A adesão a cursos de graduação a distância vem ganhando força nos últimos anos no Brasil, e com mais intensidade em solo gaúcho. Em 2020, o RS teve quase o dobro de pessoas ingressando em cursos EaD do que em graduações presenciais. No Brasil, 2020 foi o primeiro ano em que as inscrições em atividades remotas superaram a outra modalidade, o que já ocorre desde 2019 no Estado.
Os dados estão presentes no Censo da Educação Superior, divulgado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). As informações sobre as instituições de Ensino Superior (IES) registradas em 2020 foram divulgadas na semana passada, com atraso — normalmente, o resultado do censo é divulgado no ano seguinte ao período analisado, e não dois anos depois. A divulgação acontece também sem a publicação dos microdados — uma série de informações que costumavam ser divulgadas, como as bases detalhadas de dados de alunos e docentes — o que gerou críticas de entidades ligadas à educação.
Entre 2015 e 2020, o número de ingressantes em cursos a distância de IES mais do que triplicou no RS, passando de 46,8 mil para 148,3 mil. No mesmo período, as graduações presenciais tiveram um terço a menos de interessados, com a quantidade de novas matrículas passando de 123,1 mil para 81,6 mil.
Em nível nacional, a tendência também foi de alunos migrando para o EaD. No entanto, de forma mais sutil — não à toa, a busca pela modalidade só superou a por cursos presenciais em 2020.
Professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) e especialista na área de Financiamento da Educação, Nelson Cardoso Amaral demonstra preocupação com o aumento acelerado do número de pessoas que cursam graduações a distância. O docente destaca que, hoje, os instrumentos de verificação da qualidade do ensino oferecido nessa modalidade ainda são muito insipientes.
— Não se está tendo nenhum cuidado em termos de acompanhar essa ampliação do EaD, por meio de fiscalização e avaliações dessas instituições. Somado à redução do número de alunos em cursos presenciais, isso é preocupante — analisa Amaral.
Em um único ano, entre 2019 e 2020, a quantidade de alunos que ingressaram no EaD aumentou 26% no Brasil e 19,6% no RS. O professor chama a atenção para o fato de que o desempenho dos estudantes da modalidade no Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) costuma ser pior do que o de matriculados em cursos presenciais, o que, segundo Amaral, ocorre porque um ensino a distância de qualidade custa caro para ser implementado.
— As pessoas costumam achar que EaD é barato, mas uma boa EaD é muito cara, porque precisa de todo um material de preparação das aulas, um rearranjo curricular e professores capacitados. Depois da implementação, você até pode aumentar de 200 para 500 alunos atendidos, mas é muito caro até chegar a esse ponto, e há instituições aumentando o EaD como se fosse ensino remoto, sem interação nenhuma com o aluno — alerta o docente.
Outro ponto sinalizado pelo professor com relação aos resultados do censo se refere a metas estabelecidas no Plano Nacional de Educação (PNE), a serem cumpridas até 2024. Uma delas é a ampliação do número de estudantes de 18 a 24 anos matriculados em instituições de Ensino Superior. Atualmente, cerca de 19% da população desta faixa etária cursa alguma graduação, e a meta é chegar a 33%, ao mesmo tempo em que ocorre, também, a ampliação da presença de pessoas de outras idades no Ensino Superior. Conforme Amaral, esses aumentos não estão acontecendo.
— O número de jovens dentro das universidades cresce, mas muito pouco. Os dados de 2020 não vêm ao encontro da execução do PNE e os de 2021 também certamente não virão. Em 2022, a tendência é de que não aconteça nenhum grande crescimento, então vai sobrar 2023 e 2024 para cumprir as metas — critica o pesquisador.
No PNE, também há previsão de ampliação do número de vagas em instituições públicas de Ensino Superior, o que, de acordo com o docente, tampouco está ocorrendo.
Aumento da presença de negros e indígenas desacelerou
Depois de pelo menos 10 anos de aumento significativo da presença de negros e indígenas nas instituições de Ensino Superior, os últimos anos foram de desaceleração nesses índices. Se até 2018 o número de pretos e pardos matriculados em graduações aumentava anualmente pelo menos 10%, esse percentual teve queda em 2019 e, mais acentuada, em 2020. Entre indígenas, a desaceleração aconteceu em 2020.
No RS, porém, as únicas etnias que tiveram redução no número de matriculados em 2020 foram a branca (-1,2%) e a amarela (-10,4%). Entre pessoas pardas, o índice se manteve estável: houve aumento de 1,8%, muito abaixo dos 9,1% registrados em 2019 e dos 11,7% em 2018. Entre pessoas pretas, a queda no crescimento foi menor, chegando a 4,4% em 2020, contra 6,5% em 2019 e 9,8% em 2018.
A população indígena, que apresentou aumento de 12,9% e 17,5% nos alunos matriculados em 2018 e 2019, teve acréscimo de 6,8% em 2020. Em nível nacional, o número de estudantes indígenas caiu 16%.