Diante do combo formado por juro ainda elevado, endividamento e inadimplência resistentes, o desempenho da economia do Rio Grande do Sul segue calçado no setor terciário. Puxado pelos ramos de informação e comunicação e de transportes, serviços lideram o crescimento da atividade econômica no Estado no acumulado do ano até setembro. O setor é seguido por comércio, que segue no azul, mas com perda de ritmo acentuada. A Indústria é o único segmento no vermelho, patinando em um ambiente de juro alto, exportações em queda e aumento de incertezas. O cenário é exposto nas pesquisas mensais realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgadas nos últimos dias.
Um dos principais motores da economia do país, o setor de serviços acumula avanço de 6% no Estado no agregado de janeiro a setembro ante o mesmo período de 2022. Mesmo com queda de 1,6% na comparação com agosto e desaceleração, esse grupo está 13,3% acima do nível pré-pandemia, mas 6,2% abaixo do ponto mais alto da série histórica, observado em abril de 2014. Abrindo os dados do setor, informação e comunicação — que também leva em conta dados da área de tecnologia da informação (TI) — e transportes são os segmentos com as maiores altas no ano.
A economista-chefe da Federação do Comércio de Bens e de Serviços do Estado do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Patrícia Palermo, afirma que o setor de serviços segue em um processo de acomodação. Nesse sentido, diminui o ritmo de crescimento após atingir os picos observados no início da retomada pós-restrições da pandemia. Em relação ao segmento de informação e comunicação, a especialista cita que esse movimento está relacionado ao aumento da demanda por TI:
— Isso pode estar ligado à presença maior de pessoas com ensino superior trabalhando aqui, que fazem mais home office e que demandam mais esse serviço. E também da concentração de empresas dessa área no Estado.
No comércio, o volume de vendas soma avanço de 2% neste ano. Mesmo em alta, o setor mostra desaceleração mais forte ante o ano passado (veja no gráfico). Quadro de renda das famílias comprometida com dívidas e gastos essenciais freia o consumo de alguns bens. No entanto, o crescimento do emprego e a queda da inflação impactam a renda da população e auxiliam o consumo das atividades mais ligadas à renda, como aquisição de itens de supermercados e medicamentos, ajudando a impedir uma queda no setor, segundo a economista-chefe da Fecomércio-RS.
Indústria segue com queda no ano
Com oscilações ao longo do ano, a indústria gaúcha segue acumulando queda, com retração de 5,1% no período. Após assinalar alta de 5,4% em agosto, o setor anotou queda com esse mesmo volume em setembro. Olhando por grupos de atividade, metalurgia e fabricação de derivados de petróleo puxam o setor para baixo no ano. O economista-chefe da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Giovani Baggio, afirma que, além de juro alto e da incerteza em relação a políticas econômicas, retração nas exportações também prejudicam o setor:
— Tem também o cenário internacional. A gente tem observado queda nas exportações. Além disso, o mês de setembro foi bastante impactado pelas enchentes no Estado. Houve uma aceleração na queda desse acumulado do ano quando entrou o mês de setembro.
A economista Maria Carolina Gullo, professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), afirma que a indústria também sofre com efeito de comparação:
— A base de comparação anterior é forte. Os anos de 2021 e 2022 foram bons. A indústria também sofre com esse efeito de comparação.
Próximos meses
A economista-chefe da Fecomércio-RS estima para os próximos meses um cenário com serviços ainda em desaceleração, e comércio flutuando em torno da taxa de crescimento observada atualmente. Para 2024, a especialista afirma que o comportamento dos setores depende da inflação:
— A gente sabe que hoje em dia temos uma perspectiva positiva da inflação, que abre a janela para redução da taxa de juro. E isso pode influenciar no consumo.
Na indústria, o economista-chefe da Fiergs reforça a tendência de cenário desafiador para os próximos meses. De um lado, a redução do juro e da inflação podem ajudar o setor. Do outro, algumas incertezas no campo da reforma tributária e flertes do governo federal em relação ao não cumprimento da meta fiscal afastam o otimismo sobre investimentos e avanço na indústria, segundo o economista.
Maria Carolina Gullo também projeta cenário de acomodação e pé no freio nos três setores para os próximos meses. No entanto, cita o efeito das festas e datas comemorativas de final do ano nas vendas do comércio varejista:
— Comércio e serviços esperam vender melhor agora no fim do ano por ser uma época importante para esses segmentos. Vamos ver como os consumidores vão se comportar, se vão ter condições de atender a essa expectativa, principalmente nas compras de Natal. E nos serviços tem a questão do período de férias, do turismo, do lazer.
Principais destaques entre os setores
Serviços
- No âmbito de serviços de tecnologia da informação e comunicação, demanda ocasionado pelo home office e empresas de referência do setor de TI no Estado podem ajudar a explicar a alta.
- Em transportes, escoamento da safra em ano com estiagem menos severa e desempenho do setor de transporte de carga como um todo estão entre os fatores de alta.
- Nos serviços prestados às famílias, acomodação após taxas mais altas do passado explica a desaceleração acentuada.
Comércio
- Mais pessoas empregadas, com renda, e necessidade e troca de produtos adquiridos durante a pandemia são alguns dos fatores que explicam o desempenho positivo de móveis e eletrodomésticos.
- Segmentos teriam potencial de alta maior em cenário com endividamento e inadimplência em patamares menores.
Indústria
- Juro alto trava os investimentos do setor. Com crédito mais caro e restrito, parte dos empresários decide segurar recursos.
- Incertezas em relação ao comportamento da economia dos próximos meses diante de fatores como cumprimento da meta fiscal também seguram aportes da indústria.
- Falta de apetite das economias internacionais, que provoca queda nas exportações, freia a produção nas fábricas.
Por que o agro não aparece?
- O IBGE não divulga pesquisa mensal nesses mesmos moldes na agropecuária. O instituto tem um balanço detalhado do setor, mas com períodos diferentes e dividido em duas frentes.
- Uma é o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola, que trata da safra de grãos mensalmente. A outra é a pesquisa trimestral da pecuária.
- Mesmo assim, produtos ligados ao agro entram nas pesquisas de serviços, comércio e indústria em outras etapas, como fabricação de alimentos, de máquinas e transporte.