Ensino Fundamental.
Desafios na Capital
Em relação à pré-escola (dos 4 e 5 anos), a Smed afirma que atualmente não possui déficit. A secretaria informa que chega a ter vagas ociosas em algumas regiões do município, onde a demanda é menor. Como há demanda maior em alguns bairros, sobretudo em regiões periféricas, são disponibilizadas vagas onde estiver sobrando. Além disso, a prefeitura fornece transporte escolar gratuito.
A pasta considera déficit as situações em que o ajuste não é possível a curto prazo. Conforme a coordenadora da equipe de dados e do censo escolar na Smed, Carmen Lúcia Lima, a pasta não observa a queda na frequência escolar apontada pelo IBGE:
— Falando em termos de número de matrículas, não percebemos essa queda, muito pelo contrário, e nem no número de inscritos. O censo escolar aponta para um crescimento nas matrículas. Também tivemos a ampliação de vagas ao longo desses últimos anos, com mais vagas em 2024.
Segundo Carmen, a prefeitura tem feito esforços para conseguir atender as crianças de 4 e 5 anos, bem como solucionar o déficit na etapa creche.
— Precisamos pensar e estamos pensando, enquanto prefeitura, em como atender todas as crianças nas redes pública e parceirizada, que é o nosso principal interesse — destaca.
Conforme a coordenadora educacional da Smed, Aline Rocha Mendes, ainda não é possível mensurar os impactos da enchente de maio. Os dados do IBGE não trazem esse aspecto, tendo em vista que foram contabilizados até 2023. A catástrofe climática atingiu diretamente 27 escolas da rede municipal de Porto Alegre, e outras nove instituições parceiras.
— Fizemos um amplo trabalho de busca ativa das famílias atingidas, e conseguimos localizar a maior parte desses alunos, conseguimos fazer esse resgate. Com isso, não percebemos uma queda significativa nas matrículas em função da enchente, até o momento — explica Aline.
No final de dezembro, a prefeitura anunciou que a Escola Estadual Professora Leopolda Barnewitz será municipalizada. Localizada na Cidade Baixa, a unidade passará para gestão do município no início do ano letivo de 2025. Há previsão de abertura de vagas na Educação Infantil, mas a Smed não precisou quantas.