Recém-publicado e ainda não traduzido, um recorte de relatório feito pela Google For Education – braço vinculado à educação da gigante de tecnologia – foi apresentado, nesta quarta-feira (31), a autoridades dos setores de educação, política e mercado gaúchos. Elaborado por 94 especialistas de 24 países, o documento traça nove perspectivas sobre qual papel terá a educação para atender às necessidades do futuro. Três dos caminhos foram citados no evento: a personalização do aprendizado, a necessidade de elevação do professor e de reavaliação contínua do progresso dos estudantes.
A apresentação fez parte do evento Tá na Mesa, promovido pela Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), no Centro de Porto Alegre. Para personalizar o aprendizado dos alunos, uma das sugestões é usar a inteligência artificial e a tecnologia adaptativa para fazer essa individualização.
A inteligência artificial também é citada como uma forma de valorizar os docentes, porque poderia, segundo o relatório, economizar cerca de 13 horas semanais do tempo dos professores com a automatização de tarefas. A estimativa é de que de 20% a 40% das tarefas atuais dos educadores poderiam ser terceirizadas para a tecnologia, o que lhe daria mais tempo para se dedicar à personalização do aprendizado.
O uso de recursos tecnológicos pode, ainda, permitir a reavaliação contínua do progresso dos estudantes, conforme o documento. A modernização das avaliações tem o potencial de ajudar a simplificar o processo de feedback, a dar notas de maneira transparente e consistente e pode permitir que o professor acompanhe em tempo real o progresso de seus alunos.
— É uma tutoria constante do aluno, para que o professor não descubra só lá no final que ele vai falhar, quando não se tem mais o que fazer. Além disso, é possível ter uma avaliação mais ampla dele como indivíduo, com as peculiaridades e habilidades que ele, pessoalmente, tem — destaca Marici Marchini, líder de educação pública do Google for Education Brasil.
Marici pontua, também, que chama a atenção no relatório o fato de que os desafios não são tão diferentes no Brasil e em outros países do mundo, porque a questão principal não está na estrutura, e, sim, na essência: como se ensina, versus como se aprende.
Experiência uruguaia
Outra convidada do evento foi Mariana Montaldo, representante da Enlace Institucional Plan Ceibal, do Uruguai. A iniciativa, que é uma agência de inovação financiada pelo governo uruguaio, permitiu que o país vizinho se tornasse referência em seu desempenho na educação durante a pandemia. A distribuição de laptops a todos os estudantes e professores dos ensinos Fundamental e Médio desde 2008 garantiu conectividade para todos os locais rurais e urbanos da nação e a equipagem das escolas com infraestrutura e recursos de conteúdo pedagógico. Assim, o Uruguai chegou a 2020 preparado para lidar com a necessidade de realizar aulas remotas.
Conforme Mariana, o Plan Ceibal surgiu como uma forma de reduzir a desigualdade de acesso digital entre os setores mais e menos favorecidos da sociedade.
— Pensamos na tecnologia como uma alavanca digital, que permite ampliar o tempo de aula e melhorar as experiências, mas sempre com o professor sendo a pessoa moderadora dessas ferramentas. O professor é a figura chave para articular toda a parte pedagógica e as competências que se desenvolvem — defende a representante uruguaia.
A Ceibal é considerada uma agência paraestatal. Ou seja: o Estado a financia e ela precisa seguir leis públicas de transparência, mas é administrada pela perspectiva do direito privado, o que agiliza processos de aquisição de materiais, por exemplo.
O professor é a figura chave para articular toda a parte pedagógica e as competências que se desenvolvem.
MARIANA MONTALDO
Representante da Enlace Institucional Plan Ceibal
O resultado tem sido um bom desempenho do Uruguai em rankings internacionais. Em estudo da Unesco sobre os efeitos da pandemia na educação em países da América Latina, por exemplo, o país foi citado como referência, devido ao Plan Ceibal. Em levantamento feito pelo International Computer and Information Literacy Study (ICILS), no qual são avaliadas habilidades digitais dos alunos, os estudantes uruguaios tiveram desempenho próximo ao de nações como a Finlândia e o Japão.
Parceria da Google com o RS
No Brasil, muitas redes de ensino adotaram a plataforma Google Sala de Aula e outros recursos da Google For Education para viabilizar as atividades remotas durante a pandemia. Apesar de a experiência ser considerada positiva pela secretária estadual Raquel Teixeira, que também participou do Tá na Mesa, a gestora diz ter inveja do que foi vivido pelo Uruguai.
— Eu me orgulho de dizer que o Rio Grande do Sul foi o Estado que melhor soube utilizar o Google For Education, e isso foi absolutamente essencial. Mas, como secretária de Educação, confesso que morro de inveja do Uruguai e do Ceibal, porque, como lá já existia um programa, as redes já estavam preparadas, então as perdas de aprendizagem foram muito pequenas, porque já havia tecnologia e know-how de como usá-la — analisa Raquel.
No RS, por outro lado, foi necessário capacitar os professores para o uso do Google For Education, em um primeiro momento, o que retardou o sucesso da experiência. Atualmente, a secretária relata que uma nova parceria está sendo preparada, voltada para a qualificação da relação dos docentes com a tecnologia. Ainda estão sendo feitas tratativas sobre o assunto.