Cada vez mais comuns, grupos de WhatsApp de pais de alunos permitem que os responsáveis pelas crianças troquem informações, lembretes e até mesmo ajuda em relação à escola. Se bem administrada, a ferramenta pode ser um facilitador, permitindo aos pais se fazerem presentes na vida escolar dos filhos. Contudo, em alguns casos, também serve de palco para conflitos entre os responsáveis, diminuindo o potencial da ferramenta.
Há exemplos positivos que mostram que uma convivência saudável e frutífera nesses grupos é possível. É o caso da arquiteta e urbanista Betina Bratkowski, 40 anos, mãe de crianças de nove e cinco anos que frequentam o Colégio Marista Ipanema, em Porto Alegre. Betina é representante das turmas de ambas as filhas – o que a torna ainda mais participativa nas conversas de pais.
— Estou bem satisfeita com esse vínculo, essa proximidade. Às vezes, as pessoas não têm tanto acesso à escola, e isso acaba facilitando — relata.
No grupo da turma da filha mais velha, há trocas de informações, como lembretes de provas, envios de conteúdos quando alguma criança falta à aula e pedidos para procura de itens quando alguém perde algum material. Os pais também ajudam a lidar com outras situações, como desabafos, quando algum filho não quer fazer o tema, por exemplo, e os outros pais sugerem estratégias.
— Acho muito legal, porque tu acabas entrando um pouco mais no universo escolar do que antigamente, não tinha muito contato, era o pai na porta entregando e acabou. O contato via WhatsApp acaba aproximando mais as famílias do universo escolar — opina.
Em uma era em que a tecnologia está enraizada no cotidiano, Betina considera importante saber utilizar o grupo para o bem dos filhos. A mãe acrescenta que discórdias são raras, porque, tão logo começam, outros pais intervêm lembrando que esse não é o objetivo do grupo, ou, então, as desavenças são levadas para conversas privadas.
— Dos que eu participo não tem excessos, mas sei de casos de outras mães que não aguentam mais. Naqueles que eu vivo, é tudo tranquilo e superdosado — destaca Betina.
Confusão generalizada
Nem sempre a comunicação entre os pais é tranquila e pacífica. A arquiteta e urbanista Fernanda Linck, 38 anos, de Novo Hamburgo, enfrentou uma situação complicada quando o filho, hoje com 10 anos, estudava em outra escola. Ela lembra que uma das mães "incomodava o tempo todo e nunca concordava com nada", o que gerou brigas entre os responsáveis. Casos assim, no entanto, não são raros.
Fernanda recorda que as crianças, que eram alunas de uma escola pública, nem sempre tinham condições financeiras para participar de atividades, e as mães da turma se dividiam para ajudá-las caso faltasse dinheiro.
— Mas aquela mãe reclamava, sendo que o filho dela que recebia, na maioria das vezes, e estava tudo bem. Ela começou a reclamar das coisas e a ofender os pais durante um tempo. Foi o caos durante uns 15 dias no grupo — lembra, citando outra vez em que a mãe conseguiu cancelar um passeio das crianças pelo mesmo motivo.
A situação ficou insustentável e levou as outras mães a criarem outro grupo, separado. O do colégio, do qual uma professora participava, foi fechado para apenas transmissões de mensagens da escola, para evitar novos problemas. A mãe que causou as brigas acabou não participando mais dos grupos, e ninguém mais quis conversar com ela — nem pessoalmente, acrescenta Fernanda.
No grupo da antiga escola, os participantes discutiam mais abertamente até mesmo sobre algumas situações graves que aconteciam no colégio, como casos de racismo e gordofobia. Divergências políticas também chegaram a acontecer, levando alguns pais a deixarem o grupo. Em geral, os membros buscavam conversar de maneira mais respeitosa. Contudo, por vezes, as conversas se tornavam incisivas em assuntos complicados, e muitos pais não sabiam como lidar com a situação.
Por mais que o espaço seja importante por facilitar o dia a dia em alguns aspectos, na visão de Fernanda, em alguns momentos, os pais passam do ponto.
— Eu acabava só lendo algumas coisas quando achava importante, mas é bem complicado lidar com tantas pessoas com opiniões diferentes — pontua Fernanda.
Grupo com participação da escola
Na nova escola que o filho frequenta, por outro lado, a situação é tranquila. A arquiteta ainda está conhecendo os outros pais, mas conta que houve apenas um pequeno desentendimento, que foi resolvido rapidamente.
