Aplicativo muito utilizado entre brasileiros, o WhatsApp é encarado, inclusive, como instrumento de trabalho. Com o aumento do home office, as trocas entre empregadores e funcionários se tornaram tão comuns por esse meio que algumas empresas começaram a utilizá-lo para comunicar demissões - o que pode gerar desconforto em quem é dispensado desse jeito e acarretar em danos morais.
Profissionais da área trabalhista consultados por GZH são claros: não existe lei que estabeleça se o desligamento de um funcionário deve ser comunicado olho no olho ou pode ser feito por intermédio de um meio eletrônico. Mas reconhecem que, com a pandemia, houve um aumento no número de processos que citam demissões por WhatsApp.
Acostumado a defender empresas, o advogado trabalhista Eugênio Hainzenreder, professor da Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e ligado ao escritório Rossi, Maffini, Milman e Grando Advogados, de Porto Alegre, entende que, em uma situação excepcional como uma pandemia, em que o distanciamento entre as pessoas é o mais indicado, é natural que patrões e empregados se comuniquem com mais frequência pelos aplicativos, e que eventuais dispensas ocorram pelos meios eletrônicos. Mas não indica que uma situação delicada como um desligamento seja comunicada pelo WhatsApp.
— Como advogado de empresas, eu não recomendo que seja feito dessa forma. É uma maneira muito impessoal. Estamos falando de uma relação de emprego que é para perdurar, e como forma de evitar constrangimento, para o trabalhador não se sentir desprestigiado, é melhor chamá-lo para conversar pessoalmente — diz.
Ainda assim, Hainzenreder reforça que não é o meio que define se uma situação pode gerar danos morais, e sim a forma. Ou seja: não é o uso do WhatsApp para comunicar desligamentos que vai garantir que um processo renderá danos morais, mas o conteúdo presente nas conversas, se elas acontecem de forma respeitosa.
Mas há um detalhe: com as inúmeras configurações permitidas pelos aplicativos, a pessoa pode alegar que não leu a mensagem e não ficou sabendo de sua demissão.
— Às vezes, a pessoa pode não responder, pode estar com as notificações desativadas, e pode dizer que não recebeu a comunicação de que foi dispensado. É uma insegurança jurídica — observa o advogado.
Para o juiz do trabalho Rodrigo Trindade de Souza, que atua no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), a forma como uma empresa atua e se comunica com os funcionários pode ajudar a diferenciar se o WhatsApp é ou não apropriado para anunciar que o contrato entre as partes está chegando ao fim.
Se a comunicação sempre se deu pelo aplicativo e o desligamento do funcionário for anunciado dessa forma, a chance de a dispensa ser reconhecida como indevida é menor. Por outro lado, se todos os atos importantes da empresa são presenciais, a demissão pelo WhatsApp pode ser interpretada como uma humilhação.
— Nessas situações, pode-se reconhecer a utilização do WhatsApp como uma intenção de diminuir o empregado, e isso produz um dano moral indenizável — diz Souza.
O magistrado destaca outro fator que precisa ser levado em conta na hora de se optar pela demissão por aplicativo que é o da impessoalidade em um momento delicado.
— A comunicação por WhatsApp, em detrimento da presencial, é vista como uma forma menos respeitosa — observa.
Sócia da área trabalhista do escritório Andrade Maia, também em Porto Alegre, a advogada Clarisse Rozales reforça que demitir por WhatsApp não é errado. No entanto, é um tipo de comunicação que abre espaço para muitas interpretações, o que torna essa escolha muito arriscada.
— Não é errado demitir dessa forma, mas o ideal é não fazê-lo. Pode resultar em condenação por dano moral, caso se entenda que a demissão tenha sido de forma abrupta. São tantas possibilidades de discussão que não vale o risco — diz.