A Câmara dos Deputados aprovou, nesta quinta-feira (12), o projeto de lei que propõe uma transição de três anos para o fim da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores da economia e para a cobrança de alíquota cheia do INSS em municípios com até 156 mil habitantes. A proposta será enviada à sanção presidencial.
O Projeto de Lei 1847/24, do Senado, surgiu depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) considerar inconstitucional a Lei 14.784/23, que prorrogou a desoneração até 2027, por falta de indicação dos recursos para suportar a diminuição de arrecadação. Um acordo posterior foi fechado no sentido de manter as alíquotas para 2024 e buscar fontes de financiamento para os anos seguintes.
Os depósitos nas causas em que a União está envolvida continuarão registrados para os fins devidos e os valores esquecidos nos bancos poderão ser reclamados em prazos definidos.
A emenda diz que os saldos não reclamados serão apropriados pelo Tesouro Nacional como receita primária e considerados para fins de verificação do cumprimento da meta de resultado primário.
Na quarta-feira (11), os deputados aprovaram o texto-base do projeto, com uma emenda de redação que, segundo o líder do governo, José Guimarães (PT-CE), atende a ponderações do Banco Central sobre a apuração do resultado primário. O placar foi de 253 votos favoráveis, 67 contrários e 4 abstenções.
Com a obstrução da oposição, não houve quórum para concluir a votação, e a sessão foi encerrada na madrugada desta quarta, sob a presidência do deputado Gilberto Nascimento (PSD-SP).
Nesta quarta, quem preside a sessão é o líder do MDB, Isnaldo Bulhões (AL).
Texto-base
O texto, alinhavado na noite de quarta-feira pela equipe econômica e pelas lideranças da Casa, traz uma nova redação em relação ao que havia sido aprovado no Senado - a mudança, no entanto, está sendo considerada como um ajuste de redação e, por isso, o projeto não terá de passar por nova análise dos senadores. A expectativa é de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancione a lei assim que ela chegar ao Palácio do Planalto. A aprovação do texto-base ocorreu às 23h57min, sendo que o prazo determinado pelo STF para se concluir um acordo sobre o tema terminava nesta quarta-feira.
O novo trecho incluído no texto prevê que a apropriação, pelo Tesouro Nacional, de valores esquecidos em instituições financeiras, mesmo que não computada como receita primária pelo Banco Central, será considerada para fins de cumprimento da meta fiscal do governo. Dessa forma, esses montantes poderão servir como parte da compensação à desoneração. Hoje, no entanto, o cálculo válido para a verificação do resultado primário é o do BC.
O chamado resultado primário é a diferença entre receitas e despesas sem considerar os juros da dívida pública. Ou seja, o número que determina se o governo fechou o ano no azul ou no vermelho e se cumpriu ou não a meta estabelecida pela equipe econômica. Quando há descumprimento, gatilhos são acionados e o governo é obrigado a gastar menos.
Esse novo trecho foi incluído pela então relatora da proposta, deputada Any Ortiz (Cidadania-RS), nos momentos anteriores à votação. A mudança atendeu a acordo das lideranças com o Ministério da Fazenda para contemplar alertas do BC, mas foi além dos pontos levantados pela autoridade monetária, criando essa exceção no regramento fiscal.
Any Ortiz, porém, abriu mão da relatoria, que passou para o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
— Guimarães, que o senhor assine essa chantagem que estamos vendo aqui hoje. Não tenho como assinar esse relatório da forma como foi feito, no limite do prazo — disse a deputada.
— Nós conseguimos um acordo feito com a faca no pescoço, como com um sequestrador. Nós estamos aqui como reféns, temos uma hora para aprovar esse projeto para que amanhã os setores não tenham uma conta impagável no colo. Vamos garantir a desoneração, mas é lamentável o que o STF está fazendo com o apoio do Executivo, passando por cima da maioria do Congresso — afirmou ela, destacando que, apesar de desistir da relatoria, iria votar de forma favorável ao texto.
Ao assumir a relatoria, Guimarães afirmou:
— Tenho maior orgulho de relatar essa matéria. Ela é boa, ajuda os pequenos municípios e os 17 setores.
As principais medidas de compensação
- Endurecimento no BPC e seguro-defeso
- Atualização de bens no Imposto de Renda
- Repatriação de ativos mantidos no Exterior
- Renegociação de multas aplicadas por agências reguladoras
- Pente-fino no INSS e em programas sociais
- Uso de depósitos judiciais esquecidos
- Programa de cadastro dos benefícios fiscais
Municípios
Quanto aos municípios, permanecerá a alíquota de 8% do INSS em 2024, aumentando gradualmente para 12% em 2025, 16% em 2026 e voltando a 20% a partir de janeiro de 2027.
O benefício valerá para cidades com população de cerca de 156 mil habitantes (em torno de 5300 cidades).
Para contarem com a redução de alíquotas, os municípios devem estar quites com tributos e contribuições federais.
O projeto exige ainda dos municípios beneficiados que mantenham atualizados os dados cadastrais no sistema eSocial para poderem contar com a alíquota diferenciada e também com a compensação prevista em lei entre o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e regime próprio de previdência de determinado município, seja ele beneficiário ou não da desoneração da folha.
