Depois de um ajuste sazonal que elevou de 1,6% para 9,7% o desempenho do comércio do Estado em março, o Rio Grande do Sul apresentou nova evolução de 0,6% em abril (a quarta consecutiva no ano) e acumula alta de 10,4% em 2022, segundo os dados da pesquisa mensal (PMC), divulgados nesta sexta-feira (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado, bastante descolado da média nacional, que exibe avanço mais contido (2,3%) no ano, gerou um alerta por parte das principais entidades do varejo gaúcho: a Federação do Comércio de Bens e de Serviços do RS (Fecomércio-RS) e a Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL-POA).
De acordo com os economistas-chefes da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, e da CDL-POA, Oscar Frank, não se trata de uma novidade quando o assunto é a PMC, mas, desta vez, a discrepância na revisão dos dados referentes ao Estado não encontra amparo em fatores econômicos e nos relatos de empresários do segmento. Nesse contexto, ambos afirmam que a análise contida na mesma pesquisa, porém com a base ampliada (com 10 setores avaliados), é mais fidedigna.
Por essa linha de comparação, o Rio Grande do Sul ostenta oscilação positiva de 4,5% no ano, frente a 2,3% no país. Em 12 meses, o Estado teria acréscimo de 3,7% e o Brasil, de 2,2%.
— Na série com ajuste sazonal (comparação do mês com o mês anterior), aconteceu algo curioso porque o dado de março foi brutalmente revisado. Não há justificativa econômica para explicar algo dessa magnitude, o que prejudica as análises. Isso não é uma novidade, e o IBGE tem alguns problemas bastante específicos com relação à PMC e ao método de ajuste sazonal, então, acaba acontecendo que os dados são muito revisados e gera um comprometimento das avaliações — aponta Oscar Frank, da CDL-POA.
Na mesma linha, Patrícia Palermo destaca que, quando se revisa um crescimento sazonal de 1,6% em março para 9,7%, só é possível pensar: “Há algo de muito errado no ar”:
— Ao olhar para os dados, não consigo ver a realidade do que percebemos nos relatos do setor e em outras variáveis da economia. É bizarro. Não há, na economia, sustentação para esses números — reforça.
Explicações
Entre os motivos apontados pelos economistas está o fato de a PMC considerar apenas os estabelecimentos que possuem 20 funcionários ou mais. Segundo Oscar Frank, a pesquisa não conta a história dos pequenos lojistas, que sofreram mais do que os grandes durante a pandemia e, portanto, exibem recuperação mais lenta.
— É um retrato do setor, mas é preciso enfatizar que não captura o cenário daqueles que ainda podem estar enfrentando as maiores dificuldades — diz.
Ele acrescenta que os resultados recentes do Estado “surpreendem pela resiliência”. Isso acontece, afirma, porque a estiagem, que reduziu a safra gaúcha de grãos, parece não ter surtido efeito na PMC.
— Faz com que a gente se pergunte o quão mais fortes esses números deveriam ser se o problema climático que afetou a renda do campo não tivesse ocorrido. É mais uma situação a ser monitorada e que levanta uma questão importante — argumenta.
No que se refere à revisão de março, os reflexos dos programas de transferência federal, que envolvem a liberação parcial do FGTS e a antecipação do 13º salário de aposentados e pensionistas, também geram questionamentos.
— Esses recursos começam a ocorrer em abril, que teve resultado, do ponto de vista do varejo ampliado, melhor do que o de março. Então, me parece que, de acordo com o que aconteceu recentemente, o varejo ampliado captura melhor a essência do setor do que o varejo restrito, que teve esse problema bem considerável. De uma maneira geral, interpreto assim os dados — pontua.
Setores
Dos 10 setores presentes no varejo ampliado, apenas 3 tiveram queda no Rio Grande do Sul: equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação (-23,5%), eletrodomésticos (-3,1%) e móveis (-0,1%). Frank explica que isso está relacionado com o impacto das cadeias produtivas e os problemas logísticos que geram escassez de matérias-primas e elevam custos.
Entre as altas, livros, jornais, revistas e papelaria (+46%), tecidos, vestuário e calçados (+29,4%) e artigos de uso pessoal e doméstico (+26,9%) se destacam. A economista-chefe da Fecomércio-RS, Patrícia Palermo, comenta que, nos meses mais próximos ao inverno, o frio e a chuva se tornam balizadores importantes do comportamento de consumo, sobretudo nos vestuários.
— Mas os dados de abril ainda não contemplam os derivados do frio. Falando mais da nossa percepção do que propriamente da PMC, quanto mais frio, maior o tíquete médio. Espera-se aumento de receita e de volume de vendas. Já a chuva muda a compra de lugar e transfere das lojas de rua para os shoppings e centros comerciais — sustenta.