Liberal entusiasta do projeto Escola Sem Partido, crítico da esquerda e defensor de uma política educacional que dê mais autonomia a Estados e municípios, o futuro ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro, Ricardo Vélez Rodríguez, é considerado um "desconhecido" na comunidade acadêmica.
Anunciado pelo presidente eleito como um quadro técnico, e não político, o filósofo colombiano tem currículo extenso. Ao revelar sua escolha, Bolsonaro destacou que Vélez é autor de mais de 30 livros e professor emérito da Escola do Comando Maior do Exército. Suas obras acadêmicas são versáteis: abordam desde filosofia política até Movimento Sem Terra (MST), Dom Quixote, narcotráfico na América Latina e patrimonialismo.
Um dos títulos mais conhecidos é A Grande Mentira: Lula e o Patrimonialismo Petista (2015). Há, também, um livro sobre história do Rio Grande do Sul . Em artigos, Vélez defende que universidades e o Ministério da Educação estão aparelhados pela esquerda. Em seu Lattes (currículo acadêmico), diz pesquisar filosofia política.
GaúchaZH consultou sete especialistas em filosofia, ligados a grandes universidades e representantes de entidades nacionais, para falar sobre a obra do futuro ministro. Diretor da faculdade de Filosofia na Universidade de São Paulo (USP), Oliver Tolle diz que nunca havia ouvido falar de Vélez antes do anúncio de Bolsonaro:
— Ele não é exatamente uma figura conhecida na Filosofia. Não é um nome conhecido, nunca desempenhou nenhum papel importante em órgãos representativos. A impressão que tenho é de que ele é mais ligado a uma ideologia do que um quadro técnico qualificado.
Professor de filosofia política na USP, Alberto de Barros complementa:
— Nos grupos de pesquisa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e nos grupos de trabalho da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (Anpof), dos quais eu participo, o seu nome é desconhecido.
O colombiano fez seu doutorado em filosofia na Universidade Gama Filho, entre 1979 e 1982. O orientador de Vélez foi o filósofo Antônio Paim. Ambos são entusiastas de Olavo de Carvalho e de Miguel Reale, reitor da USP durante o regime militar e um dos teóricos jurídicos e filosóficos da ditadura no Brasil. Reale criou o Instituto Brasileiro de Filosofia e é elogiado por Vélez em um artigo celebrando os 60 anos da instituição.
Adriano Correia, presidente da Anpof e professor na Universidade Federal de Goiás (UFG), diz que não havia deparado antes com o nome do futuro ministro e critica a posição adotada por Vélez em artigos e entrevistas:
— Os artigos dele são militantes, no sentido de desqualificar opositores, sem um real debate de ideias. Esse grupo de pesquisadores do qual ele faz parte, ligados ao Instituto Brasileiro de Filosofia, tem um pensamento conservador católico que trata a diversidade de hábitos como um problema. Usam o liberalismo para defender suas ideias quando o liberalismo defende a escola pública e universal desde a Revolução Francesa.
Agemir Bavaresco, coordenador da pós-graduação em Filosofia da PUCRS, diz que os textos de Vélez relevam episódios importantes de períodos autoritários da história brasileira.
— No mestrado, estudou o positivismo. No doutorado, estudou o Oliveira Vianna, um pensador eugenista autoritário no Brasil. Ricardo Vélez conhece os pensadores brasileiros, mas faz uma leitura de modernização conciliadora. Você pode analisar a história apontando as contradições políticas e sociais, mas ele as encobre — afirma.
"Grande conhecedor", "máquina de produzir"
Vélez realizou pós-doutorado no Centro de Estudos e Pesquisas Políticas Raymond Aron, em Paris, de 1994 a 1996. Contatada pela reportagem, sua orientadora, Françoise Melonio, hoje professora da Universidade Sorbonne, afirma que aproximou o colombiano de outros pesquisadores franceses em ciência política e discutiu com ele o liberalismo político europeu, em especial Alexis de Tocqueville, considerado pai do liberalismo e defensor da democracia.
— O professor Ricardo Vélez Rodríguez é um grande conhecedor da tradição liberal europeia, sobre a qual escreveu muito — disse Françoise por e-mail. — Tem uma interpretação que difere da minha, mas argumentada de forma sólida. Sem conhecer a atual situação política do Brasil, não sei o que será de sua atuação — acrescentou.
Em 2014, Vélez mudou-se para Londrina (PR). Foi dar aulas de filosofia e direito nos cursos de Direito e Administração da Faculdade Positivo. Valéria Martins Oliveira, coordenadora do curso de Direito, foi responsável por contratá-lo. Ela o conheceu por intermédio do sogro do futuro ministro, o também professor universitário Oscar Ivan Prux, advogado conhecido na cidade do interior paranaense.
— O professor Ricardo é uma máquina de produzir. Ele produz muito artigo, lança livro todo ano. Além de conhecimento acadêmico, tem um conhecimento de mundo muito grande. Apesar de ter convicções fortes, ele está sempre aberto a ouvir, é extremamente fácil de conviver. Os alunos o adoram — diz Valéria.
Ricardo Vélez não quis conceder entrevista, informou a Faculdade Positivo.