"A escola David está em pé, por vocês, por nós, por todos". É com este recado em um dos quadros da Escola Municipal de Ensino Fundamental David Riegel Neto, no centro de Eldorado do Sul, que os alunos são recepcionados após mais de um mês sem atividades. No pátio, já se ouve o barulho das corridas e as risadas dos pequenos que brincam na área externa. Também é possível presenciar abraços carinhosos de reencontros entre professores e alunos.
O município, que fica na Região Metropolitana, foi a cidade gaúcha mais afetada pela enchente que assolou o Estado no mês de maio. Mais de 80% dos domicílios foram atingidos pela água, e as instituições públicas não foram poupadas. A escola David Riegel Neto fica a poucas quadradas da prefeitura e, conforme a comunidade, a região não havia registrado alagamentos antes. A água passou de 2 metros de altura em algumas salas do colégio, mudando as cores das paredes e danificando a maior parte dos materiais.
Quando as condições possibilitaram o acesso à escola, um movimento formado por professores e voluntários começou para retomar o funcionamento da instituição. O diretor Adriano Castro, 47 anos, foi o primeiro a chegar no local, no dia 18 de maio, e registrar o estrago. A melhoria do cenário, segundo ele, é fruto da união de várias frentes de trabalho. Além da limpeza que ocorreu por dias, a escola recebeu pintura em algumas paredes e decoração nas portas.
— Aos poucos, estamos restabelecendo. Mas tudo foi por água abaixo, literalmente. Cada dia tem sido uma vitória. Quando começamos a limpeza, esfregamos as paredes, tiramos os móveis, fizemos um mutirão para não receber os alunos numa escola com marcas de enchente. Para isso, precisávamos fazer alguma coisa. Então, vem fuzileiros da Marinha, vem voluntários, e se temos pessoas para pintar, vamos pintar. A tinta tirou um pouco do aspecto da sujeira. Um dos objetivos é que os alunos se sintam acolhidos e num lugar seguro — explica o diretor, que está há oito anos no cargo.
Atualmente, o suporte que a escola tem recebido ocorre por meio de doações e voluntários dispostos. O diretor salienta que tiveram ajuda dos fuzileiros navais da Marinha na pintura e de apenados, que fizeram reparos. A parte elétrica atingida foi consertada e os equipamentos que estavam próximos ao teto, como de aparelhos de ar-condicionado e projetores, não foram afetados.
As doações chegaram de diferentes lugares. De acordo com Castro, nas redes sociais, professores pediram materiais. O esposo da vice-diretora, Luciene Gadea, conseguiu mobiliário escolar que não estava em uso em outra entidade. Uma influenciadora direcionou cadeiras e móveis de lojas e de outlets. Também há cadeiras de atendimento de uma Caixa Econômica Federal, onde não estavam sendo usadas.
Uma das professoras que participou do mutirão de limpeza foi Franciele Ribeiro, 34 anos, que leciona para o 1º ano integral. Ela relembra que muitos dos móveis que foram salvos eram esfregados com produtos e colocados na chuva para enxaguar — já que o mau tempo não dava trégua. Mas um dos símbolos da escola, para Franciele, precisava ser recuperado:
— Eu levei as bandeiras para casa para lavar. Elas sempre estavam hasteadas na frente da escola, para mim fazia falta não as ver ali.
Além dela, que é moradora de Guaíba, professores de Porto Alegre e Butiá participaram dos trabalhos.
— Embora tenha outras escolas na rua, quando começamos a limpar, éramos apenas nós. O diretor veio de Porto Alegre pelo corredor humanitário, outros professores também vieram. É um sentimento muito particular desta equipe que queria levantar a instituição. É o nosso emprego em primeiro lugar. Mas fora isso, nossos alunos também perderam tudo. Das outras vezes, quando eles perderam tudo, ainda tinham a escola. Desta vez, não tinham nem a escola. Foram os professores que se uniram e fizeram— detalha Franciele.
Música, doces e kits de materiais
Na terça-feira (18), a escola reabriu as portas para receber todos os alunos. Aqueles que tiveram materiais perdidos, receberam kits montados conforme a necessidade de cada ano escolar. No bilhetinho de boas-vindas, um recado esperançoso: "Não podemos voltar atrás e mudar o que aconteceu, mas sempre há uma oportunidade de recomeço".
— No primeiro dia de aula tivemos música, algodão-doce e muito carinho. Os professores decoraram as salas e vieram aproximadamente 60% alunos. Tínhamos cerca de 750 alunos, em três turnos. No entanto, ainda não voltaram todos — diz o diretor.
A informação de que a escola está funcionando tem sido espalhada entre os alunos, conforme Franciele, e a distribuição dos kits de doações tem motivado e dado segurança para eles retornarem aos poucos.
— Eu passo 40 horas aqui, mas tempo do que em casa. Eu queria ver a escola de novo como era. Depois do primeiro dia de aula, que recepcionamos eles, tive a sensação de final de festa. Uma gratidão, nos sentimos realizados, pois conseguimos limpar e voltar — complementa a professora.