O novo grupo do qual participa também é utilizado para recados, auxílio à agenda e para os pais se ajudarem em questões de organização, como combinados, temas ou busca de materiais. Neste, os responsáveis recebem recados diretamente do colégio, visto que a professora e um representante participam. Para Fernanda, esse formato é o ideal:
— Eu vejo que, quando estão a professora e o colégio juntos, é uma coisa mais organizada, porque é sobre as crianças e o colégio. Tive essa experiência de ter um grupo só com os pais, e as coisas acabam se exaltando demais. Seria interessante ter esse grupo sempre com alguém do colégio, que fica acompanhando também o que acontece.
Como lidar com situações problemáticas
Por mais que muitos pais e mães prefiram não entrar nos grupos porque se sentem, de alguma maneira, invadidos ou sem paciência, essa é uma nova realidade da cultura escolar, lembra a psicóloga e psicanalista Cristina Herbstrith.
— Não tem como fugir. É um exercício diário aprender a lidar com esse novo espaço de troca — ressalta.
O ideal é que eles lidem com eventuais problemas de forma madura, com respeito e diálogo. Mesmo com opiniões divergentes, saber ouvir, falar e respeitar a opinião de cada um.
CRISTINA HERBSTRITH
Psicóloga e psicanalista
Conforme a psicóloga, há pelo menos três modelos de postura diante dos grupos: os pais que entram, silenciam as mensagens e não participam; os que falam “até demais”, gerando um certo tumulto, por compartilharem opiniões sobre tudo e trazerem assuntos que não precisariam estar ali; e, em um caminho mais equilibrado, os pais que usam o espaço para tirar dúvidas, trocar impressões e perguntar a opinião dos outros pais sobre determinados assuntos da vida escolar dos filhos.
Além disso, Cristina ressalta que esse espaço de troca entre os pais é importante, pois serve para abordar atividades escolares e eventuais comportamentos de funcionários ou professores. Os grupos também podem estimular o convívio das crianças fora do colégio, organizando confraternizações, por exemplo.
— É um espaço de acesso fácil e rápido, ainda mais levando em conta as rotinas familiares cada vez mais intensas, que tornam raras as chances de trocas presenciais — aponta a psicanalista.
Quanto a como lidar com alguma situação problemática, ela explica que depende da situação. Se for uma questão dos alunos com a professora ou o colégio, os pais podem se articular, e um representante pode levar o assunto à coordenação. Já se o conflito for entre os participantes do grupo, é importante lembrar que se trata do comportamento de adultos.
— O ideal é que eles lidem com eventuais problemas de forma madura, com respeito e diálogo. Mesmo com opiniões divergentes, saber ouvir, falar e respeitar a opinião de cada um. E se alguém passar dos limites? Talvez seja melhor nem responder, ignorar mesmo, e deixar a poeira baixar. Lembrando que os pais são os principais modelos para os filhos, e as crianças absorvem não apenas o que lhes é falado, mas também o que observam — frisa.
Espaço de ajuda
A presença de pais nos grupos não é rara, mas certamente é menor. Na contramão desse movimento, o engenheiro químico Lourival dos Santos Jr., 49 anos, com filhos de 18 e 12 anos, se esforça para ser uma presença ativa na escola.
Com o filho mais velho recém-formado, Santos também destaca a utilidade dos grupos, sobretudo para trocar informações do dia a dia. Porém, mais do que isso, os espaços também podem ser locais de ajuda. Ele lembra que, no início do ano, os pais se uniram para dar uma camiseta produzida pela turma para um torneio do Colégio Marista Rosário a um novo aluno, que entrou após a organização ter sido finalizada, como um presente de boas-vindas.
— O grupo é uma extensão, quase uma área de convivência das famílias. É bem utilizado, bem objetivo, e eu vejo a turma participativa de forma positiva — salienta.
Santos também vê importância no canal pela atual rotina das famílias:
— Ainda mais na correria que a gente anda. É uma forma de conversarmos entre pais. Eu entendo que é algo extremamente positivo, dá até uma certa segurança na questão do convívio. Alguém pergunta ali e um pai sempre está disposto a ajudar.
A publicitária e empresária Michelle Martins, 39 anos, mãe de duas crianças de sete e cinco anos, também vê o espaço como uma comunidade de ajuda. Os pais dos grupos do Colégio Santa Doroteia, na Capital, compartilham lembretes de datas, tarefas e reuniões, além de recados.
Além disso, para ela, os grupos também são uma forma de ficar sabendo de outros relatos e questões que envolvem a escola, bem como compartilhar opiniões. Por isso, considera a ferramenta fundamental — até mesmo para conhecer as famílias e seus comportamentos.
— Funciona como um auxílio de comunicação com as coisas da escola. Se tem de levar material especial, uma compra para todo mundo, e a gente divide. A gente se ajuda para caramba — conta.