Empregos
Se o projeto virar lei, as empresas que optarem por contribuir ao INSS dessa forma deverão, a partir de 1º de janeiro de 2025 e até 31 de dezembro de 2027, firmar termo de compromisso para manter, ao longo de cada ano, quantidade média de empregados igual ou superior a 90% da média do ano imediatamente anterior.
Caso a empresa não cumpra o termo, não poderá usar a contribuição sobre a receita bruta a partir do ano seguinte ao descumprimento, devendo pagar integralmente a alíquota de 20% sobre a folha.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
Sanção imediata
A expectativa é de que o Palácio do Planalto dê aval imediato ao projeto, assim que aprovado na Câmara.
A pressa se deve ao fato de o prazo dado pelo ministro Edson Fachin, do STF, para que Legislativo e Executivo buscassem uma solução de consenso para o tema vencer na quarta-feira. Dessa forma, caso a Câmara não aprovasse o projeto até o final do dia, voltaria a valer a decisão tomada pelo ministro do Supremo Cristiano Zanin, em abril, que determinou a reoneração da folha (leia mais abaixo).
— O governo deixou para a última hora e agora os setores (que contam com a desoneração) estão com a faca no pescoço — afirmou a deputada Adriana Ventura (Novo-SP).
O tema mobilizou Executivo, Legislativo e Judiciário ao longo dos últimos meses, bem como o empresariado, que reclama de insegurança jurídica em meio ao longo impasse tributário.
— Ajustes que foram feitos são redacionais e vai para sanção, o que mostra o compromisso do governo. Seria muito fácil não votar e deixar voltar como era antes — rebateu o líder do governo, José Guimarães.
Além do uso de valores esquecidos em contas, o projeto também prevê como medidas compensatórias o uso de depósitos judiciais, atualização de bens no Imposto de Renda, repatriação de ativos mantidos no exterior e renegociação de multas aplicadas por agências reguladoras.
A equipe econômica alega, porém, que esses valores podem não ser suficientes para compensar a medida em 2025. Por esse motivo, o governo enviou ao Congresso um novo projeto de lei que prevê aumento da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e uma mudança no Imposto de Renda dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), uma espécie de remuneração paga a acionistas. Os dois temas, no entanto, enfrentam grande resistência no Congresso.
Como será a reoneração gradual da folha
O texto da desoneração da folha de pagamentos prevê uma reoneração gradual entre 2025 e 2027. A partir do ano que vem, os empresários passarão por uma cobrança híbrida, que misturará uma parte da contribuição sobre a folha de salários com a taxação sobre a receita bruta, da seguinte maneira:
- Em 2025, as empresas pagarão 80% da alíquota sobre a receita bruta e 25% da alíquota sobre a folha
- Em 2026, as empresas pagarão 60% da alíquota sobre a receita bruta e 50% da alíquota sobre a folha
- Em 2027, as empresas pagarão 40% da alíquota sobre a receita bruta e 75% da alíquota sobre a folha
- A partir de 2028, as empresas retomarão integralmente o pagamento da alíquota sobre a folha, sem o pagamento sobre a receita bruta.
Como contrapartida para o benefício, as empresas serão obrigadas a manter ao menos 75% dos empregados. Isso significa que uma redução de até 25% do quadro de funcionários não resultará na perda do direito à desoneração por parte dessas companhias.
No caso dos municípios, o texto também estabelece uma "escada". Neste ano, está mantida a alíquota previdenciária de 8% aprovada no ano passado pelo Congresso. Em 2025, esse imposto será de 12%. Em 2026, de 16%. Em 2027, por fim, voltará a ser de 20%.
O que é a desoneração da folha
A desoneração da folha de pagamentos foi instituída em 2011 para setores intensivos em mão de obra. Juntos, eles incluem milhares de empresas que empregam 9 milhões de pessoas. A medida substitui a contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a folha de salários por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta. Ela resulta, na prática, em redução da carga tributária da contribuição previdenciária devida pelas empresas.
Por decisão do Congresso, em votações expressivas, a política de desoneração foi prorrogada até 2027, mas acabou suspensa por uma decisão liminar do STF em ação movida pelo governo federal. A alegação é que o Congresso não previu uma fonte de receitas para bancar o programa e não estimou o impacto nas contas públicas.
O cerne da discussão passou a girar em torno das compensações da desoneração da folha de pagamentos. A equipe econômica insiste em uma medida que represente receitas para os próximos anos.
Os 17 setores da economia
- Confecção e vestuário;calçados;
- Construção civil;
- Call center;
- Comunicação;
- Empresas de construção e obras de infraestrutura;
- Couro;
- Fabricação de veículos e carroçarias;
- Máquinas e equipamentos;
- Proteína animal;
- Têxtil;
- TI (tecnologia da informação);
- TIC (tecnologia de comunicação);
- Projeto de circuitos integrados;
- Transporte metroferroviário de passageiros;
- Transporte rodoviário coletivo;
- Transporte rodoviário de cargas