Com desaceleração global e crise em parceiro vizinho, as exportações da indústria gaúcha estão prejudicadas neste ano. As vendas externas do setor recuaram 3,4% no acumulado deste ano até outubro ante o mesmo período de 2022. A queda é puxada por alguns segmentos como alimentos, químicos e celulose. Desaquecimento da atividade na China, crise econômica na Argentina e falta de apetite de Estados Unidos e Europa ajudam a explicar essa falta de tração do comércio externo, segundo especialistas.
De janeiro a outubro, a indústria do Estado registrou US$ 13,9 bilhões em vendas para o mercado exterior. No mesmo período do ano passado, essa cifra ficou em US$ 14,4 bilhões, segundo dados da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs). O economista-chefe da entidade, Giovani Baggio, afirma que um dos principais fatores que puxam as exportações gaúchas para baixo é o pé no freio da economia chinesa. A retomada no país asiático não engrenou, com uma população com baixa confiança para consumir mesmo com renda disponível, conforme Baggio:
— Depois de muitos anos com controle do governo em termos de políticas sanitárias, a população ainda não se sente confortável para voltar ao consumo anterior. Isso faz com que eles consumam menos alimentos e nós aqui no Rio Grande do Sul somos fornecedores de carnes, óleo de soja, de muitos produtos que eles consomem.
O grupo de alimentos recuou 2,6% no acumulado do ano, mas o setor tem peso importante nas transações da indústria, principalmente no comércio com a China. Na parte de químicos, que recuou 29,9%, o economista-chefe da Fiergs cita a desaceleração da produção em algumas fábricas como principal fator que explica a queda. No campo da celulose e papel (-23%), paradas para reformas na CMPC, em Guaíba, podem explicar a retração, segundo o especialista.
Baggio afirma que a crise econômica na Argentina, marcada por entraves no recebimento de mercadorias, também pesa nesse mau momento das exportações gaúchas, mesmo que com intensidade menor. A queda da atividade no país freou a demanda por itens da indústria gaúcha.
O professor Marcos Lélis, da Escola de Gestão e Negócios da Unisinos, cita três fatores que explicam a retração nas exportações. Além dos efeitos China e Argentina, diminuição na demanda por bens também afeta o comércio exterior, segundo o docente:
— Aquela parte do dinheiro que estava sendo gasta em bens industrializados voltou para lazer com muita mais força. A gente observa um aumento no turismo. Tem essa reorganização, esse baque, que cria uma dificuldade para a indústria.
Olhando apenas a variação mensal, as exportações da indústria voltaram a apresentar alta em outubro, com avanço de 10,1% ante o mesmo mês de 2022, após tombo de setembro.
Setor calçadista também retrai
O ramo calçadista, com polo importante no Estado, é outro que apresenta retração nas exportações. No acumulado do ano até outubro, esse segmento exportou 30,46 milhões de pares, que geraram US$ 466,88 milhões. Esses valores representam quedas de 16,7% em volume e de 10,3% em receita ante o mesmo período do ano passado. O presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Haroldo Ferreira, afirma que a crise econômica da Argentina e a desaceleração da economia mundial estão entre os principais fatores que ajudam a explicar os problemas nas vendas externas do setor.
Pelo lado do resto do mundo, com destaque para Estados Unidos e Europa, o dirigente cita um superabastecimento observado em 2022 e a falta de tração nas economias locais. Esse cenário diminui o apetite pelo produto, segundo Ferreira.
Próximos meses
O economista-chefe da Fiergs estima cenário desafiador para as exportações da indústria nos próximos meses. A projeção de Baggio é baseada em um cenário marcado por economia mundial ainda com dificuldades de expansão diante da tentativa de reverter trajetórias de alta inflacionária:
— Essa política monetária apertada faz com que a economia mundial ande em baixa rotação no ano que vem.
O professor Marcos Lélis afirma que o ambiente das vendas externas do Estado pode apresentar crescimento no próximo ano, mas relaciona esse cenário a eventual melhora no comércio com a Argentina.